Maçã Verde

Eram quatro e vinte e sete da manhã.Acordou com um susto, um desses pesadelos que esquecemos no minuto seguinte.Virou para o lado e sentiu um vazio,não era nada diferente.Levantou, acendeu a luz,deixou a janela entre-aberta, na esperança de ver algo espetacular,não ia ver já sabia, mas não custava tentar.

Seus dedos percorreram por toda a sala,até encontrarem o interruptor.Aquela luz amarelada sobre seus cabelos davam a impressão de crepúsculo.Foi até a cozinha e preparou um mingau,enquanto pensava nas coisas supérfluas e ridículas de sua vida.Lembrou da infância e de como tudo costumava ser simples,tudo passa ela já sabia.Ligou a tv e passava um filme de extremo mal-gosto,deixou ligada e foi ao banheiro,ligou o chuveiro bem quente e acendeu o difusor,aquele cheiro de infância disperniu-se pela casa toda e aquela luz amarelada se estendendo por todos os ambientes,e os diálogos desanimadores sobre qualquer homem se vingando.

Vingança,ela teria esse direito?Mas a quem se vingaria?Pensou em seu primeiro namorado,vingança?Por ele ter lhe ensinado que nada poderia ser tão belo para não ter um fim?Não...Pensou no segundo namorado,vingança?Por lhe mostrar que nem tudo que tivesse amor não poderia ser triste?Também não,passou a pensar no dono da padaria,é, ele era um homem de péssima índole e sempre lhe dava os pãezinhos mais queimados,mesmo que pedisse sempre os pãezinhos claros.Não,não poderia vingar-se dele,afinal conseguira emagrecer graças aos pãezinhos queimados.

Terminou de comer o mingau,o chuveiro ainda estava ligado,e a casa toda com cheiro de maçã-verde e com o vapor delicioso de banho.Fechou a janela,afinal não teria mesmo nada de espetacular para se ver hoje,nem mesmo a lua com esse céu enuviado.Despiu-se e entrou debaixo daquela água corrente,quente.Molhou os cabelos,nem longos nem curtos,deixou a água escorrer por todo o corpo e enrolou-se na toalha.Vestiu seu moletom cinza e azul,o preferido,e sentou-se no sofá.

Já eram cinco e doze,mudou de canal repetidamente,e desligou a tv.Abriu a janela,e viu a noite indo embora,aos pouquinhos,lá adiante avistou uma pessoa correndo,atletas matinais.A lua estava mais visível,minguante.Fechou a janela.Lavou as louças que ficaram na pia,e o cheiro de maçã-verde também estava na cozinha.As mãos geladas,devido a água.Vestiu uma blusa roxa,que tinha desde os doze anos e ainda ficava grande.Arvores,beijos,caminhadas e aulas,uma vez um incêndio na escola e a blusa ficou chamuscada.

Foi para fora ver sair fumaça das bocas alheias.O atleta estava parado na padaria com um copo de café na mão e croissant na outra,eram seis e dezoito. Deu uma olhada,usava um tênis azul,não estava realmente vestido de atleta, era só um rapaz que correu.Entrou,pediu um capuccino e dois biscoitos amanteigados, enquanto esperava seus pãezinhos.Sentou-se na entrada da padaria como fazia de costume,e o moço sentou-se ao seu lado.Começaram a conversar sobre o clima ou algo assim,pegou os pães e o convidou para tomar um café na sua casa.Atravessaram a rua,entraram no prédio com a porta mais bonita,subiram no apartamento,agora a casa cheirava a um misto de maçã-verde,café e pão.Jogou a sacola da padaria na mesa,serviu um café,tomaram calados.Ficaram na sala,oito e sete,a tv ainda estava ligada,o cheiro de maçã-verde estava suave,mas impregnado em suas roupas.Comeram os pães,que já estavam frios,e tomaram um pouco mais de café,ele foi embora.Ela deitou-se no sofá e adormeceu.

Quando acordou não sabia se era sonho ou realidade.Sentiu o cheiro de maçã-verde,e um número de telefone em cima da mesa.Era real,mas jamais ligaria.Ele a ligou mês retrasado,mas teve que aprender que histórias de amor jamais começariam numa padaria,falando sobre o clima ou coisa parecida.

Marcaram na casa dela novamente, e até esse instante mora com ela. Em frente a uma padaria onde os pães estão sempre meio queimados, e sente-se um leve aroma de maçã-verde vindo da porta mais bonita do bairro.

ttyn dmn
Enviado por ttyn dmn em 02/06/2007
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