A terceira Parte da Luta pela sua Cidadania. Atualizada

Catarina fazia parte dos sem nome. Ela não tinha a Certidão de Nascimento. O único papel que comprovava sua existência era o seu batistério. Era com ele que se realizava a sua matricula Escolar.

Depois de tantas repetições de ano, finalmente Catarina, passa para a segunda séria do primário.

Nos exames finais de cada ano, se deslocava um profissional da Cidade de Catanduva para realizá-los. E funcionavam assim: _ O questionário era oral. Que se seguia para os testes da primeira série do primário eram as seguintes questões: _ qual é o nome do Presidente da Republica? Qual é o nome do Governador do Estado? Qual é o nome do Prefeito da sua Cidade? Este teste tinha um grande peso. E, então seguia a leitura de um texto escolhido pela pessoa que aplicava o teste.

Era aprovados ou reprovados conforme o seu desenvolvimento de leitura e a respostas do tão famoso questionário, somando mais as duas notas de participações e provas durante o ano letivo.

A menina franzina mal trajada, de cabelos longos e castanhos claro; dizendo melhor, sapecado pelo sol, e pela higiene do sabão de soda, olhos meio esverdeados, pele clara queimada do sol, mãos grosas de calo do cabo da enxada.

No dia do exame final estremeceu-se, ouvindo o chamado da pessoa que solicitava o seu nome para a leitura.

A mesa onde estava sendo realizados os testes ficava bem aos pés de uma imagem de nossa Senhora Aparecida. Catarina recebe o livro e junto uma tempestade de humilhação da sua professora, que diz:

_ Vamos vê se hoje sai da repetência, sua burra. Não sei como pode não entra nada nessa cabeça oca!

_Também com os pais que tem, nunca aparecem na escola!

Esta foi a primeira pessoa que pega em sua mão para dar os primeiros registros de coordenação motora que é preferido guardar o seu nome em segredo. Da qual não lhe deixou boas lembranças, todos os dias no final ou no inicio de cada aula, ela lia uma historia para a sala toda, e no dia dos

testes oral tinham que narrar uma das historias contada. Isto se resultava em tantos castigos!

Catarina estudou com esta professora até a quarta série do primário, esta pratica de ensino adotado era a mesma em todos os anos. Catarina nunca gostou desta “mestra”, era uma verdadeira mão de ferro, educadora, muito má, não dispensava os castigos de joelho nas tampinhas de garrafas e caroços de milho, para quem não desse o resultado que a “boa mestra” esperava. Isso era recomendação dos pais, pois a Escola era a extensão das suas casas, onde os professores substituíam os pais no momento que

estavam na escola. Catarina quase não dormia na noite anterior dos testes, não da para esquecer, não tinha ajuda de ninguém para os testes. Não resultando em nem uma satisfação para a mestra; em conseqüência da fome e também do medo de errar fazia com que ela esquecesse tudo. Depois do desacato, Catarina trata de fazer a leitura, com as mãos tremulas, soando frio, o coração disparado, os olhos lagrimejando a leitura começa:

_ A raposa e o corvo:

_ Um dia um corvo estava pousado no galho de uma árvore com um pedaço de queijo no bico quando passou uma raposa. Vendo o corvo com o queijo, a raposa logo começou a matutar um jeito de se apoderar do queijo. Com essa idéia na cabeça, foi para debaixo da árvore, olhou para cima e disse:

_ Que pássaro magnífico avista nessa árvore! Que beleza estonteante! Que cores maravilhosas! Será que ele tem uma voz suave para combinar com tanta beleza? Se tiver, não há dúvida que deve ser proclamado o rei dos pássaros.

Ouvindo aquilo o corvo ficou que era só vaidade. Para mostra á raposa que sabia cantar, abriu o bico e soltou o sonoro “Cróóó!”. O queijo veio abaixo, claro, e a raposa abocanhou ligeira aquela delícia dizendo:

_ Olhe, meu senhor, estou vendo que voz o senhor tem. O que não tem é inteligência!

Catarina engoliu palavra por palavras; ela havia decorado aquele texto que lhe - coube a sorte; e foi nota dez!

Por um instante restitui a paz ao seu espírito.

A diretora recolheu o livro e lançou dez; e diz:

_Qual é o nome do Presidente da República?

Estava ali na ponta da língua: _ Ernesto Gaisel.

_Qual o nome do Governador do Paraná?

_Jaime Carnet Junior

_ Qual o nome do prefeito da sua Cidade?

_Vai guria, você esta aprovada.

Durante alguns minutos não se ouvia mais nada que o barulho das suas pisadas no cascalho em direção a casa. Catarina tinha todo o motivo para estar com o coração saltando com o resultado. Afinal de conta neste dia ela havia se livrado de mais uma humilhação de não haver sida reprovada, ela era considerada pela professora portadora de déficit de aprendizagem; que no qual lhe descriminava muito. Livrou-se neste dia dos praguejamentos da sua professora. Catarina não agüentava mais toda aquela situação. Além da professora, mais a molecada gritando em seus ouvidos: _ burra, burra... Repetente...

O de passar de ano era mesmo para ela uma façanha; ainda na rua, como de costume, ela não se cansava de olhar as modernas matérias Escolares que haviam aparecido pelo comercio da li, naquele ano. Era mochilas escolares, borrachas de duas cores, cadernos de mola, espiral.

Ela não conseguia parar de pensar na encrenca que havia se metido; por ter passado sem saber ler. Pensamento que lhe atormentava com gritos mudos, que a transformava em um arsenal de guerra interna pavoroso. Ela só não conseguia ouvir desta vez mesmo, os gritos da molecada como de costume nos outros anos que gritavam atrás dela na rua ao sair do exame final: repetente, burra, repetente.

Ela esta em casa a pensar; sentada em um banquinho de madeira próximo de um pé de rosa, que no qual era o seu pé de roso preferido. Havia outras espécies de rosas e flores no jardim, mas aquela era a sua predileta; o pé de rosa vermelha. Catarina havia feito um versinho para ela, mas nunca deixava sua mãe ouvir.

