CATALEPSIA E SUAS CONSEQUÊNCIAS

“CATALEPSIA E SUAS CONSEQUÊNCIAS”

Mais uma vez, um miniconto da grande escritora e não menos amiga querida Zélia Maria Freire, inspirou-me a contar uma história que ouvi pelo rádio, na época em que não tínhamos, ainda, TV no Rio da Janeiro. O miniconto é “RECORDAR EU POSSO” , editado em 30/10/2013.

A história que irei contar, não me lembro se foi narrada como real ou fictícia; só sei que ela ficou na minha memória e dela nunca me esqueci:

Era um jovem de família nobre que herdou um castelo e, ao se casar, iria morar nele com a esposa. Antes do casamento, procurou manter todas as características do palácio, incluindo móveis , quadros, objetos de valor como grandes jarros de porcelana, prataria, retratos de família , tudo restaurado. Até as velhas cortinas puderam ser lavadas e colocadas nas grandes janelas para que tudo parecesse o velho casarão onde seus antepassados moraram por muitos anos. Ele, mesmo, pouco conheceu a família que não era grande e, de repente viu-se como herdeiro único e universal . Sabia da saga da sua família de catalépticos, porém, empolgado com os preparativos do casamento e feliz com o próximo evento que se aproximava, esqueceu-se de avisar a futura esposa que, caso passasse mal, chamasse logo o Dr. Alberto Ruis, médico da família que saberia o que fazer...

Explico: segundo o Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa O GLOBO, Catalepsia é uma síndrome nervosa de índole histérica, caracterizada pela suspensão total do movimento voluntário e da sensibilidade e principalmente pela rigidez dos músculos.

O médico que desconhece a família portadora dessa síndrome, muitas vezes acaba diagnosticando como a morte do doente, visto a parada e a rigidez total de todos os movimentos.

Continuando a história, o jovem casal, casou-se numa tarde primaveril e, terminada a festa para os amigos, encaminharam-se para o Castelo, agora todo iluminado para recebê-los.

Estavam ansiosos, iriam finalmente gozar as delícias da lua de mel. Encaminharam-se para o quarto regiamente orlado de flores do próprio jardim que rodeava o castelo e, primorosamente cuidado pelo antigo jardineiro Joaquim.

De repente, Joaquim ouve um grito angustiante que vinha de dentro da casa. Corre para dentro e vê, no alto da escada, a jovem senhora gritando e pedindo socorro:

- Que foi, senhora? _ pergunta, já imaginando ser o que já teria presenciado antes.

- Acho que meu marido morreu. Teve um ataque e está totalmente parado, inerte. Já tentei acordá-lo, mas está como morto. Ai, meu Deus! O que faço Joaquim? Me ajude...

Joaquim, não querendo assustá-la, pediu a agenda do marido e, ele mesmo ligou para o Dr. Alberto Ruis. Infelizmente, o médico não pôde atender, pois estava longe, num congresso e só voltaria dentro de uma semana. Atendeu-o o novo assistente do Dr. Ruis, um médico jovem que nada sabia sobre a patologia que pairava sobre aquela família. Ao olhar para o rapaz estirado na cama, olhar cadavérico, o corpo todo rígido, tentou auscultá-lo mas nada sentindo, diagnosticou como morte violenta, provocada, talvez, por um enfarto do miocárdio...

O pobre do jardineiro ainda tentou questionar sobre a possibilidade de um ataque que, algumas pessoas da família tinham tido, mas que depois voltavam ao normal.

- Que nada, meu senhor! Este homem está morto. Mortinho da Silva! Não tenho dúvidas...

A pobre noiva, já viúva, caiu num pranto doloroso. Não se conformava com tamanha perda, logo na primeira noite do seu casamento...

O rapaz foi enterrado no mausoléu da família, desses que têm grade e portão com cadeado.

Nos dias subsequentes, a jovem viúva chorava e rezava para que o marido aparecesse para que Ela o visse pela última vez, para dizer-lhe que o amava muito e que nunca o esqueceria.

A antiga cozinheira do castelo, penalizada com o sofrimento da patroa, ofereceu-se para apresentar-lhe uma médium que trabalhava promovendo a interação com os mortos, dando a oportunidade de a patroa poder se comunicar com o falecido...

Oferta aceita na hora. No dia seguinte, já estava a médium adentrando no castelo com os apetrechos que usaria na sessão mediúnica, como velas, charuto e vestimenta branca. Sem antes, obviamente, de dizer o quanto o seu cavalo cobraria pelo feito, trabalho difícil, pois demandaria muito esforço que no dia seguinte o deixaria muito cansado.

A viúva, ansiosa para se comunicar com o marido, sequer, prestou atenção no vultoso valor cobrado que lhe fora imposto.

