O Homem Bomba e o Fim do Mundo

Um vento granulado e quente passava pelos espectadores horrorizados, carregado de partículas de cinzas. Já era hora de escurecer, mas o céu ainda possuía camadas degrade de vermelho e rosa, o que poderia ser uma bela visão era, em verdade, uma desgraça.

O vermelho do céu, apenas refletia seu luto vermelho-sangue, o mesmo que não foi derramado, mas completamente dissolvido em segundos. Praticamente não existiam mais paredes, também não existia mais natureza, só morte e solidão. No chão, mais cinzas, as mesmas que granulavam o ar e sufocavam os poucos sobreviventes, bombeiros e expectadores.

Uma boneca caída em meio ás cinzas com parte da cabeça queimada ilustrava as dezenas de mortes e, caído ao lado dela, um avatar preto e desfigurado que um dia foi uma linda e doce garotinha e que hoje, não passa de cinzas.

Alguns instantes antes, porém, a pequena Ayesha (13 anos) pulava e dançava com Zairah (5 dias), sua boneca recém-chegada na família, era sua primeira filha. Ayesha dizia que quando sua filha-boneca crescesse torna-se-ia médica, como ela, para que pudesse ajudar muitas pessoas.

A mãe de Ayesha, Khadija (35 anos), era enfermeira e naquela fatídica manhã levou suas as duas bonecas (Ayesha e Zairah) ao parque, era seu dia de folga.

Naquela mesma tarde, Romeo (22 anos), decidira servir aos seus propósitos obscuros e explodir uma parte da cidade. Na realidade, ele não pensava na morte de outras pessoas com o final da vida, mas como uma oferenda a sua marca maior.

Pobre Romeo, pobre de espírito, levou consigo diversas vidas, dizimou sonhos, acabou com esperanças, não só aquelas que estavam a caminho do parque, mas, também, aquelas que esperavam em casa.

Uma delas era é Dahab (37 anos), que após 5 anos no exército retornou e aguardava sua amada na porta de casa. A amada chamava-se Nadia (25 anos), ela estava logo à frente de Khadija, Ayesha e Zairah, observava mãe e filha, desejando sentir aquela felicidade um dia.

Todos os dias, Nadia passeava no parque antes de ir ao trabalho, eram seus 20 minutos de paz. Sentava-se no mesmo banco e observava as crianças brincando, o farfalhar das arvores, a grama verde enquanto sentia a doce brisa leve e pura que aquele pedaço de éden proporcionava àqueles que dispunham de parte de seu dia para estar ali.

Após o incidente não restou muito da bela Nadia, que guardava no bolso um retrato de Dahab e no coração muitas saudades.

Agora, porém, o verde tornou-se preto e onde se compartilhava alegrias, compartilha-se luto. Luto pela perda da vida, pelo desrespeito, inclusive. Tantos ali tinham tanto futuro, tanta coisa pela frente, inclusive Romeo.

Aos 15 anos Romeo foi medalhista em uma olimpíada de matemática, aos 17 terminou o colégio com honras e, após isso, iniciou a faculdade em uma das melhores universidades da região. Quanto futuro, quanta vida. Contudo, algumas amizades o fizeram acreditar que o futuro era transcendente e que ele tinha que se sacrificar para alcançá-lo.

Pobre Romeo, pobre de espírito. Pobre Julieta (75 anos), sua avó, que após a morte de sua filha, mãe solteira, como Khadija, cuidou de seu tesouro, de sua vida, Romeo, seu pequeno neto e filho. Orgulhou-se com suas conquistas, chorou a cada uma e enfartou em sua poltrona quando assistiu a uma reportagem sobre um cruel homem-bomba que acabou com a vida em parte da cidade: um suicida chamado Romeo.

Marcelo Marques Júnior
Enviado por Marcelo Marques Júnior em 26/06/2016
Código do texto: T5679085
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