A Mulher que Odiava Flores

Ela odiava ganhar rosas ou flores, tinha deixado bem claro para o namorado, para a família, para os amigos: Nem pensem em me dar algo que deveria estar em um jardim ou nos campos.

Ela era mesmo diferente. Não Era feminista, mas odiava qualquer coisa que a reduzisse a uma menina delicada, um ser frágil ou alguém que precisasse ser protegida. Ela sabia de cuidar. Sempre se virou muito bem em um mundo dominado por homens. Quando pequena, jogava futebol com a meninada, enquanto as suas amiguinhas brincavam de boneca.

Era feminina, mas acreditava que uma mulher deveria ter algo a mais pra mostrar que uma bunda, um par de peitos siliconizados ou um rostinho clonado de uma modelo de capa de revista.

No dia Internacional das Mulheres faltou ao trabalho. Não queria passar pela humilhação de agradecer a florzinha mixuruca que o chefe lhe daria pelo “dia especial” mesmo tendo a desprezado o ano inteiro.

No fim da tarde, enquanto centenas de mulheres saiam de seus escritórios com suas rosas, ela empunhava uma bandeira e parava a Avenida Paulista, junto com milhares de outras pessoas, em protesto contra a presença do presidente americano George W. Bush no Brasil.

A caminho de casa, já não agüentava olhar tantas outras mulheres carregando seus “presentinhos”. Queria gritar, fugir, acordar num mundo onde as mulheres fossem menos fúteis, mas ela precisava ir pra casa e o metrô e aquela multidão de “Amélias” não iriam impedi-la de chegar em casa.

Olhando essas mulheres carregando as suas rosas com tanto orgulho, ela tentou se lembrar de onde vinha a sua “repulsa” por flores e rosas, mas não conseguiu se lembrar.

- Afinal o que havia de errado com as flores? – ela pensou e algo começou a perturbá-la profundamente. Lá no fundo, enterrado sob camadas de opiniões, discursos superficiais e atitudes defensivas, estava um desejo incontrolável de ser como as outras. Ela era a única mulher no vagão que não carregava uma rosa, que não tinha sido parabenizada e isso a estava incomodando profundamente.

- Ridículo – disse – Isso é pura hipocrisia! Todo dia é dias das Mulheres!

Chegou em casa arrasada, triste e solitária. Pensou no elevador em ligar para o namorado, mas recordou-se que ela mesmo havia ligado pra ele e pedido para não ser tratada como uma “mulher” só por causa do 08 de Março.

Então, ela abriu a porta, acendeu a luz e notou que em cima da mesa no corredor, entre o Buda dourado que comprara no Nepal e o espelho, havia uma rosa e um bilhete:

“Eu sei que você odeia

Mas não pude evitar

Feliz Dia das Mulheres!”“

Ela chorou, quando a máscara caiu e o espelho refletiu o rosto feliz de uma mulher.