CAROL 
              
            Houve uma época que Carol quis morrer, isso foi na adolescência, chegou a tomar medicamentos para dormir e ansiolíticos, nessa época moderna todo mundo toma alguma coisa.
            Gostava de atividade física e adorava a beleza, fez duas tatuagens, uma nas costas e outra na virilha.
            Quando Marcos conheceu Carol e viu aquelas tatuagens falou merda.
          -Isso é coisa de mulher desclassificada – ela podia ter terminado tudo ali. Marcos era bonito, tinha um negocio próprio e Carol odiava a casa dos seus pais.
           Esqueceu o fato, e teve uma vez que ele elogiou a tatuagem quando estavam sem roupas em um motel, depois nem falava a favor nem contra, sempre preocupado com o trabalho na fabrica, contensão de despesas, afinal precisavam casar.
           Cinco anos de namoro é perversão, ninguém deve namorar tanto tempo, Carol não tinha mais o que descobrir no companheiro, fizeram tudo como manda o figurino, véu, grinalda, parentes chatos e quatro horas miseráveis da festa mais chata do planeta, uma carroçada de fotos, Carol fez fotos até com o cachorro.
           Rude, o cão Maltês do Marcos, o cachorro era adorado, dormia na cama, levava para passear, Carol tinha alergia a bicho, pegou um pouco de veneno de rato e colocou na água do bicho, o animal estrebuchou e morreu, Marcos, inconsolado, chorou mais que na morte da mãe da Carol.
            Depois do choro, indignado, levou o bicho para necropsia.
          -Você vai levar esse bicho para necropsia? – perguntou Carol.
          -O veterinário disse que ele tinha sinais de envenenamento, isso quer dizer que alguém matou o Rude – disse Marcos.
           A necropsia nunca foi feita, pois Carol deu sumiço no cadáver do cão Maltes, colocou em um saco, circulou com a mão como se estivesse em um arremesso de martelo e jogou no meio da lagoa, sua consciência doeu, porque maltratar bicho assim é coisa de possuído, mas a sua alergia melhorou muito depois do sumiço.
           Marcos estava inconsolado, para alegrar Marcos, Carol disse uma mentirinha, disse ao Marcos que estava grávida do primeiro filho, porém só engravidou dois meses depois e teve que pagar uma promessa ao santo das causas impossíveis, porém funcionou, Marcos esqueceu o cachorro.
            Carol sempre tinha um desconforto com a vida e olhava tudo de forma negativa, o tempo passou e Carol teve com Marcos três filhos.
Mesmo sem gostar de ler, bebendo muito vinho e fumando escondido, Carol falou para Marcos que queria estudar, ele achou o máximo, disse que quando as filhas tivessem doze anos ela poderia estudar.
             -Cacete ai eu estarei velha, quero estudar agora – estudou, deixou os filhos com a sogra, e se matriculou.
           Depois de seis anos, um curso superior que normalmente terminava em quatro anos e  muitas discussões com Marcos, Carol formou em serviço social.
A festa foi tremenda, para a surpresa geral Carol passou no concurso publico duas vezes e tem dois empregos, atualmente ganha mais que o marido.
            O que deixa Carol tão triste: a indiferença de Marcos diante dela, prefere uma partida de futebol, faz amor sem beijar na boca, de forma apressada e com a cabeça distante, não pega mais na sua mão e não brinca mais com ela? Ou é a indiferença de Carol com o próprio Marcos? A gente se arrepende de tantas vezes sentir isso, pensa Carol, mas eu não amo mais o Marcos.
            -Então por que você fica com ele? – Perguntou Mauro Mendes, o enfermeiro, seu amigo, que era bonito e tinha uma voz grave e com quem Carol teve um caso, fez sexo com Mauro, mesmo sabendo que ele era mulherengo.
            -Por que homem é tudo igual, não vê você, a Laura te ama – disse Carol colocando o dedo indicador na testa de Mauro - você trai a pobre coitada. No último churrasco ela disse para mim que acredita no amor, na amizade, o que é pior, acredita na nossa amizade. Sabe que me senti um lixo – disse Carol. Aquela conversa era privada, só falavam daquela maneira em momentos especiais, diante das pessoas mantinham distancia física confessavam apenas uma grande amizade.
            -É diferente, sabe como eu sou...  – tentou argumentar Mauro.
            -Você é um safado que sai com prostitutas, além de sair com amigas, cunhadas, tias, quem estiver em perigo. Acredito que todo homem é assim, tem mulher que se esconde atrás do mito da fidelidade masculina, porém a verdade é que todo homem é um “galinha”, outras estão dentro do furacão, como eu, já sabem com quem estão lidando – disse.
            -Como a gente foi diferente – aí ele começava a gaguejar.
            Mauro não conseguia se explicar, a verdade é que Carol nem queria a sua explicação, ela queria se divertir, fazia brincadeiras com os colegas, suas pegadinhas com os amigos, sua busca pela alegria através da gozação, da pilhagem, da amizade com a turma que trabalhava, mostra a necessidade que algumas pessoas têm do outro.
            Muito mais que ir a busca de homens, Carol admirava mulheres bem sucedidas, ficava de longe vendo como se portavam juízas, promotoras, médicas, pessoas do seu convívio, principalmente as bonitas, que se saiam bem, nem sempre era uma questão de inveja, era apenas admiração.
Fazia todas as horas extras que podia, mesmo com o filho caçula doente.
