a MENINA que brincava com MENINOS

Em dia de sol, estava a mãe colocando as roupas no varal no quintal de uma casa de periferia de Taboão da Serra.

Sua única filha, de 5 anos, muito arredia, brincava na rua com mais três garotos.

A menina, pulando e correndo de um menino, escorrega na calçada e cai, arranhando seus braços.

A mãe, muito irritada, agarra na mão da menina e a leva para a cozinha, dizendo:

- Você não pode brincar com meninos. Meninas brincam de boneca e meninos, empinam pipa e jogam bola, entende?

- Mas não acho errado brincar com eles, mamãe.

- Mas é. A partir de hoje esqueça-os. Outro dia vi você quase brigando com um moleque de 7 anos. Vai fazer como toda menina faz: brincar de boneca!

A menina chorou bastante, mostrando-se muito triste com as palavras de sua mãe. Contudo, não parecia que iria seguir seus conselhos.

Cinco anos se passaram e o comportamento da menina piorou. Era comum estar no meio de brigas com meninos. Ela já havia sido apelidada de Maria-joão pelo seu comportamento meio “masculinizado”. Alguns colegas já sentiam certo receio de arrumar atritos com a garota, afinal, seria motivo de gargalhada “apanhar” de uma menina.

Um certo dia, na frente de sua casa, a garota quis brigar com um garoto, que parecia ser bem mais forte e bastante petulante. Cerca de vinte crianças fizeram uma roda para acompanhar o embate.

E a briga começou.

O menina desvia-se de um soco no olho e, em seguida, derruba o garoto, esmurrando-o na cabeça. De repente, chega a mãe da garota e, agarrando a mão da filha, leva-a a para dentro da casa.

No quarto a mãe lhe disse: você é menina e um dia vai ser moça, vai ter um homem e filhos para cuidar. Ouviu o que falei? Tem que ser amável como eu sou com você.

- Se fosse amável o pai não tinha ido embora!

A mãe vendo isto, deu umas chineladas na menina, falando para que nunca mais dissesse tal coisa de novo.

E duas semanas se passaram.

Era de tarde e a mãe limpava o fogão. Quando, então, surge um assaltante.

A mãe fica parada, sem saber o que fazer.

Ele mira a arma para a cabeça da mãe e diz que quer dinheiro que estava na bolsa, dinheiro que seria utilizado para pagar o aluguel da casa.

A mãe segura a bolsa e o assaltante com uma das mãos, tenta tirar a bolsa da mulher. O homem, vendo que a mulher estava dificultado as coisas, mira para ela e, momentos antes de dar o tiro, a garota pula em cima da bolsa, soltando um grito desesperador. Ela é atingida e cai ao chão.

Em seguida o assaltante vai embora. A menina é levada diretamente ao hospital.

Após ser tratada, o médico disse que a garota iria ficar bem, mas que o útero havia sido atingido, de tal maneira que nunca mais teria filhos.

A menina, no leito do hospital, com a mãe ao seu lado disse:

- Mamãe, eu fui todos estes dias da minha vida uma pessoa briguenta porque o pai foi embora e não tenho irmão.

A mãe, ouvindo aquelas palavras, ficou bastante comovida.

E a filha continuou:

- E tentei, durante todos estes anos, aprender a ser forte, a enfrentar todos para um dia proteger você, mamãe. Desculpa se eu falhei.

A mamãe começa a chorar e, em prantos, disse:

- Você não falhou, minha filha. Você salvou a minha vida.