O versinho era assim:

_Tu és a rosa mais bela,

deste meu jardim em flor

não é branca e nem amarela

E da cor do meu amo!

Logo se pega a pensar: _ Meu Deus, minha Nossa Senhora da Aparecida! Oh, meu Deus o que faço agora?

A mãe que não sabe do acontecimento, balança a cabeça negativamente diz:

_ Menina sai do mundo da lua e vem me ajudar! Esse povo novo vive com a cabeça ao vento!

A mãe diz isto porque Catarina parecia estar com o pensamento muito longe dali. Na noite deste dia Catarina havia combinado um pequeno roubo. O roubo de um creme dental.

Bem próximo da sua casa havia um armazém de cecos e molhados, onde o furto ia acontecer.

O roubo foi combinado quando o lampião a gás do estabelecimento se apagasse. Nesta hora era para ela se colocar no pé da janela do quarto da

guria, que trabalhava como baba da guriazinha filha dos comerciantes.

Tudo aconteceu como o combinado o furto foi feito na maior cautela. Apaga o lampião e lá estava a Noêmia no pé da janela. Não demorou muito a janela se abre o suficiente para que a mão da guria possa recolocar objeto em suas mãos.

Catarina não deixou para o dia seguinte, pois ia poder escovar os dentes só à noite, com muito segredo, pois se seus pais descobrissem o furto; o laço ia cortar dobrado.

Ela entra pé, por pé que quase nem respirava em rumo ao balde de água, tudo no escuro, ela estava com sorte que pegou a água com um copo de alumínio, o balde também de alumínio, e sai sem ser vista, na ânsia de escovar os dentes pela primeira vez, e pensa:

_ vou colocar bastante creme na escova que é para amanhecer com os meus dentes bem branquinhos. Foi a maior besteira, quando começa a escovação os dentes, o creme espumou de tal maneira que a água que leva não deu nem para o começo, foi difícil para retirar o gosto horrível que o creme deixa na boca. O creme espuma como sabão é gosmento e liso, então fica ali sentindo muita náusea. Obriga-se a ir dormir com a boca espumando, pois na segunda vez que foi pegar mais água, ela esbarra com o copo no balde que faz um barulho, um pouco alarmante, deu no fundo do balde. O seu pai deu uma tossida, então melhor dormir com o paladar gosmento do que levar uma bela surra por cima, pois assim era uma

amargura só.

Recolheu-se deitando bem de mancinho, o encolhe se como se estivesse ainda no ventre de sua mãe.

Quando pela manhã, muito cedo, não tendo dormido mais que duas ou três horas, a lua cheia clareava ainda o vilarejo com os seus últimos raios, quando ela adormeceu. O sol nascente já dourava o vilarejo com os seus primeiros raios; vindo acordá-la, com a boca ainda sapecada pelo creme. Ela sai disfarçadamente pelo fundo da casa, enquanto a mãe prepara as marmitas de feijão, quirelinha de milho e mandioca para almoço na roça;

Antes que alguém do estabelecimento acordasse bate na janela da Lina, a guria que havia lhe “presenteado” com o produto, abre a janela bem de vagarinho. Então Catarina já com cabelos preso e um chapéu na cabeça, pronta para o trabalho chega de mansinho para devolver o creme, preferia que os dentassem caíssem todos, mais não ia usar aquela porcaria.

Quando ela com cara chateada conta o acontecido; a amiga não se conteve, rindo por um bom tempo, ela que já estava se ardendo de nervosa com toda aquela situação, diz:

_ Ri por quê?

A amiga se conteve e diz:

_ Este não é creme dental, eu peguei errado! Alina com o creme na mão

repete:

_Minha nossa Senhora da Aparecida, isto é creme de barbear Bolzano!

Então foram risadas para todos os lados, que pena que não podiam rir muito. A conversa não durou muito foi só o tempo de esclarecer os fatos, Catarina tinha que pegar logo o caminho da roça.

À noite como o combinado o creme dental estaria lá na janela, tudo do mesmo jeito só que com mais cuidado parra não errar novamente.

O creme de barbear foi para a privada.

Na noite tudo correu perfeitamente sem erro. Agora sim; Catarina ia prova o frescor do creme dental.

Durante o dia a guria mediu quantas passadas ela dava para chegar até a prateleira do creme dental. E sai tudo perfeito.

Alina percorre rapidamente pelo estabelecimento e traz um creme dental. Agora sim a Catarina tinha um verdadeiro creme dental, mas era bem escondido.

Pobre da Catarina tinha uma dor de dente infernal, parecia que quando ela escovava ai que o bicho doía para valer.

E Catarina já em casa, bem a tardezinha, de volta da roça; sofria de tudo! Sofria com o pavor de ter passado de ano sem saber a ler, que ainda lhe atormentava, sondando o seu ser se questiona:

_ Por que eu fui fazer aquela leitura decorada? Mas também eu nem pensei nada naquela hora. O que seria de mim se eu dissesse que li somente porque havia decorado o texto? Mas agora vou aprender a ler de qualquer forma!

E desesperada pela sua aprovação, sem saber ler, que coubera lhe a sorte de ter caído um texto que ela havia decorado.

No momento não sabia se havia sido uma sorte ou um azar, com muita preocupação em meio aquele tumulto de pensamentos, volta-se a Deus, dentro do pequeno quarto, se ajoelhando, a rezar.

Ela precisava aprender a ler, mas como? As férias não eram tempo suficiente para aprender a ler, pois se em três anos não consegui, não era agora que iria aprender. Ainda mais sozinha! Deus tinha que salva-la.

Depois da oração abriu os olhos e ficou olhando um pouco para o céu e para a imagem da Nossa Senhora Aparecida com suas mãos postas uma a outra, ainda preocupada continua ajoelhada, quando ouve vozes masculinas, logo se levanta e sai curiosa para ver quem era. Quando ela se aproxima da porta do quarto que saia para a porta da cozinha; lá estava em pé, seu pai na porta da cozinha saída para a rua, e dois moços do lado de fora de frente com seu pai, onde, tentava vender um livro e evangelizá-lo.

