A Contradição

Voltas ou retidão? Este talvez seja o inquirimento que ronda com algum acerbo o pensamento do pobre bisonho viajante. Já houve este risco cravado, que de maneira mais estéril serve de memória imprópria, que orna ao tronco da palmeira? Ou estou diante do fenômeno inexplicável e atemporal da coincidência, que faz-nos encontrar semelhanças aos mais diversos e moderados aspectos?

Mas, não tome por literal este exemplo acima. Falo estritamente de analogias feitas por nossa percepção. Poderia citar a impertinente, porém genuína garoa de São Paulo, com a inevitável, porém refrescante chuva pelo final de tarde em Santos.

A megalópole sanguínea que é esta capital, nada comiseradora, mas sempre atenta, com os românticos municípios interioranos, que imitam a presságios a sua idolatria pelo capital, mas nunca perdem os originais panoramas da boa cidade caipira.

Enfim, sendo incontáveis, infindas e inestimáveis as comparações entre os campos semelhantes que toda ciência nos possibilita tanto em divagação como racional discussão, logo surgirão os conflitos enésimos que nem sempre receberão respostas plenas.

Queria ter a periférica visão, que abrange ao largo horizonte e compreende as antípodas do céu; assim, a interpretação alheia me seria de mais fácil introdução, ao contrário de estar em frente ao próprio cotidiano e não poder julgá-lo, pois faço parte deste metabolismo social.

Hoje, deparo-me com a charge mais cômica e caótica da população; A definição mediana seria imprudência. De leve modo, poderia chamá-la de falta de conhecimento. Agressivamente é a hipocrisia que me nasce como título.

A primeira instituição, antes família, hoje é rua. A segunda, noutrora a educação, doravante é escola. A outra que sempre fora religião, o bom freio, temporariamente está cessada, pois a fé tornou-se superstição, e nisto nós não mais acreditamos.

Porquanto ainda estou perdido. Em cada história há fundo de verdade, mesmo afundo na magia fantasista, ou a franqueza apaga o brilho dos contos, pois ali tudo é invenção? O romantismo é a questão da boa aparência, ou este valor é simples e complexo demais para a atual geração?

Inevitavelmente mais dúvidas surgiram e surgirão. Desde que se nasça humano, a contradição é o limiar entre a sanidade e a loucura. Se, sou correto, estou errado por estar certo. Já, caso me achem normalizado demais, sou totalmente louco por manter o equilíbrio e rejeitar a extravagância.

Tantos serviços interessantes que me oferecem! Todos poupados aos valores, mas visionados em futuras recompensas, que pelo prazer dos lucros, são todos considerados como nobres aquisições, ainda que estejam sujas de lama.

Mais uma vez não me reconheço. Uma máscara inexpressiva mareada pela turbamulta de perfis monótonos. As linhas do tempo são apenas linho com que revestem o corpo. A conduta é questão de opinião, não havendo assim padronização para as leis da sociedade.

O que é certo, por assim ser, torna-se deslize e basta questionar o que foi conservado a rigor. O que é errado tem a chance de ser um acerto, pois todos temos os direitos humanos do equívoco redimível.

Estas benditas e intrigantes contradições humanas constroem sociedades inteiras e moldam a mente dentro dos parâmetros convencionais. Muitas voltas, como as do viajante dedicado, que encontra a cicatriz da palmeira e não sabe dizer se por lá já esteve ou se é mera coincidência.

Pobres maravilhas e ricas desgraças. Deleitosas dores e sacrificada felicidade. Pecado aos santos e perdão aos transgressores. Luzes à lua e escuridão ao sol. Crueldade à natureza e pureza ao cimento. Hoje é possível enxergar facilmente a beleza do mistério, antes os minuciosos descobriam os mistérios da beleza.

E aqui me surge uma questão, com um pequeno tempero de aflição. Neste momento em que as incoerências são modelos para a formação de personalidades, conseguiremos caminhar para o chamado futuro? Inquiro-me disto, pois o tempo também caminha em linha reta... E de uma vez que os contrassensos são inúteis voltas repetidas...

Evolução ou desenvolvimento? Crescimento ou grandiosidade? Humildade ou martírio? Presunção ou sabedoria? Fome ou glutonaria? Calor ou quentura? Frio ou tremor? Paradigma ou ideia? Teimosia ou longanimidade?

Caminharemos na lama e nos alardearemos pela limpeza de nossos pés, ou sofreremos pela sujeira, mas sempre com o sonho na polidez? E agora me pergunto: por que não alinhar o útil ao agradável?

Decerto é porque me é impossível imaginar que o A não tenha o B. E é credulidade pensar que os milagres da imaginação realmente possam combater as más influências. Mas é tão confortável pensar que Arcádia possa ser real!

Tal como sou, vou me levantar deste banco e rodear pela praça, talvez eu encontre as respostas para a retidão de um caminho dando voltas.

Vinícius Thadeu
Enviado por Vinícius Thadeu em 02/03/2016
Reeditado em 30/03/2016
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