AINDA É TEMPO

Manhã de segunda. Podia não ser, mas era. Jorge sentiu o gosto amargo da caipirinha da noite anterior. Até que tentou ficar mais um pouco no sofá, mas apesar da dor de cabeça, precisava encontrar com um cliente as nove. Fazer o quê? Afinal era um dos melhores advogados do Rio de Janeiro. Ergueu o corpo, balançou a cabeça. Foi até o banheiro e olhou no espelho. "A barba" pensou passando a mão no rosto. "Tudo bem" fez a barba. Tomou banho. Vestiu o terno. Conferiu os papeis na pasta e foi.

Chamou um táxi e aguardou próximo a entrada do prédio. O dia era frio. O vento varria seu rosto. Sentiu o gelo do contato e comparou ao frio da alma. Era um homem solitário. Evitava convivências. Na verdade tinha medo de sofrer. Porém naquela manhã, o vento frio foi uma mensagem para ele.

E foi aí que se deu conta que não falara com o porteiro. Voltou até a entrada e disse: "Severino, a solidão contamina. Não sei quantas vezes esquecei de falar com você, por isso me desculpe e Bom dia". Falou, virou-se e entrou o carro que já o aguardava.

Severino viu o homem seguindo o seu destino. Ainda estava muito surpreso com o acontecido. Trabalhava há seis meses naquele prédio e pela primeira vez o tal Doutor Jorge dirigia a palavra a ele. "Eu Hein?!" pensou, "Solidão contamina" concluiu.