REFLEXO

 

Se obscuros e monótonos dias assombram aqueles que procuravam segurança, noites insones são as desgraças dos livres. – Zygmunt Bauman

 

 

 

O sucesso na relação de trabalho está em evitar conflitos, em muitos casos quando o conflito é inevitável pode-se adotar as seguintes posições: a primeira é do pacífico indivíduo que mesmo certo na briga, pede desculpas e volta para seus afazeres, como cordeiro – chamaremos de indivíduo um.

A segunda forma de reação: é do indivíduo que diz a frase:”esquece isso” - chamaremos de indivíduo dois, a terceira é o brigão, que parte para porrada e gritaria com o interlocutor, mesmo que seja o seu chefe – indivíduo três em extinção, não trataremos dele aqui.

O primeiro indivíduo carrega o ódio no coração, lobo em pele de cordeiro, anda nas sombras, morre de vontade da vingança, pensa todos os dias como fará para derrotar aquele que o fez engolir a sua razão, se o adversário foi o chefe ele negocia até com satanás.

Isso porque os chefes normalmente agem como sociopatas nestas ocasiões – explicando o que ele toma por sociopata: homicídio para um sociopata é um erro de cálculo não um crime.

O chefe muda de humor, se ria antes na  presença dele, passa de cara fechada agora, desviando o corpo, como se ele fosse um leproso.

Chefe é chefe, ja dizia o ditado, no caso em questão, o primeiro indivíduo tem verdadeiras razões para perder o sono, pois brigar com o chefe é a coisa mais idiota que um funcionário pode fazer nos dias atuais - por isso o número "três" está quase extinto.

Os chefes são criados em laboratório, isso quer dizer, artificiais: no serviço público são apadrinhados e no serviço privado são parentes.

 Anotam no seu caderninho apenas um coeficiente do funcionário, mesmo que o imbecil seja esforçado, segundo o Zygmunt Bauman este coeficiente chama-se: “coeficiente de chateação”, ou seja, você trabalha, não chateia o chefe que ele não te chateia.

O indivíduo um, fica sem possibilidade de vingança, no extremo do ódio pode se matar e colocar a culpa no chefe com bilhete suicida. Ou pode  mostrar competência? Epa! Isso não adianta, chefe não reconhece a competência de chatos.

Chefe só reconhece quem tem poder – de derrubá-lo ou de melhorar a sua vida, não a da empresa, a sua própria – e reconhece também pessoas que simpatiza.

Que fazer então? Nada, é engolir o sapo todo, seja de que tamanho for, com farinha e tudo e torcer para que o chefe morra ou fique doente e entre na empresa alguém que goste do nosso amigo número um, ou, ainda, mais radical, pedir demissão e enfrentar o mundo do desemprego.

O segundo indivíduo, aquele que diz: ' esquece isso' que chamamos de indivíduo número “dois”, nunca esquece a mágoa, a sua fala sobre perdão é da boca pra fora, ali o ódio cresce de forma vertiginosa, a vingança chega a níveis de vingança sangrenta, ficará atento a mínima falha de seu inimigo, quando a falha acontecer estará presente ali na hora da destruição do outro, sem nenhuma piedade.

Vai ter o prazer de falar para o chefe:

-Não falei, cometeu outra merda - diz e sente um bem estar, missão cumprida, quando o seu colega de trabalho é mandado embora e fica sem sustentar filhos e netos, ele abre uma cerveja comemorativa, não se compadece, mesmo que o motivo seja torpe, banal.

Se o inimigo for o chefe,o numero 'dois' desconversa,neste caso é o chefe é que não esquece , fica perseguindo o numero dois e ele doido para que o chefe esqueça.

-Sobre aquela situação – ele fala no café – quero que me desculpe, eu estava errado.

-Tudo bem, esquece – mas o chefe não esqueceu, nunca esquecerá, ele não gosta desses indivíduos, confere a entrada e a saída, todo trabalho feito, olhando pelo filtro do microscópio ranzinza da perfeição, o chefe busca a hora certa de mandar o número dois para a rua, uma demissão anunciada pelas trombetas de Nostradamus.

A verdade é que a maioria das discussões no trabalho parecem com as de “ reality shows”, a ação toda é uma performance mascarada, a verdadeira motivação fica escondida. Abertamente desleal, quase tudo que se fala  é pelas costas, um mar de mentira e falsidade é construído sobre a desculpa da competição por vantagem que não estão escritas nos contracheques.

A órbita ao redor do “deus” Chefe é sólida e feita por homens e mulheres adaptados a mentira e duas caras, católicos, protestantes budista, espíritas e tantas outras religiões subjugados a lei da sobrevivência no emprego custe o que custar, buscando uma vida confortável e feliz.

Mascarados no trabalho vivemos um personagem ou uma metamorfose? Apenas o cameleão na natureza muda de cor para se proteger, ou o homem é um camaleão? Podemos em casa ser aquela pessoa honesta, amiga, amante, carinhosa? Conseguimos retirar a nossa máscara e colocar sobre a mesa quando chegamos no lar? É possível que o eu verdadeiro aconteça.

Será?

Ou somos seres possuídos pelo personagem que fala tantas mentiras quantas forem necessárias, engana pessoas e diz maledicências pelas costas sem ter o mínimo remorso, para cada um de nós o personagem é um monstro refletido no espelho.

Este monstro é necessário para a nossa vida, nos acompanha até a morte, dizem alguns.

Precisamos refletir se  é uma adaptação ou uma corrupção , podemos separar a nossa vida assim: uma vida no trabalho, outra em casa? Ou somos marionetes na mão de um monstro que vive as nossas vidas, deita na nossa cama, come na nossa mesa e tira todos os valores para colocar no lugar uma vidinha cheia de viagens, cerveja, mulheres e lucro, tendo como centro uma falsa estabilidade...

Tem gente que ama esse monstro não é verdade?

JJ DE SOUZA
Enviado por JJ DE SOUZA em 22/07/2013
Reeditado em 23/07/2013
Código do texto: T4399036
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