festa
 
de Wander Piroli

 
Atrás do balcão, o rapaz de cabeça pelada e avental olha o crioulão de roupa limpa e remendada, acompanhado de dois meninos de tênis branco, um mais velho e outro mais novo, mas ambos com menos de dez anos.
  Os três atravessam o salão, cuidadosa mas resolutamente, e se dirigem para o cômodo dos fundos, onde há seis mesas desertas.
  O rapaz de cabeça pelada vai ver o que eles querem. O homem pergunta em quanto fica uma cerveja, dois guaranás e dois pãezinhos.
  — Duzentos e vinte.
  O preto concentra-se, aritmético, e confirma o pedido.
  — Que tal o pão com molho? — sugere o rapaz.
  — Como?
  — Passar o pão no molho da almôndega. Fica muito mais gostoso.
  O homem olha para os meninos.
  — O preço é o mesmo — informa o rapaz.
  — Está certo.
  Os três sentam-se numa das mesas, de forma canhestra, como se o estivessem fazendo pela primeira vez na vida.
  O rapaz de cabeça pelada traz as bebidas e os copos e em seguida, num pratinho, os dois pães com meia almôndega cada um. O homem e (mais do que ele) os meninos olham para dentro dos pães, enquanto o rapaz cúmplice se retira.
  Os meninos aguardam que a mão adulta leve solene o copo de cerveja até a boca, depois cada um prova o seu guaraná e morde o primeiro bocado do pão.
  O homem toma a cerveja em pequenos goles, observando criteriosamente o menino mais velho e o menino mais novo absorvidos com o sanduíche e a bebida.
  Eles não têm pressa. O grande homem e seus dois meninos. E permanecem para sempre, humanos e indestrutíveis, sentados àquela mesa.

Escrito em 1963, lançado no livro A mãe e o filho da mãe, de 1966.

 
Wander Piroli
Enviado por Germino da Terra em 12/08/2011
Reeditado em 08/10/2011
Código do texto: T3155876
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