_ O pai de Catarina interrompe a pregação e diz:

Olha meu jovem, se nos formos discutir esta questão vai dia e noites adentram, e eu não tenho tempo.

Então ele pergunta aos jovens:

_ Quanto custa este livro?

Os Jovens ainda tentam dar maior explicação sobre o assunto; mas eles foram cortados pelo Florisvaldo, pois ele tinha pressa em despedir-lhes, a mesa de baralho lhe esperava; rapidamente passa o dinheiro e pega o livro dando as costas aos jovens e coloca o livro sobre a única mesa da casa, mesa da cozinha. Saindo apressadamente. Ele era viciado em jogo de baralho.

Noêmia pega o livro que passa ser venerado por ela, que diz:

_Oh, que belo livro!

O livro era um livro de capa dura, cor vermelha. Na capa estava escrito com letras douradas Deus é Jeová. Ela não tarda e começa explorar, folheando as páginas e admirando as letras.

Diz em pensamento:

_Oh, quando eu souber a ler! Logo ela monta um cenário atrás da velha casa, apoiando-se em uma cadeira de acento e encosto de palha; apóia-a nos dois pés traseiro da cadeira, inclinado-a e encostando-se à velha parede da casa.

Esta cena todos os dias se repetiam. E o seu coração ia horas tristes e horas alegres, triste por não saber a ler, alegre por agora ter um livro em casa só para ela, pois ela foi a única pessoa que se interessou pela obra. Ia triste também por que as férias já estavam se acabando e nada de saber ler.

Catarina bem lá no fundo da sua consciência dizia:

_ Preciso aprender a ler, quero aprender a ler. Esta voz não se apartava dela um instante se quer; a não ser quando dormia e mesmo assim ainda tinha pesadelo, sonhando com a professora sargento, brigando e colocando-a de castigo.

Ela em continuo pensamento se pergunta:

_ E agora, o que vou fazer?

Para a Escola ela precisava voltar. O pavor de ter passado de ano sem saber ler ardia sua idéia.

Uma salinha mal iluminada, um ar de pobreza, faz parte desta historia da nota dez da decoreba, ela debruçada na mesa não se ouvia mais que o barulho do folhar do livro, na tentativa de aprender a ler, logo é interrompido para uma breve oração, mas em seguida, continua a folhar o livro na calada da noite.

Menina humilde, nem um adorno havia em sua fisionomia, a não ser o seu próprio penteado, os cabelos tinham um forte odor, pela fumaça do lampião a querosene, ela com grande habilidade rapidamente alisam os cabelos apanhando-os e fixando-os no alto da cabeça com uma velha tira de pano.

Em silencio ela diz:

_ Um dia aprendo a ler e vou ler para muitas pessoas. Em seguida ela sentiu-se amparada, grudando-se no livro, cuja uma obra que nunca havia visto.

Na sua casa nunca havia entrado nem um tipo de livro, a não serem recortes de jornais que vinha embalada a carne do açougue, santinhos políticos e textos litúrgicos da missa.

A casa dela não era diferente da imensa maioria das crianças e adolescentes do Brasil, daquela época, era uma sociedade a parte, deste outro lado do mundo, só se via um mundo cinzento.

cresceu numa casa que não havia livros algum, o dinheiro era muito reduzido para comprá-los. Desde os oito anos de idade trabalhava na lavoura para ajudar nas despesas da casa.

Catarina ali naquele encanto com o livro; demora mais que pode apreciando as letras na luz da lamparina, entre uma folha e outra, alisava-as, arrancando uma idéia ali outra aqui, e imaginava o dia que desencantasse aquelas letras; era o que mais sonhava, passava os olhos pelas letras douradas da capa do livro, mais um olhar para uma imagem da Nossa Senhora Aparecida.

A imagem estava encaixada preza a uma caixinha na parede, uma espécie de Santuário. Então se apega a ela, era uma fé católica, mas o que estava sendo demais era o livro, pois não via nada a não ser o livro em sua frente. Este olhar foi só para descansar as vistas, os olhares para outras coisas eram somente, sorrateiramente.

Nas vésperas de volta as aulas, estava lá de visão turva provocada pela fumaça do lampião de querosene, quando repentinamente branda uma voz:

_Guria, você não cancã de ver este livro? Era a mãe de Catarina que dava ordem de que ela fosse dormir.

A pobre menina, que folheava o livro mais delicioso do mundo; no sentir da dificuldade que se encontrava em meias aquelas letras, caiu naquele momento de toda a altura das ilusões na mais dura e miserável realidade longe do que se esperava.

Parecia estar escrito que não teria a felicidade de aprender a ler. Isso não passaria de um sonho, e era o mais belo de sua vida.

Não havia nada que pudesse remediar, folhando mais a ultima pagina, já com a visão mais turva ainda, retirou-se para o quarto como de costume.

O quarto era coletivo, onde dividia com seus cincos irmãos, que dava para os fundos da velha casa, uma casa de madeira coberta de tabuinha.

Ela entristecida entra-se no quarto, pois não havia alcançado nem um sucesso no aprendizado. O desespero invade sua mente. Foi se deitar bem curvadinha que parecia estar dentro de um ventre. Ela se encosta a parede, próximo a uma fresta entre duas tabuas que davam para traz da casa.

Inquieta, sentia a dor das palavras da sua professora, com o medo de ser castigada, tinha vontade de não ir mais para a Escola, na mesma hora ela se encorajava, queria ser respeitada, mas como ia crescer na vida se não estudasse? Ela não tinha tempo de estudar de dia; e a noite era escura, a luz da lamparina era regada, não podia ficar com ela muito tempo acesa.

Catarina coloca a pensar:

_ Criança não devia fazer serviço de gente grande.

Ela tinha uma força de vontade superior a sua idade.

