Sempre a espera do silêncio.
Caminhava, caminhava...
ofegante, pois já fazia algum tempo.
Nas ruas, as luzes falhas dos postes públicos
refletiam nas águas fétidas dos esgotos.
No sentido contrário, vinha em sua direção
um bêbado, com seu andar bailante,
murmurando palavras com a convicção da embriaguez.
- Bo... boa noite!
Cumprimentou o bêbado educadamente.
- Opa!
Respondeu ao bailarino das ruas.
De longe se escutava o toar fervoroso dos fiéis
em uma pequena igrejinha daquele bairro,
era final de culto. Um som Familiar.
Continuou. As mãos se aqueciam nos bolsos de seu moletom
cinza. A cabeça sempre baixa, andava concentrado,
olhando fixamente o compasso de seu 'all star' vermelho, era
um ponto de concentração. Um mantra se fazia pelas
constantes passadas, quebrando o silêncio das nove e meia
daquela segunda feira chuvosa. Concentrava-se em manter
a mente vazia. Chega de pensar por hoje.
- Será que é possível? (sorrio contidamente com um breve suspiro pelo nariz.)
Como era tranquilizante aquele momento, não havia
as constantes vozes do cotidiano.
-Que Saco!
Exclamou num tom de desapontamento. Mais um suspiro.
Lembrou do deprimente roteiro daquele dia:
O tagarelar das pessoas no trabalho, a professora
comunista de voz fina e irritante, o ciúme descomunal
da namorada, as noticias de homicídios e assassinatos
no telejornal...
"(...) O jogador renovou hoje seu contrato milionário com
o grande clube europeu."
- Esse nunca leu um livro.
Pensou.
(...)
Silêncio, como é bom o silêncio.
Amava o alívio do fim do dia, o fim da rotina.
Fazia daquela caminhada noturna seu momento
de... apenas seu momento, ja que não o tivera durante
o enfadante dia.
- Amanhã tem mais.
Pensou.
Ansioso pelo próximo silêncio.