Vem sempre aqui?

– Oi. O que você está fazendo? – ele sentou ao lado dela.

Ela ergueu seus olhos para o cara sentado ao seu lado e se limitou a dar de ombros antes de voltar seu olhar para o copo na frente dela.

– Você tem nome? – ele tentou de novo.

“Como se ele não soubesse”, ela pensou e ficou em silencio dando um leve sorriso irônico para si mesma.

– Pelo visto não está a fim de falar – ele falou e ela nem sequer se mexeu. – Ou o problema sou eu?

– Finalmente, alguma coisa inteligente – ela murmurou achando que ele não tinha ouvido.

– Olha! Ela fala! – ele exclamou ironicamente

– O que você quer? – ela perguntou olhando desafiadoramente para ele.

– Conversar.

– Conversar? Você quer conversar? Acho que eu não ouvi direito.

– Qual o problema?

– Hmm, vamos ver. Será que você não percebe que não temos mais nada para conversar? Será que você não percebe que a ultima vez que conversamos foi o bastante? O que você acha que mudou de lá pra cá? Ou você só quer me machucar mais?

– Você sabe que eu nunca quis te machucar. A última coisa que eu queria era te ver triste.

– Acho que você fez um bom trabalho quanto a isso – ela disse ironicamente.

– Você pode, por favor, parar de ser irônica por, sei lá, cinco minutos e me ouvir?

– Acho meio difícil, mas pode falar. Estou ouvindo, não tenho outra opção mesmo – ela deu de ombros

– Por que você tem que ser assim?

– Assim como?

– Tão fria e grossa.

– Porque eu cansei de ser boazinha com quem me dispensa.

– Não foi assim. Você sabe que não foi.

– Sei?

– Sabe! Eu não te dispensei.

– Pois foi o que pareceu – ela deu de ombros.

– Nem tudo é o que parece. Se você parasse de me atacar e me ouvisse por um minuto talvez entendesse o que aconteceu.

– Desculpa, mas o que eu entendi foi que você decidiu terminar comigo sem um motivo aparente como se eu fosse a pior pessoa do mundo, como se eu estivesse fazendo algo muito horrível. – O tom de voz dela aumentou na última frase, mostrando toda sua frustração e dor. O muro que construíra se abaixando lentamente.

– Não foi assim. As coisas estavam estranhas.

– Estranhas? As coisas estavam estranhas? Conte-me mais sobre isso.

– Eu não sei explicar. Só sei que estavam estranhas.

– É esse o seu problema! Você nunca consegue explicar, você nunca sabe o que aconteceu e nunca fala o que está sentindo!

– Eu nunca fiquei tanto tempo com uma menina, nunca namorei. É uma coisa totalmente nova pra mim.

– Pra mim também. Eu não sei se você se lembra, mas eu também nunca fiquei tanto tempo com alguém. E era por isso que dava tudo tão certo: os dois estavam aprendendo a lidar com tudo e um podia ajudar o outro. Ou pelo menos eu achei que fosse assim.

– E era! – ele concordou com ela pela primeira vez naquela noite.

– Então me explica o que aconteceu. O que mudou pra ficar estranho.

– Eu já disse que não sei. Eu, simplesmente, não consigo explicar.

– Desse jeito não vamos a lugar nenhum. Você disse que queria conversar. Então, conversa! E sem essa de ‘não sei o que aconteceu’, ‘não sei explicar’.

– O que você quer que eu fale então?

– Não sei! Você que queria conversar comigo. Mas tudo bem. Se você não sabe o que falar, eu posso falar por você.

Ele não falou nada, só encarou suas mãos. E ela encarou aquilo como um sinal para continuar. Como sempre, ela iria falar sozinha e iria ser um grande monologo. E talvez não ficasse nada bonito.

– É esse o seu problema. Você sempre foge das discussões. Você adora começar, mas odeia continuar, né. E você nunca fala o que está sentindo. Então eu sempre tenho que imaginar. E isso é terrível! Você deveria me contar as coisas e o que sente. É por isso que eu era a sua namorada. E não só pra ficar se pegando quando você estava entediado. Mas eu acreditava que quando acontecesse alguma coisa mais séria você falaria pra mim, eu acreditava que você confiava em mim o suficiente para me contar tudo. Eu acreditava, também, que você estava feliz comigo, que estava tudo bem entre nós dois e que continuaria assim por um bom tempo. Eu cheguei a acreditar que seria para sempre. E olha que eu nunca acreditei nisso. E parece que, no final das contas, eu estava certa em pelo menos uma coisa. Ninguém nunca fica até o final em nossas vidas.

– Não fala assim. Eu sempre vou estar na sua vida, vamos continuar amigos. Isso não precisa mudar. E eu era feliz com você. Muito feliz, aliás.

– Amigos? Você quer ser meu amigo mesmo depois de tudo isso? É tipo o meu premio de consolação?

– Não faz assim. Não fala assim. Você sabe que a sua amizade sempre foi muito importante pra mim. E vai continuar sendo – ele disse parecendo estar magoado.

– Se a minha amizade é tão importante assim, por que faz mais de um mês que eu não tenho notícias suas? Por que você não me contou o que estava sentindo desde o principio? Ou por que foi um completo idiota da última vez em que nos falamos?

Ele continuou em silêncio só olhando para ela tentando descobrir o que responder ou como explicar o que estava sentindo sendo que nem ele sabia muito bem o que era. Tudo isso estava sendo muito mais difícil do que imaginava que seria. É claro que não era presunçoso e achava que um pedido de desculpas fosse resolver tudo isso, ele só não esperava encontra-la daquele jeito. Tão fria.

