Comodidade X Mudança

- Mãe, quero essa pizza aqui ó, Romeu e Julieta.

- Não filho, mussarela ou calabresa... Num sei... Nunca comi dessa.

- Mãe, cansei de meia a meio.

Situação simples, que refletia minha vida. O medo de arriscar com medo de perder. Era mais cômodo vive naquela situação do que arriscar uma mudança. Coloquei esperança no futuro e ali era meu abrigo. As coisas vão mudar um dia, ideia vaga, sem consistência. Esperava que as coisas mudassem de uma hora para outra.

Ele não mudou com casamento. Simplesmente aperfeiçoou o monstro dentro dele. Tenho minha parcela de culpa, desde começo já se mostrava um estúpido, era agressivo com as palavras. Mas o desejo e o sexo que se confundia com amor, me fez refém. As suas brincadeiras agressivas, eu gostava, essas coisas para mim era atraentes.

Vem na mente a primeira briga quando me olho no espelho, devido marca no supercílio: cismou que a comida tava com veneno – detalhe nunca pegou num prato para colocar comida – jogou a comida no chão e veio pra cima de mim gritando que eu queria matá-lo. Estava muito louco, com o cão no corpo. Eu era uma tapada, aceitei aquilo e aquilo virou uma constante.

Rezava para algum vizinho não achasse que “briga de homem e mulher ninguém mente a colher” e chamasse a policia. Uma vez meu irmão entrou na briga e me fez morar com ele. Não me sentia a vontade na sua casa e a minha cunhada era um saco - tudo era culpa dos meus meninos.

Meu marido veio com palavras de arrependimento. Não queria ver a verdade, no fundo do meu coração aquelas palavras eram mentiras, mas era o que eu queria ouvir. Voltei para casa. Meu irmão bradou: “finge que morri, você gostar de sofrer mesmo”. Arriscar uma vida nova era novo, ele não entendeu.

Situação diferente nos primeiros dias, mas ficou desempregado e a ignorância voltou. Eu retornei para escola, supletivo e arrumei emprego. A escola e o emprego me trouxeram confiança. O meu mundo não girava mais em torno do meu marido. Conheci mulheres da minha idade, independentes, fazendo faculdade, que me incentivavam a prosseguir o estudo... Com 24 anos e quatro filhos sentia que a vida já tava findada.

Colocava a minha covardia nos filhos, repetia que seria difícil eles crescerem com os pais separados, mas só piorava a situação, pois as crianças odiavam mais o pai a cada briga nova, e via nos olhares deles o respeito por mim virando sentimento de dó. Em uma aula de filosofia o professor falou sobre “A Rã no Chaleiro” - coloque uma rã em uma chaleira fervendo ela vai pular fora, mas ao colocá-la em uma temperatura ambiente e esquentado aos poucos ela vai ficar até morrer cozida. Já tinha me acostumado àquela vida, as piores grosserias era elogio, me acomodei de tal forma que não percebia que aquilo iria me matar.

Fui pressionada a pedir demissão do emprego, pois era isso ou mandada embora por justa causa - faltas consecutivas. Meu marido colocou na cabeça que eu estava traindo e trancava a porta para eu não sair.

Isso me fez refletir, o que me amarrava aquela pessoa que só me fazia sofrer? Amor? Não mais, nem sentia mais atração física. Filhos? A vida familiar era a pior possível. Sustento da casa? Nos últimos tempos eu é que bancava a casa. O medo de arriscar? Superei... Aproveitei que ele não tava em casa e peguei umas coisas essenciais e os filhos e fui embora de “Alcatraz”.

- Adorei a pizza... Vamos comer logo crianças, tenho que dormir, amanhã vou fazer a matricula para curso de enfermagem.

Danilo Góes
Enviado por Danilo Góes em 21/04/2013
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