TROCA DE FAVORES

Quando Eduardo foi candidato a prefeito de sua cidade, estava imbuído das melhores intenções. Não ia deixar-se corromper. Ia ser um político correto para lavar a fama dos que o tinham antecedido.

Mas, durante a campanha já viu que ia ser difícil perseverar em seus bons propósitos. Mentir, prometer coisas impossíveis fazia parte do chavão de todos os candidatos e ele tinha que fazer a sua campanha se quisesse ganhar a eleição.

E prometeu aumentar as vagas nas escolas municipais, melhorar o atendimento nos postos de saúde, construir casas populares, criar um sistema miraculoso onde todos fossem bem sucedidos e tornar a sua cidade, num passe de mágica, uma das principais cidades do Estado.

E o Eduardo foi eleito e começou o seu mandato.

Precisava nomear as pessoas que ocupariam os cargos de confiança, todos da sua família, é claro. Teve até que criar mais alguns cargos porque não podia deixar de empregar a irmã de seu cunhado que ajudou tanto na campanha e o primo Emílio, coitado, que acabara de sair da cadeia e ia ter dificuldade de encontrar trabalho.

Não era muito certo o que fazia, mas era por uma boa causa, justificava-se.

E começaram a aparecer os amigos. Todo mundo, de.

Repente, era seu amigo do peito.

- Você não lembra de mim? Estudamos juntos no primário.

- Freqüentávamos o mesmo clube.

- Minha avó era amiga da sua.

- Quando você namorava a Mirna, eu namorava a Mirtes, irmã dela.

Eduardo mal lembrava da Mirna, imagine se ia recordar-se da irmã dela e de quem era o seu namorado.

E todos tinham pedidos para fazer.

Queriam uma vaga que estava sendo disputada por concurso;

O concurso é muito concorrido, eu não teria chance, você podia me quebrar esse galho, incluir-me entre os aprovados.

Um lugar na escola cujas vagas eram insuficientes para a procura e procedia-se a um sorteio:

- Você não daria um jeitinho de me arranjar uma vaga na escola para meu filho, por fora do sorteio?

- Poderia me perdoar as dividas atrasadas de IPTU?

- Regularizar uma construção clandestina?

- Doar-me uma nesga de terreno do município que fica junto a minha casa?

E por ai afora. Superestimavam a sua capacidade de resolver problemas e fazer favores.

Tudo por conta de velhas amizades reais ou fictícias.

Eduardo não podia nem queria atender a tantas solicitações, mas também não queria desgostar os munícipes e acabava enrolando, prometendo e não fazendo nada.

Dr. Sampaio, o Delegado de Polícia, procurou pelo Eduardo.

Queria que ele mandasse asfaltar a Estradinha do Barro Liso onde ele possuía uma chacarazinha.

Era um absurdo! A estrada era erma. A única propriedade de algum valor era a chácara do Delegado e havia estradas mais movimentadas que ainda não tinham sido asfaltadas, outras precisando de recapeamento.

Não! Ele não podia atender o Doutor, mas não disse isso a ele. Pôs panos quentes:

- Vou fazer o possível.

- Mas, será para logo?

- O mais breve possível, Doutor!

O Delegado insistia:

-Você não vai autorizar o serviço?

-Vou! Claro que vou, mas ainda não deu.

- Precisa asfaltar antes das chuvas. Com o tempo chuvoso não há quem consiga transitar por ali. Eu fico impossibilitado de ir a minha chácara. Isto é um absurdo.

- Também acho. O senhor tem toda a razão. Vou providenciar.

Mas não providenciava nada.

Uma noite, já pela madrugada, Eduardo levou um susto. O telefone tocou avisando que seu filho Dudu estava detido na Delegacia de Polícia. Tinha provocado um acidente com o carro.

Chegando lá, Eduardo tomou conhecimento de que pesava sobre ele várias acusações: dirigir alcoolizado, excesso de velocidade, atropelamento, omissão de socorro, fuga...

Eduardo ficou desesperado e telefonou para o Dr. Sampaio.

O delegado atendeu com a voz sonolenta:

- Tem um plantão na delegacia. Ele está apto a resolver.

- Mas doutor, aqui é Eduardo, o Prefeito...

- Oh! Desculpe! Não reconheci sua voz. É claro que vou imediatamente. Fique tranqüilo que nada vai acontecer ao garoto.

E... a propósito... quanto àquele outro assunto...

- Já estamos com tudo agendado. Amanhã mesmo começa o serviço.

E assim, o Dudú safou-se de boa e a Estradinha do Barro Liso foi asfaltada.

Troca de favores!

Maith
Enviado por Maith em 20/03/2007
Código do texto: T419665