Cisterneiro Walder

Foi só um filete de grito, mas o clamor foi bem entendido

pelo fiel João. Logo lançou a corda e produziu forças que lhe

eram desconhecidas para içar o Alemão do fundo do poço. Na

emergência, todo mundo é moço.

Já recostado num monte de argila, que saíra daquele crescente buraco, rosto comprimido e sangue

ainda a lhe escorrer profusamente pelo peito do pé, o Alemão diz

que não é nada. Acha que nem gastar com médico precisa. No máximo

uma farmácia.

Mas o socorro lhe é providenciado dentro do imediato possível,

mal dando tempo a que o Alemão cisterneiro explique aos

atônitos circunstantes aquela desafortunada ocorrência. Mais um

pouco, poderia ter decepado o próprio pé.

A picareta - sempre picaretas - ao ser desferida para mais um corte tocara

acidentalmente no cabo da pá, e pá! Mas tudo em paz, o taxi ali

na rua já o leva num zás-trás.

E na semana seguinte, pé enfaixado, lá estava o Geraldo Alemão,

de novo no fundo do poço. E com poucos dias mais de escavação

deu-se no freático e a água começou a "merejá" as paredes.

Aos dezenove metros e quarenta - concedendo-se dois e pouco

de água - estava concluída a parte de escavação, que logo foi

seguida do revestimento, em tijolo bem queimado e o trabalho

por concluído dado.

Quando Geraldo retornou àquele poço já haviam passado mais

de dois anos. Foi para a sua limpeza, mas com aquela habitual

destreza, só exibindo a cicatriz no pé, e ar triunfante até.

Recuperou o "copão", de lata de gordura de coco, de dois litros,

que ali havia caído e já quase consumido pela ferrugem e muito pouca coisamais. Mas matou a saudade e a sede.

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 19/11/2014
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