Muladeiro (capítulo XXV)

O bar de Vicente tornou-se o ponto de encontro para a conversa sobre o carrão que visitou a casa do senhor Teodoro. Muito burburinho, suspeitas, sondagens e até apostas fizeram com que os frequentadores se encontrassem, com pontualidade, no boteco.

O proprietário a todos mirava, dava um palpite aqui, outro acolá, mas nunca concluía, tampouco abafava o bate boca; sua féria aumentava e essa era a melhor parte.

"Sorte para uns, desgraça para outros", pensava, enquanto servia a cachaça barata e, por vezes, reaproveitada dos copos, cujos restos desciam para a boca de um pequeno funil de alumínio, que ficava diariamente encaixado na garrafa de vidro transparente, deixada do lado de dentro do balcão, sob a pia de mármore branco encardido e trincado.

Israel e Minduim só iam ao bar, quando percebiam que os bêbados e especuladores não estariam naquele lugar. Fugiam das perguntas, dissimulavam respostas, bebiam uma cerveja ordinária e, por vezes, fingiam estar embriagados para que suas falas saíssem desconexas.

A tática funcionava para muitos; contudo, Vicente sabia que alguma coisa estava mal esclarecida."Tem caroço nesse angu", resmungava baixinho, enquanto fechava a caixa registradora, sem dar as costas à freguesia.

____ Diz pra nóis, Vicentão, o que tu acha disso tudo? Num se fala nôtra coisa na vila toda! Parece até que vão desinterrá o defunto, pra módi contá o que aconteceu! - perguntou um bêbado, que se escorava no balcão do bar, tendo numa das mãos um copo com Cinzano.

Ao escutar a questão, Vicente não se manifestou. Deu com ombros em sinal de dúvida, porém queria mesmo opinar, falar o que suspeitava e sabia o que sabia; o velho Téo nunca foi flor que se cheirasse, e muito segredo havia sido confiado, durante as longas e espaçadas bebedeiras do fazendeiro.

Silvana Goes
Enviado por Silvana Goes em 27/03/2014
Código do texto: T4746202
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2014. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.