Os pensamentos ainda fervem em sua idéia:

_Se eu desistir de aprender a ler, jamais serei respeitada. E com certeza ela seria mais uma dos milhões de brasileiros analfabetos. Ela tinha esta somatória porque a sua professora o lembravam todos os dias; de que ela ia fazer parte deste grupo, pois não conseguia aprender nada.

Ela já estava há um mês e meio, mais ou menos nesta vida, tentando sair da decoreba, pois havia decorado quase todas as lições da cartilha primaria. Catarina tinha dentro dela um, certo motorzinho que não deixava desistir; mesmo quando pensava que talvez fosse insignificante o seu esforço de todo ao meio aquele livro com tantas pagina cheio de tantas letras que ela não conhecia.

Na verdade ela conhecia quase todo o alfabeto, mas não sabia o significado, ou seja, não conseguia junta-las para formar as palavras. Ela estava ali todos os dias, nas horas de que lhe folgava dos trabalhos domésticos e da lavoura, atrás da casa folheando o livro e observando as palavras.

As horas de cenários durante o dia só eram possíveis aos domingos, pois durante os dias de semana lhes sobrava muito pouco tempo. Então era a noite que ela abraçava-se com o livro na luz do lampião a querosene.

Ela tomava muito cuidado para não cair picumã no livro, mas isso às vezes era impossível e então o borrão preto estava lá fazendo parte desta historia. Quando isto acontecia o jeito era tentar minimizar o borrão soprando para fora do livro, pois se tentasse tirar com a mão a situação do borrão piorava.

O fato de Catarina estar em uma viagem desta, dentro de um livro, sem saber o significado das letras eram algo bastante corajoso e de muito otimismo, em pensar que poderia aprender sozinha, acreditando na sua capacidade.

Ainda, sem dormir, ela busca imaginação, que para ela a imaginação havia se tornado tão importante na sua vida que dorme imaginando um dia que pudesse ler para muitas pessoas, inclusive para sua professora. Quando adormece vem os sonhos, ela sonha com um lindo cenário, lendo para uma multidão de pessoas inclusive para a professora, mais o que foi difícil mesmo, foi quando acordou e não era real.

Catarina sonhava em criar histórias, compor poemas, ela viajava naquele livro, sonhando o dia que pudesse estudar todo aquele livro.

Seriam doze horas do dia. A Catariana, segundo costume acabava de almoçar; e o livro debaixo do braço, vestido de chita de cós baixo, saia bem rodada, dispunha-se a prosseguir na tentativa de aprender a ler que foi interrompida na noite anterior pela sua mãe que mandou ir para cama.

Ela então entrou no mundo que ela havia criado para ela, atrás da velha casa.

Defronte dela, se estendia um matagal e um canavial em alguns terrenos baldios. Ao lado, a casa de sua prima onde funcionava um velho armazém, ou seja, uma bodega de secos e molhados. Mais a frente morava um senhor que o nome dele nunca se sobe por ninguém só se, sabe que foram um senhor do bem. A sua morada era uma velha palhoça, um senhor mesmo da roça. Naquela pequena palhoça, um franguinho na panela ele sempre a Catarina e mais algumas crianças ele estava sempre esperando.

Então ela ali atrás da casa muito solitária trava-se a folhar o livro na tentativa de aprender a ler.

Mal, porem dava o começo ao apreciar as letras, lançando

uidadosamente o olhar nas palavras escritas naquele tão lindo livro, uma magia, quando foi interrompida por sua mãe, que lhe pergunta; se ela achava que aquilo de olhar aquele livro ia lhe

encher a barriga, pois aonde que já se viu aquilo, que virava e mexia, estava lá com aquele livro nas mãos!

Catarina precisava ir apanhar lenhas para acender o fogo do forno para assar os pães que a mãe havia preparado.

Catarina deixa o livro, em uma palidez que não diz nada. Ela era de dez anos, tipo do sul, franzina, de pele clara, pescoço alongado, cabelos lisos e olhos meios esverdeados que havia herdado de seu pai, pois a sua mãe era de pele morena, olhos e cabelos pretos, mestiçam a índio, os cabelos se alongavam até a cintura; Catarina em um vestido velho de chita, com florzinhas rosa e fundo branco, alterado de vários remendos; e de pés descalços.

_ Que desejas minha mãe? _ perguntou a Catarina, fechando o livro e colocando dentro de uma sacola de plástico, estas embalagens que vem arroz.

Catarina levanta-se da cadeira, com ar muito triste, o livro de escrita dourada na capa, traz debaixo do braço, e a cadeira segura por ambas às mãos. Vai atender o mandado da mãe. Catarina esta cada vez mais pálida com seu livro e a cadeira, sem conseguir mudar os passos.

Então teve a idéia de por o livro encima do assento da cadeira, quando sua mãe saiu ao seu socorro, pegando a cadeira.

As palavras de sua mãe não lhe agradam nada, pois se tratava de ir ajudá-la a buscar lenha. Catarina sai acompanhada pela mãe, mas prometendo-a, voltar ainda naquela tarde para folhar o livro.

A casa dos pais de Catarina era na rua principal. Uma desse casebre de madeira coberta de tabinhas, muito sem gosto, ao lado um velho armazém de um gaucho casado primo dela.

A casa dos pais da Catarina era de três pequenos cômodos. Uma cozinha e dois quartos, um onde se acomodava os pais. O senhor Florisvaldo e D. Ondina. No outro os sete filhos.

Na cozinha se compunha de uma singela mobilha. A mesa, quatro cadeiras, uma prateleira, um fogão econômico e um banco. Os moveis eram todos de madeiras rústicas, menos o fogão.

Catarina nunca logrou espanto de seus olhos de tristeza; era uma criança voltada para o lado triste da vida.

Quando a família raramente se reunia para qualquer solenidade, ela estava lá, sempre muita reservada. Não havia risada expansiva, nem livres exclamações de glorias. Catarina fazia uma cerimônia danada para dizer alguma coisa, pois tinha medo de ser repreendida. Os pais poucas vezes arriscavam uma conversa e só se determinavam em brigarem entre si.

