FRATERNIDADE DOS HOMENS

João Renato dera dois telefonemas muito importantes naquela tarde de segunda-feira. Os homens que atenderam do outro lado da linha se mostraram surpresos com aquela ligação, todavia, ao cabo de alguns minutos de conversa amistosa, ambos concordaram em se encontrarem com o primeiro ao final do expediente, em um bar badalado da cidade.

O analista de sistemas estava ansioso por reencontrar os dois colegas de infância, pois já fazia muitos anos que haviam perdido contato. Sérgio, Marcos e o próprio João Renato, eram amigos inseparáveis, companheiros de traquinagens, porém, quando João Renato completara doze anos, Marcos, um ano mais moço, mudara-se para outro bairro, e Sérgio, um ano mais velho, começara a andar com uma turma meio barra pesada. Desse modo, os três amigos foram se distanciando. Cada um seguira o seu caminho por vias distintas, pelo menos até agora.

O relógio ultrapassara as 18h30, quando três homens se abraçam emocionados. O que parecia ser o mais velho ordenou:

— Garçom, traga duas cervejas bem geladas para começar. Serjão, como gostava de ser chamado, era um sujeito alto, forte e de pele tostada devido aos longos anos de exposição ao Sol. Ostentava uma barba castanha, não muito espessa, e uma barriguinha meio saliente. Usava na ocasião um boné vermelho.

— Se me dissessem que iríamos nos encontrar depois de vinte e oito anos, eu certamente não acreditaria. Como me achou, João Renato?

O interlocutor, um homem delgado e de sorriso sincero, respondeu:

— Ora, foi por meio daquela sua tia que ainda mora lá no Progresso. Nisso, Marcos, que além de ser o mais jovem, era também o mais tímido, indagou:

— E eu, João, como me encontrou?

— Bem, ainda me recordava do seu nome completo. Um conhecido me falou que na loja onde ele trabalha, tinha alguém com o nome igual ao seu, aí eu resolvi arriscar e liguei.

— E me encontrou.

— Exatamente. Eu já lhes disse que sou analista de sistemas, casado e pai de uma filhinha linda. Falem-me de vocês, o que têm feito nesses anos todos?

— Sou mecânico de máquinas pesadas, tratores e por aí vai — esclareceu Serjão. Também estou casado e tenho dois filhos machos. Eu disse pra patroa que ia demorar a chegar em casa hoje, porque ia rever uns velhos amigos. Ela não acreditou muito, mas sabem como é... Quando elas nos amam, aceitam tudo. Ô, garçom, mais duas geladas.

— E você, Marcos? — Questionou João Renato.

— Trabalho na loja de conveniência. Já fui casado, entretanto, não gostaria de falar sobre isso.

— Tem filhos?

—Não, Sérgio.

Finalmente o álcool começava a fazer efeito e por isso os ânimos se descontraíram.

— Olhem — observou Serjão eufórico — lembram-se daquela vez em que nós assamos o gato de estimação da dona Jurema?

— E como não iria me lembrar — enfatizou João Renato — foi um deus nos acuda! Aquela velha gostava mais do seu gato do que dos próprios netos.

— E por falar em netos, vocês sabiam que aquela neta linda que ela tinha virou freira? — Agora foi Marcos a inquirir.

— Como assim, virou Freira? —Indagou por sua vez um João Renato incrédulo.

— Não sei bem, mas parece que a pobre moça ficou tão desiludida com o fim de um noivado, que acabou entrando para o convento.

— É meus camaradas — sentenciou Serjão — isso é o que eu chamo de um grande desperdício. Imaginem, uma gostosa daquelas virando freira!

De repente o analista de sistemas ensaiou um ar de seriedade e falou:

—Para provar o quanto estou feliz por reencontrá-los, meus amigos, vou lhes contar algo terrível que me aconteceu na época do colégio, e que nunca tive coragem de contar antes. Fez uma pequena pausa e prosseguiu: uma vez, entrei sozinho no banheiro da escola e resolvi invocar a Loura do Banheiro. Apertei a descarga do vaso sanitário por três vezes, e eis que ela apareceu bem na minha frente. Nossa! Nunca vou esquecer aquele rosto horripilante; o algodão no nariz e o vestido ensanguentado!

— Ah, sem essa, cara — redarguiu Marcos — essa história é mais velha do que a minha avó.

— Pode até ser, mas eu a vi.

— É, e o que foi que ela disse? — perguntou Sérgio, se preparando para soltar a gargalhada.

— Ela me olhou bem nos olhos, e falou com uma voz medonha: “tire a roupa”, e depois sumiu.

— Pois é, Renato, vai ver que ela desanimou quando viu o tamanho da sua ferramenta. Ao dizer isso, Serjão já não se continha de tanto rir.

Quando João Renato ia revidar, Marcos informou, com uma voz pastosa pelo excesso de bebida:

— Minha mulher me abandonou há dois anos. Peguei a sem-vergonha na nossa cama com outro. Que bom que encontrei vocês. Vocês são os melhores amigos que uma pessoa poderia ter. Ao pronunciar essas palavras, o vendedor da loja de conveniência caiu num choro copioso.

Após muito consolarem o amigo, os três se despediram, com a promessa de um novo encontro.

Vamos erguer um brinde à solidariedade masculina, tão presente e atuante nos bares e botecos da vida.

***

—Alô.

— Alô, Marcos, aqui é o Serjão.

— Fala, Serjão.

— Escuta, vamos nos encontrar no Bacanal hoje à noite. Eu quero te apresentar umas amigas...