Noite de insônia

Seria mais uma noite de insônia,ela sabia bem. Há quanto tempo rolava na cama, tentando achar uma boa posição para dormir? Já lera que, quando não se consegue dormir, era bom levantar e andar um pouco, mas não tinha nenhuma disposição em fazê-lo, de tão cansada.

"Por que não posso, ao menos, cair no esquecimento do sono?" pensou com raiva.

Ficar acordada era ruim, porque a fazia pensar. E ela não queria pensar, queria esquecer Paulo por umas horas.

"Paulo, por quanto tempo mais eu aguentarei? Não quero mais aguentar, Paulo, não quero. Quero ter uma vida de verdade, desfrutar um pouco de felicidade."

Quando Paulo ia vê-la, eles se amavam naquela cama e ele reclamava da esposa e de suas exigências.

-Ah, Sara, você não imagina como é bom estar ao seu lado. A Eugênia só reclama da vida.

-E por que continua casado com ela?

-Convenções, Sara. No meu mundo, aparência é tudo. Mas com você, não tenho que ligar para aparências, posso ser eu.

-E ela é tão desequilibrada assim?

-Você nem imagina quanto.

Mas seria Eugênia realmente o monstro que Paulo pintava? Resolvida a se aquietar, ficou de costas na cama. Será que Eugênia desconfiava do caso do marido? Começou a sentir pena e inveja dela. Ela acordava todos os dias ao lado de Paulo, era mãe de seus filhos, tinha que ir com ele a compromissos sociais, fazer o papel de esposa perfeita e conhecia os defeitos dele. E ela, Sara, o que ela era? Ela era a outra, a que ele visitava quando podia, com quem tinha momentos de prazer e pronto. Era apenas a amante. Paulo a procurava para relaxar, sentir-se viril e esquecer os aborrecimentos de sua vida de grande empresário que vivia um casamento falido.

"Será que ele me ama?"

Talvez Paulo e Eugênia houvessem casado apaixonados, cheios de planos. Então, o que matara o amor de ambos? Impossível saber. Provavelmente, nem eles sabiam.

"Se os jornais soubessem que Paulo tem uma amante..."

Se Eugênia desconfiava, o que pensava? Que a outra era somente a outra, enquanto ela era a esposa oficial, que aparecia ao lado dele nas colunas sociais, sorridente e elegante?

"E ninguém estranharia se descobrisse que o empresário Paulo tem uma amante, não é? Não se espera dos homens que sejam santos."

Enroscou-se em posição fetal, tentando não chorar. Tanto Eugênia quanto ela tinham apenas uma parte de Paulo. Nenhuma o tinha completo, numa relação sincera.

"Ele usa a nós duas, Eugênia, ele usa a nós duas. Você é útil como a esposa chique e eu, como a amante dócil, sempre à espera dele, que nunca terá uma relação verdadeira com nenhuma de nós."

Aquela era uma verdade crua, brutal, que sempre existira, mas ela se recusara a ver.

"O que sustenta as situações ridículas é o fato de nos recusarmos a vê-las, pois não queremos admitir que vivemos essas situações absurdas."

Imaginou como seria não dormir mais sozinha, mas com alguém ao seu lado, disposto a lhe dar amor e respeito.

"Por que eu tenho que continuar sendo a outra? Será possível que, no fundo, eu me ache indigna de ser amada?"

Sabia que não descobriria as respostas, por mais que pensasse. Acomodou-se de lado, esperando não demorar a dormir.

"Se Paulo não me ama, melhor nos deixarmos. Amor não se dá como esmola, mas livremente e com generosidade."