Por motivos alheios a sua vontade, Mariinha deixou os estudos por alguns anos. Nesta época, ficou parte do tempo na roça, na companhia dos avós maternos. Já mocinha, voltou a estudar. 
      Na época houve grande afluxo de professores de outras regiões para lecionar no curso de Magistério que se iniciava naquele ano. Isso alterou alguns costumes do lugar, o Rio do Peixe, pertinho da cidade era ponto onde as professoras iam nadar, porque a cidade não oferecia outros atrativos além dos rios e cachoeiras. Isso foi a alegria dos rapazes daquele tempo, cujo programa preferido era subir rio acima a fim de ver as professoras bonitas usando biquíni. 
     Algumas alunas influenciadas aderiram a moda e começaram também usar biquíni e nadar nas águas límpidas do Rio do Peixe.
     Mariinha criada à moda antiga, única filha mulher, vivia sob a guarda dos pais e irmãos. Houve vezes que desejou muito passear no rio, onde os irmãos nadavam, mas o pai falava:
     —Moça de famia num vai pa bêra de rio não sinhora, onde já si viu isso? Vai tratá é de aprendê custurá, sinão eu tiro ocê da escola.
     Adorava estudar, assim consentia e ficava no seu canto.
     Chegou o dia em que foi convidada para um passeio diferente.
     —Larga mão de sê boba Mariinha, vamu nadá cum a gente domingo qui vem.
     —Ah... Sei não, o pai num vai dexá.
     —Ce num pricisa contá.
     —Uai, como?
     —Acha qui minha mãe dexa? — Ieu minto qui to fazeno trabaio de iscola. — Falou a amiga.
     —Será qui ieu invento uma mintira e vô? —Nunca saí iscundida...
     —Craro! Ocê vai de manhã lá pra casa e de lá a gente vai pru rio e fica até de tarde. Cê vai gostá.
     —Mais é qui num tenho rôpa de nadá, só si ieu intra n’água de vistido...
     —As professoras tem rôpa de banho pra vendê, ieu comprei o meu biquíni em cinco prestação, compra um procê.
     —Sei não, nunca usei isso, tenho vergonha...
     Insegura mas curiosa, Mariinha aproveitou um domingo em que o pai e os irmãos foram jogar bola noutra cidade, arrumou uma desculpa para a mãe e saiu cedo. As colegas já esperavam com vários trajes de banho para que experimentasse. Aí, quando vestiu o primeiro biquíni e se olhou no espelho sentiu-se totalmente sem roupa, quis desistir:
     —Vô visti isso não, tá dano pa vê tudo, parece qui tô pelada, credo!
     —Não seja boba Mariinha! Além do mais, só vai muié. Cê tá pareceno Jeca da roça.
     —Uai, mais ieu sô memo.
     Experimentou mais de meia dúzia, até se decidir por um modelo de cor vermelha, um pouquinho maior que os outros.
     —Ficou bonito. Fica cum esse!—Falou a amiga.
     Foram a pé, num total de dez moças entre professoras e alunas.
     Lá no rio, Mariinha sentiu-se inibida ao tirar o vestido, porém dali a pouco estava a vontade, brincando na água, jogando bola e se esturricando no sol para ficar morena feito as outras moças.  Foi uma das manhãs mais divertidas de sua vida. Sol, céu azul e água fresca e clara do rio.
     Já passava do meio dia, Mariinha já tinha até marquinhas de biquíni na pele. Estava feliz da vida, porém algo quebrou o sossego das banhistas. Um grupo de rapazes vinha subindo pela margem do rio. Mariinha entretida na água só se deu conta da presença de estranhos quando ouviu vozes conhecidas:
     —Ô Primo... Aquela lá dend’água no mei da turma, num é a Mariinha, sua irmã?
     —Tá doido, Tonho? Puracaso minha irmã é dessas moça qui vem nadá quais pelada in rio? —A Mariinha nunca vistiu um trem desses não, sô.
     Talvez ela passasse despercebida se não fosse a insistência do danado do primo Tonho, lá de cima do barranco:
     —Ô Zé... Ieu tô achano qui é ela memo... O cabelo é cumprido iguarzim da Mariinha... —Qui treim! Ela tá uma tetéia naquela rôpinha verméia. Dexa ieu chamá ocê de cunhado, Zé?     — Implicou o primo.
     Zé já com raiva, chama um dos irmão e vai se aproximando das moças, custando a crer nos próprios olhos, querendo deitar o braço em todos que o chamavam de cunhado. Viu Mariinha toda serelepe na prainha do Rio do Peixe usando aquele biquininho vermelho. Dali mesmo onde estava soltou um sonoro grito:
     —MARIINHAAAAA... VAMBORA PRA CASA, Q’UEU VÔ CONTÁ TUDO PRU PAI!
     Ela assustada, vestiu-se rapidamente sem se despedir das amigas, pegou sua sacola e só perguntou:
     —Uai... Ocêis e o pai num tinha ido jogá bola lá no Piumhi?
     Com cara de poucos amigos o irmão só disse:
     —O caminhão quebrô e nóis num foi nada, inda deu tempo de pegá a sinhora no pulo né dona Maria? Cê mi paga...
     Preocupada, acompanhou os irmãos até a casa e para evitar que contassem sua travessura aos pais se comprometeu a costurar suas roupas, fazer trabalhos escolares e arrumar o quarto deles durante um ano, coisa que ela já fazia, porém cobrava pelo serviço.
     Assim, Mariinha nunca mais voltou ao rio com as professoras, nem usou de novo seu biquíni vermelho. O segredo ficou entre os três irmãos. Os pais nunca souberam...



Maria Mineira
Enviado por Maria Mineira em 18/10/2011
Reeditado em 14/01/2013
Código do texto: T3284253
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