Brinquedos e Folguedos

Brinquedos e Folguedos

Naquele tempo não havia brinquedos como nos dias de hoje.

Qualquer coisa era lúdica o suficiente para aguçar a imaginação, que nossa cabeça de criança, desenvolvia muito além do que aqueles objetos representavam.

Assim uma batatinha com quatro palitos fincados como se fossem as patas, uma outra menorzinha grudada por palitos formava a cabeça, que por sua vez, ornada com dois outros palitinhos menores representando chifres, e aí estava criada uma vaca. Em pouco tempo tínhamos uma manada enorme.

Daí em diante, era só imaginação, não importava se no outro dia a mãe ralhava pelo sumiço das batatinhas, partíamos então para o chuchu, mais ao alcance na cerca que separavam nossos quintais de meninos.

Passávamos também horas a fio ao sol da manhã de inverno, colocando cacos de vidros multicores nos orifícios dos formigueiros, como a imaginar que as formigas gostavam, pois além das sombras, sua casa ficava mais bonita assim multicolorida.

Mas um amiguinho que freqüentava nossa casa, tinha um dom maior.

Desenhava como ninguém, figuras sacras, de heróis de gibis, de tudo que via.

E também esculpia em madeira, e em pouco tempo uma máquina de terraplenagem estava ali, representada em detalhes.

Ficávamos felizes com os brinquedos que ele fazia com extrema habilidade.

Então, dávamos-lhe o pão que sobrava de um dia para outro, e que não eram vendidos nosso bar.

O Aparecido, filho da Dona Joaninha, de fortes traços negros denotando o motivo das diferenças sociais históricas de nosso país, ia para a sua humilde casa, também feliz.

Mas, criança não entende muito bem o mundo dos adultos.

A mãe dele parece que tinha algo a ver com tal de Antonio Fernandes, outra pessoa, da qual meu pai tinha recentemente tirado algumas diferenças, por motivos que até hoje desconheço.

Assim, talvez num momento de fúria, como para atacar aquele cidadão malquisto, proibiu o menino de continuar freqüentando nossa casa e divertir-se com nossos folguedos.

Ficamos muito tristes, realmente sentíamos um enorme aperto no peito, com muito dó, mas respeitávamos a decisão.

Hoje até acho que não havia sido por mal, debito mais a um ato mal pensado naquele intempestivo momento.

Mas ficamos sem os desenhos de Nossa Senhora Aparecida, os carrinhos de madeira, e outros brinquedos mais, e ele, pobre amigo, ficou sem o pão velho, que bem lhes servia na rala sopa, por vezes único alimento do dia.

Como seria ele hoje? Provavelmente devera ter se transformado em um artista, ou desenhista, e continuado a tornar suas criações, objetos de devaneios de outras tantas crianças desse mundão.

Mas, com os apelos de tanta informática, eletrônica e digitalizações dessa nova era, os meninos de então, não precisam usar muito mais a imaginação, está tudo feito, tudo criado...

Ah! Mas os pobres necessitados de pão, não importam de quantos dias endurecidos, continuam a surgir no meu mundo aos borbotões.

E os meninos, já não saem mais a brincar nas ruas... o mundo deles hoje é virtual, só espero que quando se necessite de criatividade os possam fazer bem, com arte, com inteligência, mesmo que brinquedos virtuais.

Aos que necessitem pão, e que não dispõem de máquinas mais poderosas, que lhes dêem oportunidades para que possam criar nas máquinas “top” dos meninos mais abastados mas sem muita criatividade. É a eterna busca de inclusão social, que hoje tem o nome de “digital”.

Depois dêem-lhe muito mais que pão, dêem-lhe oportunidades, será uma troca justa.

Parece que só mudaram os tempos, a inteligência e criatividade continuam ainda surgindo nos berços mais pobres. E a necessidade ainda é a mãe da invenção.

Não foi por menos que Aquele menino nasceu pobre, em uma manjedoura, fugindo dos maus, e que deu sua vida para a salvação dos homens...

Feliz Natal irmãos!

MARCO ANTONIO PEREIRA
Enviado por MARCO ANTONIO PEREIRA em 27/12/2006
Reeditado em 30/12/2006
Código do texto: T329403
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