FOTOGRAFIA

     Uma imagem vale mais que mil palavras, é o que dizem os propagandistas. O que eu vejo de mais interessante numa imagem é a capacidade que ela tem de nos fazer gerar ideias. Dessa forma, ela nos faz pensar e não se constitui apenas num mero instrumento de informação.
     Gosto de pegar uma fotografia lá de dentro do baú, dos meus velhos tempos e ficar “lendo nas entrelinhas”: o que ela representa, porque e como foi feita, que momento da minha história de vida e da vida de minha família, minha comunidade, bem como do meu país ela retrata, que ideologias ela passa e fico assim, extasiada com todas as possibilidades que ela me proporciona, toda uma série de reflexões e relações tão peculiares e que me “moldaram”, literalmente, em termos de vivência, formação, personalidade, hábitos e costumes. O que eu fui ontem é determinante do que sou hoje e vice versa. E nada melhor para retratar isso do que uma foto.
     Essa, para mim, é uma das mais significativas. Eu, com 09 anos, na terceira série do Ensino Fundamental. A foto foi feita no Grupo Escolar Ayrton Plaisant e era uma festa sempre que os fotógrafos vinham na escola. Os alunos ficavam alvoroçados e todos queriam sair bem, principalmente as meninas, como sempre as mais vaidosas. Penteei o cabelo, coloquei um “arquinho” de plástico (usava-se muito isso), ajeitei a franjinha e caprichei no sorriso. As fotos eram reveladas na hora e quando vi a minha, achei muita graça, pois um dos símbolos da bandeira do Paraná (que servia de pano de fundo para a foto) foi colocado com a ponta bem em cima da minha cabeça.
     Por muito tempo, fui alvo de gozações. Os colegas da escola me chamavam de “cabeça de pinheiro” e caíam na gargalhada.   Isso me fez perder a graça na foto, mas mesmo assim minha mãe (com sacrifício, pois nossa situação financeira não era das melhores), comprou a minha e a de meus irmãos. As fotos eram vendidas aos pais e esta era uma forma da escola fazer um “caixinha”, pois naquela época (como até hoje), a verba recebida para a manutenção das escolas não era suficiente.
     Corria o ano de 1963. Eu sorridente, de guarda pó branco, nem imaginava que o país vivia um período turbulento, que culminou com o Golpe Militar em 1964. Caia João Goulart e os militares tomavam o poder. Papai foi perseguido por sua participação politica e por várias vezes, teve que se esconder, para não ser preso. Tempos difíceis.
     Nessa época, escrevi meu primeiro texto significativo: uma redação sobre minha mãe. Em casa, o caderno passou de mão em mão e todos riam muito. Lembro-me dos comentários que faziam: “A pontuação está correta”, “as ideias são claras”, “escreveu sua opinião sobre a mãe” (questionavam: como uma menina de 09 anos pode ter opinião formada sobre alguma coisa?) e todos ficavam admirados!  
     Nesse episódio, fiz minha primeira descoberta em relação à comunicação escrita: percebi que as coisas que eu escrevia causavam reação nas pessoas e isso era muito bom! Na verdade, essa imagem para mim representa a descoberta do meu dom para escrever. E foi assim, com essa descoberta, que eu me descobri!  


By Angela Ramalho
Imagem: acervo pessoal
http://naosoupatriciamaissoupoeta.blogspot.com