OS VELHOS E OS NOVOS VAMPIROS

O homem baixo, meio encurvado, de ombros largos, rosto também alongado e nariz achatado, caminhou lentamente até atingir um amplo e luxuoso aposento. Ao ver o empregado que se aproximava, o sujeito alto e garboso que estava sentado em um belíssimo estofado feito de couro legítimo, exclamou algo admirado:

— Nossa, Jaime, como você está pálido! Creio que um pouquinho de sol não lhe fará mal algum.

— Certamente, senhor. Quando tiver um tempo, eu me lembrarei disso.

— Acho bom. Assim você está parecendo o mordomo do Conde Drácula.

— Acredite — respondeu o servo exibindo um semblante sério e respeitoso — teria sido uma honra servir o mais célebre dos vampiros, senhor.

— Muito bem, Jaime, mas Drácula não conseguiria viver em paz nos dias de hoje. Atualmente nós, os vampiros, precisamos da segurança do anonimato.

— E por falar em segurança, o meu contato lá no hospital conseguiu mais sangue bom do hemocentro para o senhor.

— Excelente! As pessoas deste século XXI andam tão promiscuas, que simplesmente não posso me arriscar a ficar mordendo qualquer pescoço que encontre por aí. Já pensou ter que passar a imortalidade com o vírus HIV?

— Nem imagino, senhor.

— Nem eu me imagino doente, Jaime. É por isso que vale a pena todo o nosso trabalho para desviar o sangue saudável do hemocentro.

— Senhor, madame Medina se encontra à sua espera.

— Ora, pois faça-a entrar, homem dos diabos.

Uma jovem e esbelta senhora, de cabeleira curta e tingida de louro, adentrou no rico aposento.

— Como tem passado, Conde Leonardo? Espero não estar incomodando. Vim agradecer pessoalmente pela sua generosa doação ao nosso Instituto de Amparo À Criança Carente.

Beijando-lhe a mão estendida, o belo homem que aparentava seus trinta e cinco anos, falou em tom benevolente:

— Não precisa me agradecer, madame; não foi nada. É apenas o que eu chamo de responsabilidade social.

— Ah! Mas sem dúvida sua doação de quinhentos mil reais foi um ato de muita generosidade. E por favor, me chame de Carlota.

— Como desejar, Carlota. Devo dizer que você é dona de uma especial beleza.

— Oh! Obrigada, Leonardo! Estou lisonjeada. Você sabe mesmo como agradar a uma mulher. Meu marido nunca me diz essas coisas. E antes de sair, a elegante senhora sussurrou-lhe ao ouvido:

— Serei sua quando quiser, meu bem.

Dias depois, o Conde Leonardo recebia a visita de outra mulher. Irmã Clara era a dedicada freira que cuidava de algumas das crianças abrigadas no Instituto. A moça usava um crucifixo com a imagem do Cristo, contudo, diferentemente do que rezam as lendas sobre vampiros, a relíquia religiosa não chegava a perturbar o anfitrião. Após os cumprimentos habituais, o Conde indagou de forma um tanto quanto inesperada:

— Irmã, a senhora acredita em vampiros?

Recebendo a pergunta de maneira natural, a jovem freira ponderou:

— Só naqueles que sugam o dinheiro do contribuinte e se aproveitam da boa fé do povo.

Ante uma mulher completamente indefesa, o agora monstruoso vampiro, agarra-a com força e erguendo seu pescoço, crava as enormes presas na sua jugular.

Encarregado posteriormente de dar sumiço ao corpo, e não conseguindo ocultar certa surpresa pelo fato de seu patrão ter sugado o sangue de uma pobre freira, o lacaio perguntou:

— Mas por que teve de ser ela, mestre?

— Apenas porque nós, os modernos vampiros, temos de nos aproveitar exatamente das pessoas que mais nos parecem ser boas e honestas.