Folhas velhas

Aprecio o cheiro de folhas amareladas. Aquelas que grudam ao abrir um capítulo, junto com o aroma de eucalipto do alvejante que a moça estava limpando o chão da biblioteca. Tudo tão limpo, mas tão antigo, que fazia-me sentir em minha própria casa. Não fosse ter acabado de ler aquele livro, e a sensação de tê-lo para mim logo veio. Fui para minha residência, e fiz o pedido dele pela internet. Mal podia esperar para lê-lo novamente, mas sentada em minha poltrona, e não numa cadeira lisa e dura de um lugar frio e cheio de pessoas como uma livraria. Como moro na capital, demorou apenas alguns dias para o livro chegar. E, quando chegou, senti-me tão feliz que abracei o carteiro, como se ele tivesse me presenteado. Subi as escadas, tirei a embalagem e aquele plástico que envolvia meu tão amado livro, e senti seu aroma de coisa nova. Confesso que isso deu-me uma pouco de desapontamento - afinal, nada se compara ao cheiro de folhas velhas. Isso fez deveras falta para mim.

Passado alguns dias, já havia devorado o livro. Não obstante, procurei por outro na livraria virtual, e fiz o pedido. O mesmo carteiro veio trazer, e novamente o abracei como forma de agradecimento. Fiz a mesma coisa que dantes - tirei a embalagem, cheirei e devorei a estória. Mas, queria mais. E assim, fiz mais pedidos. Depois de todos lidos, já não estava satisfeita. Algo estava errado. E daí, resolvi fazer outro pedido, para satisfazer minha ânsia de ler. E aí, o carteiro veio, e quando o abracei, senti meu coração gelar. Toda aquela espera, desde o segundo livro, era somente para vê-lo, e eu não havia dado conta de nada disso. Só pensei nos livros, mas nunca me toquei que eram os olhos baixos do rapaz que me chamava toda vez que terminava de ler uma estória. Ele havia partido, e entrei em minha casa. Sentei-me na poltrona, mas não tive coragem de abrir e ler o livro. Fitei o teto por um bom tempo, pensando naqueles olhos baixos e braços largos. Estava apaixonada. E tudo o que tinha, era apenas uma troca de abraços espontâneos, dados de minha parte. O rapaz sempre sorria desconcertado, mas nada dizia. Continuei pensando nisso, enquanto os dias iam se seguindo, e, não abria o livro. Resolvi fazer um outro pedido, para ver meu amado de braços largos, e quando chamaram-me no portão, fui com tanta ânsia, que meu coração quase saltou para fora de minhas entranhas. Em vão; outro carteiro estava me trazendo a encomenda.

- Onde está o outro rapaz? O alto, de olhos claros? - Perguntei, fingindo não ter nada mais que súbita curiosidade.

- Quem? Há tantos carteiros...

- Um que vinha sempre nesse horário trazer-me encomendas. Olhos baixos, braços largos...

- Ah! - Exclamou - O Danilo. Mudou-se de cidade.

- Sério? - Perguntei assombrada, mas sem demonstrar meu desapontamento ou tristeza.

- Sim, ele estava esperando ser chamado para trabalhar num fórum. Estudava Direito. Curioso você perguntar por ele. - respondeu desconfiado.

- Ah! - Exclamei disfarçando minha frustração. - Acostumei-me a vê-lo por aqui sempre.

- Não se preocupe, senhora; há vários carteiros na cidade. - E dizendo isso, partiu.

Fiquei tão desolada! Perdi tempo! Não disse nada. Apenas abraços amenos.

E, sequer tenho coragem de abrir o último livro que ele me deixara. Ficará como um singelo presente que não poderei abrir.

Dama William Dante
Enviado por Dama William Dante em 08/04/2014
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