Notas de um Insone.

Não queria dormir; duzentas coisas martelavam sua cabeça ao mesmo tempo. O sono veio ao ligar o computador e abrir a terceira cerveja, intercalada. Caiu uma chuva forte. Mas já era tarde, não queria mais dormir; achava que mais de duzentas coisas ainda martelam sobre sua cabeça. Cita algumas:

O casamento, a instituição, a vivência, a rotina, traumas e meias verdades, quando não verdades inteiras, que se transformam em monstros que atrapalham o sono e a ingestão de qualquer coisa. A insatisfação com tudo o que o outro faz ou deixa de fazer. A vida em si andou sem rumo. O que fazer numa situação em que o matrimônio não é e não foi o que sonhava quando adolescente? Talvez uma das questões cruciais, que podem derrocar em críticas tipo: a vida sonhada aos dezesseis também em nada se parece com a de agora. Mas a vida de alguma forma não se escolhe; o casamento se escolhe? Sim, correto! Tudo se dá um jeito de se escolher! Tudo! Tudo se dá um jeito de se escrever, tudo, desde o princípio!

Queria dormir, mas os traumas do cotidiano o impeliram de permanecer atento. Quando “pensa” muito, como muitos, as coisas desandam. E o sono é o primeiro a sofrer alternância. Lembra daqueles “doidos” de “O Deserto dos Tártaros”?, obviamente de Dino Buzzati.

Mas, como íamos dizendo, ainda no primeiro tema dos mais de duzentos que o impeliram a ficar acordado, até agora, nesta noite: o casamento.

São 21hs 54min do dia 26.11.10, algo assustador. Chove muito por aqui nesta época do ano, e o silencia trás um zumbido infinito. Parece mesmo o fim dos tempos por aqui!

Pois bem, o casamento, em sua instituição máxima possui diretrizes a serem seguidas. Porém, no momento no namoro e talvez futuro noivado, as coisas não andam como andariam dentro de um matrimônio; talvez descambam para uma safadeza e promiscuidade única, entre os cônjuges, obviamente; por outro lado, o que num namoro era o princípio de algo satisfatório para ambos os casadoiros, se transforma num grande pesadelo: um quer mais que o outro, ou vice-versa.

Estranho; detesto bandidos, principalmente os da noite, nem os “da calada da noite” como os poetas do Rio antigo bem expunhas, digo os bandidos de agora: os malandros que arrebentam com uma família toda por causa de uma pedra de crack! Desses filhos da puta que falo agora, dos “Galinóias” da vida e de outras porras, que invadem sua casa, sua cabeça, no repouso noturno e fazem de você o diabo! Dois bandidos azarados se deram mal ao assaltarem e espancarem um casal de idosos da Ilha de Itapagi. O casal de idosos era pai de um dos mais sanguinários investigadores de polícia da região; moral da história: os dois foram espancados até se tornarem absolutamente incapazes para os atos da vida civil! Ficaram deformados, acamados e recebendo alimentos por sondas, vegetando, ad eternum. Trágico! Mas, gente, além de assaltar, aviltar e tirar a segurança de um cidadão dentro de sua própria casa, porque além do mais violentar, estuprar e matar? Incompreensível como a mente humana pode ter lapsos de uma maldade que sequer o mais irracional dos animais é capaz de ter.

Poderia ser um dos temas de minha insônia, e é, mas não a de hoje. É curioso, cada insônia tem sua motivação.

O casamento. Não quererás mais, de maneira alguma, maltratar esta mulher maravilhosa à qual “escolherdes” para o matrimônio! De modo algum, bêbado agora que estás, como sempre, mas é época de fim de ano, mas que havias pensado, sóbrio, anteriormente, e por um bom tempo, jamais quererás maltratar a mulher com a qual se casares! De forma alguma! De agora em sempre, um templo sagrado de tua vida, onde tudo pode e por tudo farás! Por que sabes que a terás a hora que quiser e na cama que escolherás, parafraseando Manuel Bandeira.

Odeio bandidos! Principalmente os que rondam a noite, como dito alhures, mas não vale repetir, eis serem muitos. Em pesadelos os vejo adentrando meu quarto de repouso, no breu da noite, com um facão, e eu os estrangulo a todos com minhas meias fedidas, que corri na manhã anterior. Nem sei se isso é pesadelo ou ato onírico de heroísmo. Nem sei mais muita coisa, mas o que sei é o suficiente para me manter bem e vivo, mesmo dormindo. Ah, só lembrando, quando for viajar de avião, não se esqueça de ter sempre em mãos um exemplar do Fernando Sabino. Dá sorte! O avião nunca caiu em situações análogas!

Há aproximadamente (como gosto de usar o termo aproximado) três anos moro nesta casa e nunca tinha feito o que faço agora; sempre cogitei, apenas. Porém “cogito ergo sun”.

Tem muitos segredos a dizer, e um só amigo pode ouvi-los. Sabe muito bem quem é, mas não é conveniente dizê-lo agora. É um mestre na situação!

Você precisava disso, meu velho amigo! Sabia disso há um bom tempo, porém negligenciava. Sabia!

Sabia que nem imagens, nem sons, nem nada, que não fosse a palavra dita, escrita: bendita ou maldita, que seria sua estrela guia! Você sabia e fingia que isso era coisa de noite ou dia, madrugadas frias, e que hora mais outra se extinguiria. Mas não, a coisa vai mais além, além do que sua própria alquimia possa explicar, ao bom modo de Pascal. Precisa voltar!

Seu computador ainda respira, transpira e pira como sempre, a computar sua dor, seu amor, seus dias, noites e sóis, e não há quedas que não o torne mais potente: é uma máquina surreal!

Se você tivesse feito isso mil vezes antes de se matar, provavelmente teria algo similar ao que James Joyce fez, sem querer se gabar! Mas já que se matou, faça algo equiparado ao “Velho e o Mar”.

Natal melhor que esse não poderia existir. Passaste, seu animal, com a churrasqueira apagada, os gritos abafados e distante, bem distante, dos abobalhados!

O silêncio, o álcool, o sexo e o teclar das “máquinas” são o melhor da vida!

O silêncio, talvez, é a única coisa que levamos... Mas até lá é uma longa história a ser posta em algum jornal de fim de ano, informando os mortos daquele ano, talvez. Não há certezas enquanto vivos; há ratazanas, se é que se tem alguma correlação...

Deteste bandidos! Principalmente em festas de fim de ano, onde todos se refestelam pelas agruras do ano que se fora. Pela terceira vez cito neste texto. Li Roberto Drummond uma vez e fiquei traumatizado. Detesto também o detestar alguma coisa, isso só prejudica o estômago. Mas não deixo também de indicar a leitura de Roberto Drummond, que é excelente.

Outra coisa detestável são os fios. Isso, os fios de qualquer coisa: de liquidificador, geladeira, notebook, principalmente, os fios da meada e da vida, os fios da dor, o fio da navalha é o caralho. Realço: detesto também os fios! Se enrolam em tudo; estão sempre enrolados, parece macumba; Se se deixa um fio liso ela amanhece enrolado, parecendo cabelo de “nega matreira”. Fios, só se for mesmo de “nega matreira”!

Mas isso me remonta a Jorge Amado e Dorival Caymi (escrevi corretamente?) e já fico comovido. Capitães de Areia me matam!

Outra coisa, e pra finalizar, até porque é o derradeiro copo de cerveja, que não seja o último coito, é o fato de que detesto bandidos, principalmente os noturnos...

Savok Onaitsirk, 26.12.10.

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 27/12/2010
Código do texto: T2693764
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