Tragicomédia Urbana

Para cada lágrima um sorriso! Melhor dizendo, para cada tragédia, uma comédia. Em um determinado bairro chamado Mangabas, havia um casal, seus nomes: Cecílio e Raimunda. Ele com 23 anos, tinha vindo do interior, era um rapaz esforçado, trabalhava de servente de pedreiro faziam 6 meses, antes, tinha trabalhado no maior supermercado da cidade, no caminhão de entregas, não era grande coisa, mas ele sentia falta dos passeios de conhecer a cidade, de visitar as casas, conhecer pessoas.

Numa dessas visitas conheceu Raimunda, que estava às vésperas de completar 39 anos de idade. Cecílio fez a entrega com outro rapaz, mas seu encontro com Raimunda ficou marcado por ele ter elogiado seu cabelo, recém-pintado de ruivo:

– Verdade que você gostou? Obrigada.

Teria terminado por aí, se eles não tivessem se encontrado em um show durante a feira agropecuária da cidade que aconteceu na mesma semana, ele esbarrou nela por acaso e nasceu o diálogo clássico, ele disse:

– Eu acho que te conheço!

– Sim, você fez uma entrega na minha casa. Respondeu ela, como uma mulher poderia esquecer a única pessoa que havia feito um elogio sincero a seu cabelo?

Daí surgiu o relacionamento dos dois, depois de um tempo passaram a morar juntos, não se chegaram a se casar no papel, dividiam o aluguel e a outras contas, levavam a vida típica de muitos casais brasileiros.

Certo dia, em uma noite de céu entreaberto com algumas nuvens de chuva, (a delegacia do distrito mantinha seu marasmo habitual), até que uma vizinha de Cecílio e Raimunda, liga desesperada dizendo que os mesmos estavam gritando muito e que parecia haver violência.

Dois policiais de plantão, foram designados para averiguarem a situação. Quando chegaram no local indicado, perceberam vários vizinhos na rua, era possível escutar os gritos na casa. Os policiais abriram o portão que não estava trancado e seguiram para a entrada da casa. Chegando à porta, viram os dois rolando pelo chão, ora Cecílio xingava e recebia um tapa em resposta, ora Raimunda xingava e tomava uma mordida, ou puxão de cabelo.

Prontamente os policiais interferiram para separar a briga, um deles segurou Raimunda, o outro tratou de segurar Cecílio. Cecílio porém era arisco, se soltou das mãos do policial e correu, não por muito tempo, pois deu alguns passos, tropeçou e caiu.

Os dois homens o alcançaram e com muita luta conseguiram contê-lo, ele esperneava como lagartixa no asfalto. Algemaram Cecílio, levaram-no para fora da casa e o colocaram na traseira da viatura, diante de uma plateia de vizinhos curiosos, alguns batiam palmas, outros assobiavam, uma vizinha gritou bem alto: “- Maria da Penha nele!”.

Pediram uma ambulância para levar Raimunda ao Pronto Socorro, ela havia levado uma mordida na mão, havia algumas marcas de contusão pelo corpo e seu joelho estava sangrando.

Chegando na delegacia, mantiveram Cecílio algemado a uma barra de ferro, deixaram-no aguardando até preencherem os formulários e finalizarem o boletim de ocorrência. Nesse meio tempo chegou à delegacia Raimunda, dizendo que aquilo era uma injustiça e que não poderiam prendê-lo, que queria que o soltassem, dentre outras coisas.

Algum tempo depois, chamaram Cecílio para assinar os papéis, ele pediu um copo d’água, dizia que estava exausto e com sede. O policial, em um gesto de grandeza, foi buscar “a tal da água”. Quando ele voltou: Onde estava Cecílio?! Ele havia soltado umas das mãos da algema e fugiu! O policial entrou em desespero! Como explicaria aquilo para os superiores?

Obviamente os policiais não poderiam deixar a questão inacabada, entraram na viatura, e vasculharam o bairro da delegacia, procurando em matas, terrenos baldios dentre outros, quando estavam a ponto de desistir, resolveram numa última tentativa voltar à cena do crime, voltar a casa de Cecílio.

Quando chegaram na casa do rapaz, batem no portão e eis que surge Cecílio na porta, roupa suja da fuga, meio rasgada, um olho roxo e alguns hematomas nos braços. Logo ele diz:

– Eu me rendo seu policial! Pode me levar! Estendendo as mãos, e com as algemas ainda penduradas em um dos seus braços.

Os policiais não perderam tempo, nenhum dos dois entendeu o que estava acontecendo, um deles olhou pra trás e perguntou para Cecílio:

– O que afinal de contas aconteceu? Quem te bateu?

– Não posso falar não. Disse Cecílio.

– Como assim? Sua situação está crítica rapaz! Você pode ficar preso por muitos anos. Então se você quiser ter uma chance, é bom desembuchar!

O rapaz abaixou a cabeça, parecia estar vermelho de vergonha, corado, tomou um fôlego e disse, meio que atravessado:

– Foi Raimunda!

– Raimunda? Sua esposa? Perguntou o policial.

– Ontem, ela chegou em casa e eu não tinha colocado o lixo pra fora, nem lavado a louça, nem passado cera no chão. Daí começou nossa briga; quando fugi da delegacia, e consegui chegar em casa ela já estava me esperando com um porrete na mão seu doutor! Aquela mulher é o cão, eu é que sei! Disse que eu passei muita vergonha nela e dessa vez eu não tive nem chance de reagir.

Os policiais entregaram Cecílio na delegacia e voltaram pra buscar Raimunda, a partir daí a história ficou mais discreta. Fato é que isso não os separou, continuam juntos até hoje, Cecílio ainda escuta desconhecidos contarem do caso do homem que apanhava da mulher e que fugiu da delegacia, enquanto o policial foi buscar água.

Fim.

Bruno Maia

brulao
Enviado por brulao em 28/02/2016
Código do texto: T5557684
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