O pai vivia sempre desvalido do dinheiro, pois era viciado em jogo de baralho, o que fazia a miséria mais forte em suas vidas. O pai quase nunca estava presente na hora das refeições.

Às vezes aos domingos ou mesmo em dia de semana, aparecia para o jantar, mas isto era um ou outro.

Catarina uma garota bastante proativa, caprichosa em suas tarefas que se encarregava, seja quando se tratasse de sua individualidade, ou quer ser sua responsabilidade de para com os outros, como por exemplo: com a igreja.

Não ia a lugar algum, sem que estivesse bem limpa. Caprichava no asseio da sua higiene pessoal: as unhas, os cabelos mereciam-lhe bons desvelo e atenção, já bastavam os dentes que ela não podia trazer-los limpos, pois lhe faltava escova dental e o creme; sabão de soda para os cabelos e para o banho bem tomado não faltava, D. Ondina ganhava barrigada de porcos do açougue do seu Juca e caprichava no sabão.

Seu Juca era um mineiro que morava ali há muitos anos.

Seu açougue ficava na rua principal do vilarejo, não muito longe da casa da Catarina. Naquele tempo ali não havia vigilância sanitária. O porco de barriga aberta em cima de uma mesa apropriada para o ambiente. Era um sai pra lá lobinho, o mesmo para o macaco e assim era uma meia dúzia de cachorros só do proprietário, sem contar os da vizinhança. Que não era pouco. Era só se descuidar um pouco que, saia dela um sabichão muito feliz com um pedaço de carne, e se alguém que estivesse ali por perto acertasse uma bordoada, levava o pedaço de carne.

Depois só se ouvia o chorar doído do pobre bicho que já contava com o almoço e a janta. E os outros pobres cães que viam o amigo padecer saia na disparada. Era muito difícil carnear um boi lá por aquelas bandas, a pecuária era muito iscasse; ou seja, não existia. O mais era suína piscicultura e ave cultura.

Catarina passava-se por guria de vistas largas e espírito iluminado somente pela sua catequista, apesar de sua repetência. É uma guria de bom tipo dizia sua catequista. A dona Aurora santa mulher de pele morena rosto encantador aparentava muito mais jovem que era; cabelos lisos negros, seus olhos pareciam jabuticabas de estatura reforçada. O que, mais chamava a, atenção era a sua bondade.

Nas escolinhas de catecismo, Catarina se mostrava bastante comprometida. Naquele tempo não era preciso escrever nada nas aulinhas, só era aulas faladas e praticas, pois se fosse teoricamente escrita ela não ia bem, mas Catarina ia bem, eram só umas aves Maria uns pais nossos umas salvem rainha, uns creio em Deus pai. Catarina sempre fiel as orações, pois ela tinha muita vontade de ter uma família certinha. Que fossem juntos para a igreja.

Ela decorou uma musica do Teixeirinha para cantar para seu pai. A música era mais o menos assim:

Um dia minha filhinha me agarrou pela mão e disse: papai você me acompanhe para uma apresentação, e me levou em uma igreja onde reina a devoção tomei a hóstia sagrada minha santa comunhão...

Só que ela nunca fez isso de puro medo de levar uma boa surra de laço, então resolveu somente rezar pela família.

Catarina estava lá de volta, novamente, atrás da velha casa a folhar o livro, na ânsia de aprender a ler, eram umas quatro horas da tarde, já havia feito um buraco no chão onde ela colocava os pés da cadeira.

Ela estava esbaforida. A tarefa de buscar lenha deixou-a cansada, pois estava horrivelmente calor. Catarina passa à tarde com muito grado a folhar o livro. Então lhe disse a si mesma:

_ Estou livre das lenhas para assar o pão, tenho ainda muito tempo para estudar, com a ajuda da iluminação do sol, pois ele não reclama de me dar a sua linda luz.

Sua alegria dura pouco, onde novamente é interrompida pela sua catequista; tratava-se de uma oportunidade única. A dona Aurora havia conseguido bolsa de estudo para Catarina e para sua irmã abaixo dela. A Terezinha; em um colégio interno em Curitiba. Catarina recebe-a, que vinha acompanhada de Madre Maria.

Lá do canto da casa lhe perguntou se podia falar com a sua mãe.

_Tenha a bondade de chegarem. Disse Catarina.

A Dona aurora acompanhada com a madre Maria, aproximou-se da velha casa. A Madre Maria com veste tradicional. De pele branca e olhos azuis, de estatura bem alongada, magra, de rosto rosada, sapatinhos de

verniz, que lhes desapareciam-lhe na barra do vestido.

Dona Ondina sai na porta da cozinha, num acanhamento que dava dó.

_ Que desejam? Meia gaguejando Perguntou Dona Ondina, passando as mãos nos cabelos, mal tratados lavados com sabão de soda.

Elas avançam alguns passos, com ar de felicidades, de bem com a vida.

_ Desejamos falar com a senhora a respeito de uma bolsa de estudo para a Catarina e para a Terezinha.

_Cheguei hoje de Curitiba, vim trazer a Iracema para visitar os seus pais.

Diz Madre Maria.

Iracema era uma jovem de cor negra, seus pais eram muito desprovidos, de dinheiro, a mãe sofria de doenças mentais, vivia pelas ruas sendo judiadas pelas outras pessoas. Era uma discriminação que doía na alma, seu pai era alcoólatra. A moça já estava no convento a um ano. Quando, foi levada a dona Nazaré para tratamento que cujo resultou em uma melhora extraordinária que depois até na roça trabalhava, já o pai seu João não teve a mesma sorte morreu na cachaça. Há uns dois anos depois que a filha havia saído de casa para estudar.

_ Tenha a bondade de entrar. Disse dona Ondina.

Catarina já foi arrastando as cadeiras para se assentarem.

