Lili a porca

Os olhinhos imensamente arregalados de Aninha, não perdiam um gesto sequer. E seus ouvidos guardavam para sempre aquelas frase do pai:

- Ganhei de um fazendeiro...Resolvi trazer , pois as meninas não cresceram em fazendas. Nunca viram um animal vivo aqui na cidade, além de cão e gato.

Após a demorada compreensão e anuência da mulher, o cansado vendedor, libertou e soltou na sala de sua casa uma pequenina porca.

Vencido o susto e curiosidade. Logo, as meninas correram atrás do pequenino animal, que assustado disparou casa adentro.

Foi o suficiente, para as garotas se entusiasmarem com a nova brincadeira. Agora tinham mais uma amiguinha para distraí-las e compartilhar suas fantasias.

Neste mesmo dia o animal foi batizado com o nome de Lili. Sim, porque a dona da casa fora criada em sítio. Conhecia animais, a lida destes lugares e os sexos dos animais. E aquela ali era uma fêmea.

Para Aninha, a porquinha era cor de rosa; para sua irmã era lourinha.

Mas, isto não queria dizer nada. Só que a porquinha era macia, fofa e

muito amada. Tanto, que as meninas davam-lhe banho todos os dias, passavam-lhe talco.

- Perfumadíssimo!

E vestiam a porquinha como uma menina. Com vestidinhos de criança, laços de fitas cor de rosa, combinando com sua pele alva. Inclusive, com calcinhas.

- Para não sujar a casa limpa.

A dona da casa, sabiamente, já pressentira, no primeiro dia, que tudo aquilo não era ia acabar bem. Porém, como gostava das filhas ...

Já diz um dito popular: Quem adoça a boca da criança, adoça o coração dos pais.

Assim sendo, só restava a ela concordar com o fato e com tudo que adviria daí.

Isto foi num começo de ano, da infância de Aninha e seus irmãos.

E os meses foram se somando... A porquinha crescendo... e correndo atrás das meninas e do pequenino irmão, pela casa inteira... Pulando camas, sofás.. e conquistando até os duros corações.

Até que o final de ano se aproximava e Aninha parecia ter ouvido o pai cochichar algo para a mãe a respeito da porca.

- É ela está crescendo, engordando, ... e as crianças?

E o coração de Aninha apertava, nessas ocasiões, e ele não sabia o porquê.

Mas eram só momentos breves. Logo a seguir, lá estavam todos a correr e gargalhar pelos cômodos e quintal da casa.

Foram meses só de alegria. Até que o Natal se aproximou e num belo, não, Triste dia. O pai chegou em casa com um homem forte e estranho, ao que o pai explicou à mulher:

- Este é o sr. Fulano, motorista de táxi, que me trouxe e ao saber que eu não teria coragem. Ele se prontificou a fazer aquilo por mim.

Não sei o porquê. Nem Aninha sabia. Mas, seu coração disparou, seus

olhos esbugalharam. E ainda zonza, foi conduzida pela mãe, junto com seus irmãos a uma caminhada pelo quarteirão.

Foi o passeio de minutos mais longos de sua vida. Caminhando ouviam uns berros horríveis... Ao que a mãe apertava-lhe mais e mais as mãos.

Finalmente em casa, o homem se despedia e entregava um objeto para seu pai confirmando. - Está feito.

Era véspera, ou antevéspera de Natal. Aninha não vira mais sua amiguinha pela casa. E todos os adultos dissimulavam...

Na ceia. Todos à mesa. O pai à cabeceira, olhava todos, tentando sondar-lhes os gestos e atitudes e ao mesmo tempo tentando ser o

machão da família. Até que a mãe trouxe a travessa com um assado, que foi destrinchado e distribuído a todos.

O silêncio era pesado e sentido. Verdadeira despedida de amizade.

Sob o olhar do pai e a recusa de todas as crianças, os pedaços ficaram intactos no prato.

O pai tentando encorajar a todos...

- Ninguém vai comer? Pois, está bem. Eu como!

Levou a primeira garfada à boca...

E resmungou meio choroso, entre todos os outros choros... e após empurrar o seu prato para longe.

- Que inferno. Pra mim, acabou o Natal.

anna celia motta
Enviado por anna celia motta em 13/04/2014
Reeditado em 09/06/2014
Código do texto: T4767471
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