Mas ela não podia evitar. Doía muito olhar pra ele. Na verdade, só saber que ele estava no mesmo lugar que ela já doía demais. Era como se alguém estivesse arrancando um pedaço dela. E ela não podia chorar, ele não podia saber o quanto estava machucada e magoada. Tinha prometido para si mesma que não se sentiria mais assim e que não ia deixar se magoar de novo por ele. Mas não é como se pudesse controlar isso.

E o fato de ele continuar com essa história de ‘não sei explicar’ não a ajudava em nada. Ela tinha vontade de arrancar a cabeça dele fora. Ela não entendia porque ele estava fazendo isso. Se ele não ia explicar, por que ficar remoendo? Por que ficar cutucando a ferida quando esta já estava quase se fechando? Às vezes, ela chegava a pensar que ele sentia prazer em tortura-la.

Mas ele, definitivamente, não gostava disso. Não gostava dessa situação, mas também não conseguia encontrar um jeito de acabar com tudo isso.

– Olha, se você não vai responder as minhas dúvidas então não faz sentido tudo isso. Acho que o melhor é esquecermos e cada um ir pro seu lado – ela disse por fim sem olhar para ele.

– O que você quer dizer com isso?

– Que eu não vou mais ser a menina patética que fica correndo atrás de você como se não tivesse mais nada pra fazer. Eu cansei de tentar consertar tudo e você não me ajudar com isso. Eu não posso ser sua amiga, porque você sabe que não é isso o que eu quero. Você teve a sua chance. Então fique com a sua decisão e com o tempo que você tinha me pedido. E pode ter certeza de uma coisa: eu não vou ficar esperando você mudar de ideia. Eu preciso seguir minha vida e te deixar pra trás de uma vez por todas.

– As coisas não precisam ser assim.

– Eu acho que precisam. Há dois meses você me pediu um tempo quando eu ia te pedir de volta. E depois disse que estava bem sem falar comigo. E isso me machucou de um jeito que você não pode nem imaginar. Então você pode ser feliz para sempre com o seu tempo. Eu não me importo mais.

– Eu sei que você se importa.

– Ok, você está certo. Eu me importo. Mas não vou mais. Você não é mais o cara por quem eu me apaixonei. Vocês são muito parecidos fisicamente, mas são pessoas completamente diferentes. Eu não te conheço mais.

Ela não esperou ele responder e se levantou de onde estava sentada, pronta pra sair dali e encontrar um lugar mais tranquilo onde pudesse se recompor sem precisar se preocupar com suas lágrimas que estavam ameaçando a cair.

Mas algo estava a impedindo. Ela não sabia bem o que era, mas não conseguia sair dali. Ela sabia que aquele era o fim definitivo. Não iria mais dar chances para ele, não ia mais ficar esperando o dia em que ele voltaria para ela, porque esse dia não ia existir. Ela estava cansada de tudo aquilo, de tentar e não conseguir nada. Estava na hora de partir de uma vez por todas e deixar tudo aquilo para trás.

Mas então ele a segurou pelo braço. Não forte, mas firme o suficiente para ela não conseguir se soltar. Ela nem tentou lutar ou se afastar e só olhou para ele derrotada.

– O que você quer de mim? – ela perguntou.

– Eu quero você.

– Não, você não quer. Você me teve por muito tempo só para você. Mas você jogou isso fora. Você teve sua chance e jogou fora.

– Eu não joguei nada fora.

– No momento em que você disse que preferia não falar comigo, você jogou tudo isso fora. E eu entendo que talvez você estivesse machucado e com medo, mas eu poderia te ajudar. Eu era a sua amiga e só queria cumprir meu papel como uma e você recusou. Naquele dia eu percebi que você não queria mais nada comigo, e que tudo aquilo que vivemos morreu.

– Não morreu. Eles sempre vão ficar em nossas memórias.

– Talvez você esteja certo. Mas daqui pra frente, não existe mais nós. Existe um eu e um você. E é só isso.

– Não fala assim – ele pediu.

– É a verdade. Eu não posso fazer mais nada. Eu não posso nem ficar perto de você mais. Porque isso machuca. Você não faz ideia de como isso tudo está me machucando nesse exato momento. – O tom de voz dela estava bem elevado, era quase um grito. Ela estava depositando toda a sua frustração em cima dele.

Ela não queria que tudo terminasse desse jeito, mas já fazia um tempo que tinha acabo, só não queria admitir isso. Mas estava na hora de ela encarar isso e ir embora de uma vez por todas.

– Só me deixa ir, por favor – ela pediu e complementou em um sussurro. – Eu não posso mais fazer isso.

Ela olhava para baixo controlando-se para não deixar as lágrimas caírem. Ele soltou o braço dela, derrotado também. Ele sabia que tinha a machucado e isso o matava. Mas não existia mais nada que ele pudesse fazer, então preferiu deixá-la ser feliz e desistiu de tentar.

Ela olhou para ele pela última vez e o deixou ali parado e sozinho. A coisa mais difícil que ela tinha feito na vida foi deixa-lo. Mas não tinha outra opção. Do jeito que estavam nada mais ia dar certo ou ia para frente.

Era difícil saber qual dos dois estava mais machucado com tudo aquilo. A única coisa que sabiam era que a partir de agora não pertenciam um ao outro.

Flávia Tomaz
Enviado por Flávia Tomaz em 13/10/2015
Código do texto: T5413742
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