_ Parece que foi ainda ontem que vim aqui com os missionários. Vi ela no catecismo e na procissão de nossa senhora de Fátima, lembro muito bem do cântico que Catarina e a Terezinha cantaram;

_ Aquele, dona Aurora! _ Nossa senhora de Fátima, minha mãe querida receba estas flores e o nosso coração. E, em seguida choveu de pétalas de rosas. Nossa foi muito lindo! Diz a Madre.

E agora Catarina já esta uma mocinha! _ diz a madre Maria; mostrando com a mão aberta a altura da Catarina, aos três anos atrás.

_ Foi mesmo aos três anos atrás. Observou a catequista, transpirando muito, pois fazia um calor enorme.

Fez se, um pouco de silêncio e em seguida a catequista falou do muito que havia observado a luta daquela família para poder

sustentar os filhos, e teve a idéia de interceder por elas, a respeito de uma bolsa de estudo para elas, num convento em Curitiba. Onde a Madre Maria se agradara muito das meninas desde primeiro dia em que havia visto-as.

Catarina e a Terezinha não recebiam incentivo algum dos pais para freqüentar a igreja, pois eles só apareciam na igreja para batizar os filhos e nunca mais. Não eram religiosos.

A catequista citou as virtudes, os fatos que lhes mereceram; disse que encontrara nelas meninas muito esforçadas para o bem e terminou perguntando qual era a posição dos pais a este respeito.

A esta altura o pai já havia chego do jogo de baralho e estava sentado de cabeça baixa só a escutar. Em frente dele se erguia um fogão a lenha com umas panelas encarvoadas pela fumaça. O Fogão já estava quase terminando de assar o pão. Ao lado havia também uma prateleira preta pelo picumã que soltava o fogão.

Trata de ser objetivo a resposta; indagando:

_estudo! Acudiu o seu José. _ mas isso é possível?_ Pois elas não têm a certidão de nascimento! _ Queria ver se é possível tirar a certidão delas ainda este ano para elas poder estudar em paz.

Ele não negava que havia demorado um bom tempo nos de, documentá-las. Trazendo para ele toda a culpa; só que não ganhava o suficiente, pois era muito caro e os políticos todos os anos prometiam de dar documentos, e quando ganhavam as eleições se, sumiam. Só aparecendo nas próximas eleições.

A Madre Maria e a catequista escutaram-no com atenção, a Madre com seu velho costume de apoiar o queixo com a mão esquerda, que apoiava o cotovelo em sua perna também esquerda por sobre a perna direita, ela se envergava o que podia para a mão alcançar o queixo.

Mas um pouco e a Madre pergunta, se ele estava disposto deixar as meninas irem para o convento, sobre documentos ela ia providenciar, e lá elas teriam estudos, e não eram obrigadas a serem freiras, só se elas tivessem vocação, mas dela elas sairiam formadas nos estudos. Seu Florisvaldo disse que sim.

_ Pode ficar sonegado, elas serão de nossa responsabilidade. E se acontecer de que elas nos derem trabalho em não aceitar as normas do convento nós traremos e devolvemo-las, aqui na sua responsabilidade.

O seu Florisvaldo concordou. Dali a pouco a Madre Maria e a catequista saíram acompanhadas até na rua, pelo seu Florisvaldo que promete aparecer na missa.

Seu Florisvaldo deixou que elas fossem; e correu a prevenir à dona Ondina.

_ Tie! _ Disse ele._ Sabes, estamos tendo a oportunidade de estudar nossas filhas! Carece que aproveitamos esta oportunidade.

Dona Ondina respondeu com um gesto de reprovação.

_ Não!

Replicou o seu Florisvaldo:

_ É uma questão de melhorar a vida destas crianças. E depois é em um convento! Que mal pode acontecer a elas?

Mesmo ele não sendo um católico praticante prestava confiança na religião.

_ Lembra da Iracema? Ninguém dava nada pela negrinha, e veja como esta agora! Pois ela sendo filha de uma pobre doida e de um pinguço e sem contar que é negra! Com certeza que se ela ficar lá até se formar vai sair de lá gente, e nossas filhas não vai ser diferente. Já se elas ficarem aqui não sabe que rumo vai tomar a vida destas pobres.

_ Não fica bem nos mandar elas assim! Até parece que você não quer elas por perto! Isto de mandar estas meninas para cidade Grande é os Diabos! Dizem que é uma gente tão vadias, estas de Cidade grande! Diz dona Ondina que não aprovava a idéia.

_ Ora mulher! La tem gente de todos os tipos, igual por aqui! E depois elas vão ficar na companhia de gente boa! As freiras, não deixarão elas por conta! Diz seu Florisvaldo.

_ Bom homem, tu faça o que quiser! _ Só te digo de que estas gentes de Cidade grande são muita reparadeira, e sei que pelo menos com este defeito elas vão vim. _ Elas são tão inocentes! Diz dona Ondina.

_ Não há de ser tanto assim como dizem! Diz o seu Florisvaldo, e saiu para a mesa de Baralho.

Catarina no quarto deitada na cama soprava por entre os dedos com as duas mãos fechadas, estendida sobre a velha tarimba de colchão de palha. O colchão de palha era uma espécie de uma grande fronha como a de um travesseiro cheio de palha que substituía a espuma. Sai dela meio desconfiada e pergunta:

_ Nós vamos então estudar em Curitiba?

_ Isto é o fim do mundo mesmo! Como que pode duas crianças sair de perto dos teus pais! Bem que o profeta São João de Maria dizia que ia chegar um tempo que os pais não teriam domínio em seus próprios filhos, então daí já estava perto do fim do mundo!

Às sete horas Catarina e a sua irmã seguem sozinhas para a missa, pois o pai esqueceu-se do compromisso; e a mãe parecia uma selvagem, era de uma timidez exagerada. Esquivava-se, fazia uma cerimônia danada; para ir a qualquer repartição da sociedade, a não ser para o trabalho, mas que não fosse junto de muita gente.

