Terceira do Singular

Ela observou que o descascado do seu esmalte quase tinha a forma da América do Sul. Achou engraçado um pequeno mapazinho na ponta rosa do seu dedo e cantarolou baixinho: “sonhos, sangue e América do Sul”.. riu da própria tolice, quem mais veria um mapa no esmalte descascado? Só ela mesmo. Achar rostos nas nuvens, em algum momento, havia sido mais divertido. Hoje, enquanto lutava contra o relógio trancada em um escritório, nem mais se importava com 15 dias sem ir à manicura. Alguma emergência como um pequeno mapa da América, ela mesma ia remendando quando chegava em casa. Casa! Devaneou mais uma vez sonhando com seu sofá e pensou em comprar um vinho para aproveitar a sexta. Se pelo menos as horas passassem mais depressa ela não desistiria como de costume.. ah como os relógios batiam de frente com ela. Lutavam sempre contra sua ebriedade e seu prazeres. Olhou de novo para a pequena América ... Pensou nas proporções e se pôs a imaginar: se América do sul lhe aparecia assim tão “inha” que tamanhinho teria ela? Sentiu-se mal ao sentir-se um nada. Finalmente o relógio avisa a hora de voltar. Ela sorri para os ponteiros, desliga-se, e sai. A verdade é que seus devaneios nada tinha a ver com a manicura, a sexta feira, os vinhos, a América do sul e nem mesmo as horas. No fundo havia uma mágoa, que ela sabiamente remendava. Sabiamente de rosa.

Marília de Dirceu
Enviado por Marília de Dirceu em 04/11/2012
Reeditado em 06/11/2012
Código do texto: T3968397
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