-O pai que de um jeito, não fiz o Lucas sozinha – dizia Carol.
            Dez da noite quando Carol chegava à sua casa Marcos estava sentado esperando.
            -Carol, o Lucas chorou chamando a mãe, não dava para chegar mais cedo, o que você faz no trabalho até essa hora? – perguntou, porém Carol passava direto para o banheiro, tirava a roupa, olhava no espelho para ver a barriga saliente e os seios flácidos de três gestações, havia bebido um ou dois copos de vinho com um amigo, nada demais, porém se Marcos sentisse o cheiro de bebida ficaria irado.
            Lucas era o filho caçula, Carol tinha um instinto maternal, porém gostava da vida no trabalho e os filhos lhe impregnavam de uma responsabilidade odiosa, quanto mais ficava fora de casa menos tinha que enfrentar aquilo, queria liberdade.
            Lembrou-se de Paulo, o farmacêutico, braços fortes, espremendo Carol em alguma cama de Hotel, fazendo juras de amor que Carol sabia ser falsa, beijando a sua boca como uma criança linda e despreocupada.
             Acordou do sonho com Paulo ao ver o corpo bem definido do marido, seu cavanhaque charmoso e olhos cor de mel, continuavam charmosos, foi a impressão que teve ao ver Marcos entrar pela porta do banheiro e não sentiu remorso por ter enganado aquele homem tantas vezes.
            Marcos tirou a roupa e entrou no banheiro, acariciou a costa de Carol, sentiu o perfume, os lábios, o rosto de queixo saliente, beijou a mulher longamente, Carol se entregou ao beijo, porém Marcos sentiu o gosto de vinho na boca de Carol, se afastou e disse.
            -Andou bebendo?
            -E daí, dois copos de vinho não é pecado.
            -Você esquece que é casada, posso sair por ai bebendo com qualquer vagabunda? – disse Marcos. – Minha mãe me telefonou, disse que você estava com alguém no bar do Sardinha.
            -Porra tua mãe anda me vigiando?
            -Você está se comportando de forma estranha, ela pediu que eu contratasse alguém para te seguir, eu não quis fazer, ela fez, disse que estava zelando pelo patrimônio das netas. Sabe que minha mãe comprou esse apartamento para nossa família e que eu me matei de trabalhar no Porto enquanto você estudava, agora passou agir assim, nem vai mais a igreja.
           Carol deixou a água correr pelo seu rosto e disse.
          -Marcos, você é cego?
         -Como assim?
         -Depois de três filhos, o nosso casamento acabou, você a sua igreja de merda, todos os seus amigos que me acham muito excêntrica, a sua mãe...
         -Cuidado com que vai falar da minha mãe? – disse Marcus saindo do banheiro e colocando a toalha.
        -Sua mãe está certa.
Marcos que já estava na porta voltou.
        -Certa sobre o que?
         -Eu te traio Marcos, saí com outros caras. Cansei de você.
       -Não quero ouvir nada – disse Marcos.
       -Você não liga se eu não sinto prazer, não se importa de não me beijar, faz sexo no banheiro e depois vai dormir, sexo no banheiro em pé comigo de costa, com você cansado, isso não é coisa de casal. Seu prazer é cerveja e futebol em primeiro lugar, mulher vem depois, quando sobrar tempo, nada de romantismo, flores, palavras meigas – disse saindo nua e molhada do chuveiro para a um metro de Marcos, depois sentiu um alivio com o desabafo.
           Marcos engoliu a afronta como uma sentença de morte, para o companheiro infiel a pessoa sempre sabe que está sendo traída, porém nem sempre é assim, Marcos por algum milagre do destino, apesar de toda a personalidade impulsiva e comunicativa de Carol ele não sabia de nada, confiava plenamente na esposa.
          Muitas pessoas acreditam que a infidelidade é uma questão de imoralidade, no entanto para Carol foi apenas uma ação natural da vida, marido ruim é igual à traição.
         -Você não ficou com medo dele agir violentamente? – Perguntou Marcela dias depois quando encontrou Carol no salão de beleza.
           -Marcos é um cara pacato, eu tava com tudo agarrado, tinha que falar – disse Carol – as coisas já vinham perdendo a consistência, queria terminar e terminei ali mesmo pelada no banheiro.
            -O que ele fez?
            Carol olhou para Marcela e suspirou, depois respondeu.
           -Nada, pegou as malas e saiu, não tenho notícias do Marcos ,fiquei chocada com isso?– disse Carol – sinto falta da minha casa organizada, meus filhos perguntam pelo pai, acho que Maria Julia a minha filha mais velha ouviu tudo, não pergunta pelo pai e anda chorando pelos cantos, as vezes acho que fiz besteira, acho outros homens bonitos, só isso, Marcos era honesto, porém enjoei dele.
         -Beleza é foda – disse Marcela – eu também só saio com os bonitos, você vem na festa de domingo?
         -Vou, assim posso esquecer essa merda toda, afinal festa é festa.
         Carol colocou o copo de café na mesa, havia uma sensação de bem estar, outra de perda, ela sabia que a vida era assim mesmo, uma preocupação surgiu na sua cabeça.
         -Onde Marcos está agora?
         Marcela não ouviu, não estava mais ali, tinha saído, estava com pressa para comprar um vestido para festa de domingo.
fim

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JJ DE SOUZA
Enviado por JJ DE SOUZA em 28/05/2013
Reeditado em 23/07/2013
Código do texto: T4314097
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