Na roça ela sempre trabalhava isolada. Era fechada como um túmulo. Catarina ainda ficou algum tempo encostada a porta da igreja, na esperança de que o seu pai dirigisse seus passos para lá; para ele porem, foi indiferente. Catarina retirou-se dali cabisbaixa e triste, cheia de contrários sentimentos, coberta por uma tristeza que bem lhe combinava no momento.

Catarina espreita mais um pouco pelo seu pai e logo vai sentar-se ao lado da sua catequista. Ela e sua irmã estiveram ali silenciosas durante toda a mica.

Catarina despertou enfim dos seus pensamentos, e voltou-se para a missa. Parece estar escrito que todos os seus sonhos estavam falhando, o sonho mais belo de sua infância; a de ter uma família perfeita. Logo a catequista lhe da à mão e diz, parecendo adivinhar o seu pensamento.

_ Tenha bom ânimo Catarina, pois tudo há de se arranjar. Da minha parte, farei de tudo para contribuir para a felicidade da sua família, a que tenho tamanha afeição.

Ela diz isso segurando afetuosamente as suas mãozinhas procurando confortá-la com aquelas palavras de esperança e confiança.

Catarina ficou algum tempo olhando pasmada para ela, como quem refletia em tudo aquilo. No final da missa, Catarina e a irmãzinha deram-lhes os braços, e ambas, seguiram pelo mesmo caminho que guiaram se para casa.

Catarina vestida sem nem uma elegância, vestido de corpo comprido a saia não tinha muita roda, era quase liso, de cor azul já bem desbotado.

O pai da Catarina não se lembrava das obrigações que devia a família, quando sentava em uma mesa de baralho.

No dia seguinte a Madre Maria volta para Curitiba. A catequista fica encarregada de reforçar a idéia perante os pais de Catarina, que seria bom para as gurias e para eles também. Mas foi em vão, nada convence dona Ondina em deixar as filhas saírem longe de casa. As filhas nunca sairiam longe do Vilarejo, a não ser acompanhada da família, ou quando se casassem.

Catarina há muito tempo ardia de impaciência por tal de aprender a ler, pensava nisso todos os dias; fizera cálculos, imaginava futura felicidade no dia que soubesse a ler.

Já estava quase no começo das aulas então estavam lá atrás da casa todos os domingos folheando aquele livro de mais de mil páginas. Ela reclamava para si mesma, a paixão que tinha por aprender a ler.

Entretanto, o tipo franzino, meio ingênuo, dizia ao contrario, do que a professora subestimava, contemplando aquele insignificante rosto claro, um tanto magrinha, aqueles olhos esverdeados, de uma vivacidade infantil, aquela boca estreita, guarnecida de dentes com muitas carieis e desalinhados, a sua educadora não acreditava que ali estava uma sonhadora. Queria ser ao contrario de sua professora.

Catarina tinha o ser todo acanhada, “fraca”, e modesta, não deixava transparecer a brutalidade da sua coragem de lutar pelo que, queria.

Catarina vivia em um lugar onde a maioria das pessoas tinha o pensamento de que mulher não precisava estudar, pois só precisava saber escrever o nome, para assinar no dia do casamento. Isto por que a mulher era só para cuidar de casa. Neste tempo a idéia já estava se acabando, mas onde morava isto estava longe de acabar.

Catarina levava muitas bordoadas; tanto da professora quanto de sua mãe; do pai foi menos castigada, pois ele parava muito pouco em casa, estava sempre muito ausente.

Na escola Catarina, tinha um medo horroroso da professora; tinha ela como uma inimiga ficava toda gelada e tremia quando lhe ouvia a voz ou lhe sentia a presença.

Catarina em algumas circunstâncias se mostrava dócil e amorosa para com a professora, mas era sempre por conveniência.

Aprendeu a fingir de gostar da professora.

Catarina muitas noites dormia agarrada a um (terço), um rosário, quase fora de si, sufocada de soluços. Aos sete anos entrou para Escola. Que tortura! A mestra, mulher grosseira, bruta, de cabelos lisos e bem loiros de olhos azuis. Batia nas crianças por gosto, por um habito de ofício. Na aula só falava aos gritos, como se dirigisse uma tropa de boiada. Tinha as mãos grandes, a voz sempre áspera, e quando o marido lhe dava uns bons sopapos ela ficava pior.

Catarina, quando lembrava em voltar para a Escola sem saber a ler, pensava na estúpida, sentia os calafrios dos anos que já havia passado pelas mãos duras, com ela vinha os desejos de vingar-se em um dia ser letrada e ler para ela e para muitas outras pessoas, mas tinha que ser na frente do bruto monstro. Tinha um mal querer dentro dela, mas só pela malvada professora. Tinha ressentimentos doentios no mesmo ódio inconfessável pelos políticos que nunca se comprometiam em cumprir com o prometido, o de entregar lhe a sua Certidão de nascimento, pela professora que só lhe menosprezava, pelo papai Noel que nunca trazia o presente que pedia. Ela enxergava a tirana, a inimiga e não mestra; as pobres crianças fingiam-se felizes; os castigos já se habituavam ao servilismo, de estômagos vazios, batiam continência para a Bandeira, cantavam o Hino Nacional e carregavam a bandeira do Brasil no peito.

Na década de 70, na ditadura militar, os brasileiros mandavam seus filhos para a escola descalços, e com algumas batatas doces, algumas raízes de mandiocas, repolho, enfim alguns legumes que seria entregue na cozinha da escola para a merenda, e todos se alimentavam da merenda comunitária. E, era ainda pior o horário de aula das 11 às 14 horas, pois este horário favorecia aqueles pais que levavam os filhos para roça, na parte da manhã até as 10 e na parte da tarde depois que saiam da aula até que o sol se ponha.

Ir para a Escala era o único caminho de quem sabe um dia se livrar da pobreza. Havia também nesta época a cobrança de tal taxa de matricula, o uniforme erra obrigatório.

