Depoimento: Corrida da Ponte

O relógio e o despertador do celular tocam simultaneamente, marcando 5h. A logística até a largada não seria trivial nem rápida, era preciso sair cedo. Como algumas bananas e levo outras para o caminho. Às vezes, acordamos achando que teremos um dia comum, ordinário, e ele se torna especial. Outras vezes, já sabemos que será uma data extraordinária. Esse dia 17 de abril seria do segundo tipo. Entre março de 2000 e dezembro de 2006, fiz graduação e mestrado em Niterói. Muitas idas e vindas de barca, ônibus, van e, no final, de carro. Nenhuma seria igual a essa. Saio de casa exatamente uma hora depois, já com os primeiros raios do dia. Minha roupa de corrida contrastava com as ruas de Copacabana naquele horário. Um desajuste. Caminho até o ponto de ônibus, que demora um pouco a passar.

Chegam um senhor e uma mulher, com trajes semelhantes ao meu. Entramos na primeira van que passou, afinal a fila nas barcas prometia ser longa. Imagino que o primeiro dígito da idade dele seja no mínimo 7. Ou quase. Eram de Minas Gerias e conversamos sobre a Volta da Pampulha. O cidadão aparentava forma extraordinária. Em resumo, impressionante. Esse tipo de história faz toda a graça de participar desses eventos. Ao chegar na Praça XV, muita gente, fila – surpreendentemente rápida e organizada - e me separo dos meus colegas de esporte. Confesso que duvidei que os poucos horários de transporte fossem suficientes. Uma travessia diferente, repleta de atletas. E agora não era para uma aula de cálculo no Valonguinho.

Pontualmente às 8h, iniciamos os primeiros passos. “Em alguns minutos, estarei correndo na Ponte!” Há um ano, não sabia que era possível, agora estava a algumas centenas de metros. Passamos pela praça do pedágio com as naturais brincadeiras dos colegas: “separa o troco” ou “cuidado com o radar”. Esperava o tradicional forte vento lateral. Nada. Nem uma leve brisa pra amenizar o calor. Eu estava bem preparado para correr 21km.

Nessa fase de preparação para correr a Maratona do Rio, em julho, recentemente tinha feito treinos mais longos que a distância da meia, sem maiores problemas. Pego água em todos os postos de abastecimento, bebo e molho a cabeça. Sigo fielmente todas as recomendações de corrida sob essas condições. A subida do vão central não se revelou tão assustadora. Começo de prova, calor ainda só aumentando. Não buscava grandes marcas pessoais, queria apenas aproveitar o trajeto inovador. Sigo um ritmo confortável, próximo de 5:15 min/km. Do alto da ponte, cenário conhecido, mas experiência única. Dia espetacular. De paisagem e de experiência.

Bom, ainda não estou nem na metade, de volta “ao trabalho”. Alguns iniciam passos de caminhada ao meu redor, ainda na descida. A situação iria piorar dramaticamente no Viaduto da Perimetral, trecho final da corrida. Agora, muitos caminham. “Xiii, a coisa tá feia mesmo, melhor eu ir com calma”. Um colega à frente parece estar em sérios apuros, apoiado na mureta. Outros ajudam e o retiram da beirada. Aproximo e vejo que a situação era crítica. Espero um pouco, e a ambulância chega rapidamente. Percebo que não era uma experiência isolada, o calor fortíssimo certamente foi um grande desafio e derrubou muitos colegas, mesmo gente bem treinada. Até o pára-quedista veterano que vi na largada parece cansado, mas ainda corre. Só lembro de situação semelhante na Volta da Pampulha, ano passado, quando contei 15 saídas de ambulância.

Ainda faltam alguns quilômetros. E como dizem os alpinistas, a atividade só acaba quando chega-se de volta ao acampamento. O cume é só metade do trajeto. Aumento a velocidade, mas o calor cobra seu preço. O tiro final foi mais fraco que o desejado. Pouco importa, hoje corri na Ponte!!

Agora posso acrescentar mais um “modal de transporte” no meu trajeto Niterói-Rio. Será que um dia volto nadando? Hahaha.

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ARunning
Enviado por ARunning em 28/04/2011
Reeditado em 12/07/2011
Código do texto: T2935923
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