Antes que começasse a sessão, pediu que chamasse a cozinheira e o jardineiro para ajudarem na corrente humana que reforçaria o chamamento do falecido.

Todos a postos, com o ambiente preparado já com as velas acesas, a médium, colocou suas guias, ornamentos usados para a chegada do espírito...

Com a foto do defunto colocada sobre uma mesa e virada para eles, a médium benzeu-se e gesticulando com as mãos para o alto, pronunciava palavras inaudíveis e, de repente, baixou o caboclo:

- Misan fia, cumé memo o nome do seu marido?

- É Osvaldo... Por favor, estou nervosa... ansiosa... Quero vê-lo!!

- Suncê tá nervosa fia, fica carma, ele vai parecê... _ A seguir, fez sinal para que todos dessem as mãos para formar uma corrente de forças.

E assim, ficaram horas sem que o espírito aparecesse. A médium chamava pelo Osvaldo e... nada. A viúva, já não aguentava mais e começou a reclamar:

- Por que ele não vem? _ Indagava...

- Ele tá qui, oia pas curtina... tá mexendo, ocê num vê?

A pobre viúva inocente, pedia que apertassem bem as mãos, para que a corrente ficasse mais forte propiciando o aparecimento do Osvaldo. O jardineiro e a cozinheira, com a viúva chamavam pelo Osvaldo: Osvaldo aparece, Osvaldo aparece, Osvaldo aparece e o Osvaldo nada de aparecer... Até que o Joaquim, irritado, falou:

- Essa mulher não faz aparecer espírito nenhum! Estou aqui perdendo tempo e o meu jardim está lá me esperando. Isso é uma palhaçada!

A cozinheira, por sua vez, concordou, dizendo:

- Eu também, preciso providenciar o almoço. Hiiii, esqueci a panela do feijão no fogo. Nessa altura, o feijão já queimou!!! E saiu correndo pra cozinha...

A viúva desolada, e já desanimada, perguntou pra médium, já sem o caboclo:

- A senhora não conseguiu, por que?

- Ele esteve aqui em espírito; somente eu pude perceber a energia dele através das cortinas. Seu espírito estava muito debilitado; por isso, ele não pôde se materializar. Sua morte foi repentina e ele ainda está meio perdido...

- Quer dizer, senhora, que eu tenho que me conformar... Já que não foi possível ver e falar com meu marido, posso pelo menos recordar, sim, porque “RECORDAR EU POSSO”. Ficarei sempre abraçada ao meu peito com a foto dele, conversando e lembrando das horas felizes que tivemos e dos planos que fizemos e não pudemos realizar. Quem sabe, ele não me aparece? Ficarei rezando muito e sempre...

- É dona, fiz o que pude, mas infelizmente, não deu. Quem sabe num outro dia? Agora tenho que ir pra casa descansar o meu cavalo. Boa tarde, e saiu...

Mas a história não acabou ai. O Dr. Ruis, quando chegou da viagem e soube da morte do Osvaldo, ficou apreensivo. Rapidamente, pegou o assistente e partiram para o cemitério e lá ele viu o que previa. Osvaldo estava morto encostado à grade do mausoléu... Ali estava a prova de que Osvaldo acordara da catalepsia e acabara morrendo por ter ficado, sem ser ouvido por alguém que o socorresse...

Chegando à casa da viúva, o médico perguntou-lhe se o Osvaldo não a avisara da tal patologia. Ela, ainda muito chorosa, contou-lhe que não. O médico ficou sem saber o que dizer. Ao ouvir o relato da tentativa que tiveram com a médium e da forte corrente que fizeram para promover a comunicação com o marido, o médico, imediatamente descobriu a causa-morte do Osvaldo...

A médium, efetivamente, tinha poder de fazer a comunicação, concluiu o médico, que também era espírita. Só que não foi possível porque, ao acordar do ataque de catalepsia, viu-se preso pelas grades do mausoléu e, angustiado, começou a pedir socorro, no que ninguém apareceu para salvá-lo. Os dias passavam e nada. A fome e a angustia, deixavam-no cada vez mais fraco. Ouvia o chamamento triste da amada e o apelo da médium com a sua corrente de forças. Num ímpeto de ir ao encontro da amada, o espírito de Osvaldo, conseguiu desprender-se de seu corpo e este ficou lá caído e morto. Seu espírito, também debilitado, não conseguiu transpor as grossas cortinas, mas a médium percebeu que ele estava ali, pelo balançar das cortinas, como que pedindo ajuda...

Adendo: Esta história foi transcrita como eu a entendi. Enfeitei-a um pouco, para torná-la menos triste...

Tete Brito
Enviado por Tete Brito em 01/11/2013
Reeditado em 01/11/2013
Código do texto: T4551298
Classificação de conteúdo: seguro