Problemas com o alemão

Certa vez, numa noite, Marilene, a mais velha irmã, estava na casa de Sílvia, sua irmã de menor idade, juntamente com Antônia, a irmã mais nova. Sílvia e Antônia conversavam freneticamente, com muitas e longínquas gargalhadas que vinham após as poucas palavras vindas de Marilene, que já não estava muito certa das ideias - e olha que nem era a mais velha. Marilene, para entrar na conversa, em um certo momento, disse:

-Irmã, esse cachorro quente que você fez está me lembrando aquela festa do gordinho, que eu tenho uma imagem nítida de Toínha estendendo a mãozinha para me pedir cachorro quente, lembra?

Sílvia e Antônia, que já não prestavam quando estavam juntas, aproveitavam um momento como esse para contrariar a irmã, que já se contrariava comumente.

-Mas Silvinha tava lá, irmã? - Perguntou Antônia, tentando ziguezaguear as ideias de Marilene.

-Não, quê isso? Ela nem era nascida! - Respondeu a grandiosa esquisipática.

-Mas, se ela não estava lá, como era aniversário do gordinho, se ele tem só vinte e cinco anos? - Cutucou Antônia.

-Mas eu não disse nada disso! A idade não tem nada a ver! Ela não foi no aniversário porque estava doente.

-Ah, lembro, eu havia pego idiotice reumática sem nem estar nascida, né? - Zombou Sílvia.

Marilene olhou séria para ela, mas logo disse:

-Isso mesmo, irmã. Viu como ela lembra? - Refiriu-se à Antônia, atestando sua incoerência.

-Sim, aham, mas, se eu tava lá te pedindo cachorro quente, você estava ajudando na cozinha ou eu não podia pegar?

-Irmã, como você não se lembra? Você pequenininha, no aniversário de gordinho, me pedindo cachorro quente.

-Mas, peraí, quantos anos o gordinho tava fazendo? - Antônia fingiu interessar-se.

-Ah, irmã, eu não me lembro, né? Faz tanto tempo.

-Não era aquele aniversário de seis anos do gordinho que foi feito na roça? - Localizou Sílvia.

-Isso, irmã, agora lembrei, muito obrigada.

-Mas, peraí, quando o gordinho fez seis anos, ele já estava no Rio. - Enrolou Antônia.

-Não fale besteira, irmã, como ele poderia estar no Rio?

-Esqueça, irmã. Minha mais importante dúvida é como eu não era nascida se o gordinho tinha seis anos. - Empertigou-se Sílvia.

-Ué, só lembro que você não era nascida. - Desgastou-se Marilene.

-Então, se ela era nascida e o gordinho tinha seis anos, e o Jorginho? - Mirabolou Sílvia.

-Oras! Jorginho era o pai do gordinho. - emputeceu-se Marilene.

-Ah, sei, e a casa da roça foi vendida dois anos depois do aniversário por causa das manchas que o molho do cachorro quente fez no chão, né, irmã? - Devaneiou Antônia.

-Viu como você tem ótima memória? - Exclamou Marilene.

-Mas, irmã, uma última pergunta: quem é o gordinho mesmo? - Indagou Sílvia.

-É mesmo, quem é? - Prolongou Antônia.

-Palhaças! - Xingou Marilene, sem argumentos.

A história do gordinho - sobrinho de Sílvia, Marilene e Antônia -, que não se tinha certeza da idade, tinha-se dúvida do local onde fora feita a festa, não se conheciam os convidados e muito menos suas idades, vocês nunca saberão o final, nem eu, um mero narrador que sentiu intensa pena do embolamento de Marilene, sendo que até me diverti.

Mas, o que vamos fazer? É a vida... talvez um dia cheguemos ao lugar de Marilene, Sílvia ou Antônia.

As irmãs mais novas acabaram a noite rindo da consequência do tempo na cabeça de uma pobre idosa com o problema do alemão. Talvez um dia elas também o conheçam.

Ronaldo Junior
Enviado por Ronaldo Junior em 06/10/2012
Reeditado em 29/02/2016
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