O governo pagava somente o professor o resto era tudo por canta dos pais. A participação dos desfiles cívicos era também obrigatória, sendo completamente uniformizados. Tudo isso era um orgulho imenso, para os pais e para os alunos carregarem a Bandeira Brasileira em seus peitos. Alguns pais participavam da vida escolar e social de seus filhos. Só que com a Catarina era bem diferente; raramente os apareciam na Escola; ela nunca tinha lembrança de uma única vez ter tido o privilégio de eles ter assistido uma apresentação dela na Escola. Ela ganhara vários prêmios de versinhos na Escola.

Algum tempo mais tarde as coisas mudam na Educação. Os uniformes passam ser doada pelo poder público, vindo também a proibição da cobrança da tal “contribuições espontâneos”, as Escolas passaram a ganhar primeiramente a merenda, em seguida veio então o uniforme e material escolar para os mais carentes, só que nesta época a Catarina já estava fora das salas de aulas.

Os pais ignorantes, viciados pelos costumes bárbaros do Brasil, atrofiados pelos hábitos de lidar com as pessoas como se lidavam com animais, entendiam que aquele animal era capaz de educar os filhos.

O fato de ela ser bruta era um grau a mais no seu currículo. Os pais até elogiavam-lhe pela sua rispidez, recomendavam-lhe, sempre que não dessem colher de chás e não passasse a mão em suas cabeças e que,quando precisasse, cobrissem de castigos e de varas de marmelo, ou mesmo com régua.

Em uma manhã de domingo, Catarina, que se erguera cedo, foi logo ao córrego cuidar da sua primeira tarefa doméstica do dia, lavar a louça da janta e do café matutinal, onde alegremente se estendia a riqueza da água cristalina que de uma boa distancia dava para observar o brilho das pedras pelo reflexo do sol.

Não foi preciso chegar tão perto para avistar um senhor de chapéu na cabeça, encolhido em cima de uma espaçosa pedra, sentado, assobiando um assobio feliz a lavar as poucas louças de sua propriedade.

O negro velho, o Bem, cujo apelido, pois ninguém nunca soube o seu nome e muito menos a sua origem. A casa dele era muito modesta, de um cômodo só; de chão batido, e pela porta aberta dava para ver as paredes feias toda preta pela fumaça do fogão a lenha. Os móveis uma velha tarimba, na parede alguns calendários pendurados; uma prateleira com uma sanfona e um relógio roceiro que estava sempre ao tic...tac...

_ O senhor já lavou, toda a louça? Pergunta a Catarina. E, erguendo o chapéu, o Bem, o negro velho, dentre a

Sombreado do chapéu, e o suor que lhe caia aos olhos, num tom alegre:

_ Já, sim. Minha pequena.

Catarina espera pacientemente que ele se levante e saia com a bacia de louças na cabeça.

Uns longos minutos arrastaram-se, parecia infindável, pois queria acabar logo a tarefa para agarrar-se com o livro. Catarina entre a sua ansiedade deu um suspiro de alivio pelo termino do trabalho; este misturado com um pouco de abatimento pelos pais não terem se interessado pela bolsa de estudo. Ficando um pouco a olhar a água que corre e os peixinhos que comem o resto de comida que caiu das vasilhas lavadas.

Procura um pouco de felicidade naquela natureza... Quando lá ao fundo da tigüera, uma pequena vegetação de buva, um canário rompe a cantar: e então Catarina se faz muito silencio ao ouvir aquele lindo canto que faz tão bem a sua alma melancólica. Não demorou muito em fazer um verso:

_Canário, canarinho,

Leve este teu cantar

Para o meu

Amorzinho.

Isso era muito bem baixinho, pois se a sua mãe ouvisse era uma

ttunda de laço que não era mole! Oh povo ignorante!

Mais um pouco e uma de suas irmãs, uma abaixo dela, a Terezinha de cabelos encaracolados, de olhos castanhos, pele clara de pés descalço, bem desprovida de qualquer elegância, apareceu, com mais um grande tacho de fazer sabão, na cabeça que mal podia segurar-lo preso para não cair; e ao ver Catarina ficou tão atormentada, bamboleando as pernas. Que o tacho caiu pelo chão.

_ Oh, mana, por favor, volta comigo!...

_ Ora, esta! _ Bem capaz que vou voltar com você, pois tu não tens vergonha de me pedir isto, depois de ter negado a tua companhia a mim ainda agora?

_ Desculpa mana!..._ Prometo, que nunca mais vou te negar companhia! Diz a Sueli.

Catarina desse a bacia de louça em cima de um touco de uma pequena arvore, ficando escorada-a com uma de suas pernas, e tirando as pressas o pano branco que trazia forrado sua cabeça; continua a conversa com a irmã.

_ Tu não se lembras de ontem quando pedi para que tu fosses

comigo recolher lenha? Tu sabes muito bem que me pelo de medo da assombração...

Credo chega me arrepiar quando me lembro do finado Lazio, em cima daquele toco enrolando o cigarro de palha! Tu sabes que há pessoas que dizem que ele aparece para quem passa lá por perto, assombrando-os!

_ Sim, eu sei! Diz a Sueli.

_ Eu também tenho medo de assombração! Cruzes, eu morro de medo de alma penada! E, sem falar no boitatá!

_ Ah, mas o boitatá só aparece à noite! Diz a Catarina.

_Sim, mas me diga mana, será que é verdade que o boitatá é almas penadas de compadre e comadre que não se respeitam? Diz a Sueli, tentando amolecer o coração de Catarina, para que volte com ela ao córrego.

Diz a Catariana:

_ É, a mãe sempre fala que o pai e a Eva quando Morrerem vão virar um bicho desses! Pois eles são compadres e a mãe vive dizendo que eles não se respeitam! Mas, eu acredito que é coisa da cabeça da mãe! Eu nunca conheci ninguém que tenha morrido atacado por estes bichos do Diabo! _ Esta bem!... _ Vamos lá. Diz Catarina que acabou por lavar o tacho, que ligeiramente volta para casa.