GÊMEOS IDÊNTICOS

Assim eram eles. Tão iguais desde bebês, que a própria mãe tinha certa dificuldade em distingui-los e para complicar ainda mais, vestia-os de maneira igual.

Chamavam-se Roberto e Renato, nada, nada mesmo os diferenciava, eram tão “clones” que pareciam estar diante de um espelho, para quem os observasse frente a frente e repetindo os mesmos gestos. Algo assim, verdadeiramente incrível.

Porém um detalhe os diferenciava e não estava na aparência. Embora recebessem a mesma educação e carinho dos pais, seus comportamentos revelavam, já desde meninos a grande diferença que havia em suas personalidades.

Roberto era atrevido, preguiçoso, falastrão, ousado, brigão e logo que ganhou entendimento da vida, ainda aos sete anos, relutava em vestir-se qual o irmão e nem gostava ser confundido com ele, a menos que se tratasse de não assumir a culpa por alguma travessura ou maldade que fizesse, aí então de sua semelhança tirava proveito.

Renato por sua vez era tranqüilo, medroso, calado, estudioso e de uma bondade rara e até incomum para a criança que era.

Perto da casa onde vivia a família, uma senhora mendiga, e que era maltratada e humilhada por quase todos os moleques quando iam ou voltavam da escola, odiava particularmente os gêmeos, que para ela que mal enxergava e tinha visão dupla era somente um. Roberto atirava-lhe pedras, a maltratava.

- Benedita maluca! Velha suja cagona! – assim a chamava apoiado pelos colegas, ao que ela replicava furiosa:

- Vai a merda seu desgraçado venha aqui, para ver se não te sento o pau – bradava a pobre cabo de vassoura em punho.

Renato, entretanto, sentia pena da pobre senhora, que passava seus dias e noites jogada sob a marquise de um botequim fechado e abandonado com seu trapos espalhados à volta e com um lenço velho e sujo amarrado à cabeça, nunca a perturbava, mas a temia e não ousava aproximar-se dela.

Naquela manhã de inverno, quando um vento gelado, daqueles que parece que vai congelar nossos pulmões iam os irmãos à escola vestindo agasalhos novos (a contra gosto de Roberto, iguais), que a mãe lhes comprara. Ao passar por Benedita, Renato notou que a pobre senhora encolhida e coberta por jornais tremia com os lábios arroxeados. A compaixão o acompanhou durante todo o dia na escola. Não conseguia esquecer a triste cena que vira pela manhã.

Quando voltavam a casa, o frio ainda era intenso, e a pobre encolhida no canto comia com as mãos em uma cuia os restos de comida que alguém lhe dera. Renato deixou que o irmão caminhasse junto ao grupo à frente, chegou-se à ela guardando certa distância, Ela,que já se apoderara do cabo de vassoura, pronta para reagir imaginando que o menino a viesse ofender:

- Sai pra lá diabinho ou vou te meter o pau!

- Não precisa ficar zangada vejo que a senhora sente frio e quero lhe dar o meu casaco, eu tenho outros. – disse o menino com voz quase sumida.

- O que!? – exclamou a senhora incrédula – tá querendo ser bonzinho depois de xingar e me atirar pedras todo dia?

- Não sou eu que faço isso, eu tenho um irmão gêmeo.

Benedita, que pouco enxergava, então percebeu pela doçura das palavras do menino, que ele estava sendo sincero:

- Onde está o seu irmão então?

- Ele vai caminhando ali na frente, aceite por favor o agasalho, ele é quentinho.

- Não posso fazer isso, sua mãe vai brigar com você!

- Aceite, por favor, se ela brigar comigo direi que o esqueci na escola.

- Não seja bobo, ela não vai acreditar nisso e quando passar por aqui e me ver usando seu agasalho, vai pensar que o tomei de você.

Benedita vacilou. Ela era pequena e magrinha e o casaco do garoto servia-lhe, perfeitamente.Depois procuraria por sua casa e falaria à sua mãe. Não quis frustrar a boa ação do menino e acabou aceitando.

Antes que ele se fosse perguntou:

- Como é o seu nome?

- Roberto – respondeu ele e seguiu caminhando bem devagar distanciando-se do irmão, que nem deu por sua ausência entretido que ia brincando com os colegas.

Ao chegar á casa cuidou de entrar pela porta dos fundos. O irmão já havia chegado trocado de roupa e brincava no quintal, sua mãe fora ao mercado e não os viu chegar.

Renato pegou o agasalho do irmão e o colocou em seu armário, imaginou que quando a mãe desse por falta de um dos casacos, seria o do irmão e não o dele.

No dia seguinte também fazia frio e na hora de ir para a escola, quando os dois brigavam pela posse do casaco, e a mãe, D. Lucia querendo saber quem perdera o seu. No auge da discussão, com Roberto querendo bater no irmão, certo de que ele pegara o seu, ouviram palmas ao portão.

Os três saíram para ver do que tratava e quando Roberto deparou com Benedita enrolada em um cobertor, tremeu dos pés à cabeça imaginando que ela viera queixar-se à sua mãe sobre seus maus tratos.

A senhora, entretanto, retirando debaixo do cobertor que lhe servia como manta o agasalho que Renato a houvera doado no dia anterior com olhar agradecido:

- Bom dia, eu sou Benedita e vim devolver o agasalho que seu menino deu-me ontem ao ver-me tremendo de frio, não foi difícil encontrar a sua casa todos conhecem os meninos. A senhora está de parabéns tem um filho com um grande coração, ajudou a me aquecer até a noite quando o padre me trouxe esse cobertor.

D. Lucia apontando para os filhos, mesmo sabendo que seria impossível para a mulher identificar qual dos dois o fizera. Perguntou:

- Qual deles o fez , a senhora saberia dizer?

- Não senhora, mas ele me deu o nome de Roberto.

Os irmãos se entreolharam, enquanto a mãe passava ternamente a mão à cabeça de Roberto que se mantinha surpreso e em silêncio.

D. Lucia agradeceu, convidou Benedita a entrar e tomar o café da manhã com a família e quando estavam todos à mesa, Renato sorria olhando o irmão cabisbaixo e arrependido, e que a partir daquele dia, nunca mais ofendeu ou maltratou a pobre senhora.

A grandeza de um coração, não está só nas boas intenções, mas unicamente nas boas ações..

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Jogon Santos
Enviado por Jogon Santos em 31/10/2013
Reeditado em 04/02/2019
Código do texto: T4550436
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