Por onde andará o Wallace???

Prestava ajuda como voluntária em uma escola estadual, na qual eu conversava com os pais o significado da APM escolar e para que servia.

Eu participava ativamente das festas, sempre com intuito de arrecadação para pequenas reformas e melhorias na escola que eram sempre mostradas a todos. Certo dia, entrei na sala da diretora e me deparei com um menino negro, do qual só se via ressaltado o branco dos olhos e o suor que brilhava em sua testa.

Ele tinha uns 10 anos mais ou menos e um medo penetrante nos olhos. Eu sem saber o motivo dele estar lá, óbvio que estar na diretoria naquela situação, teria que ser por algum grave motivo, tive uma luz imediata em dizer para a diretora que era uma emergência e que precisava falar com ela em particular.

A diretora saiu longe da sala e eu perguntei o que estava acontecendo. Ela disse que ele era um péssimo aluno, brigava e agredia os colegas e ela tomou a decisão de suspendê-lo, até a vinda de sua mãe na escola. Como ela nunca apareceu, ele ficaria afastado por um bom tempo dando sossego a todos.

Pedi para falar com ele e fiquei muito penalizada quando ele me disse que os meninos o chamavam de macaco e andavam igual a um em volta dele para todos rirem e debocharem...

Pedi à diretora que me desse uma chance em ajudá-lo a superar isso e ela muito a contra gosto permitiu.

Naquele dia, levei o Wallace para casa em meu carro e descobri que sua precária moradia era uma fábrica antiga e abandonada no qual umas vinte famílias se agruparam. Sua mãe tinha mais 5 filhos e aquela pobreza desleixada sem nenhuma luz no fim do túnel,mas senti que ela amava os filhos...

Conversei com os dois, mãe e filho e prometi ajudá-los. Comecei comprando camisetas do uniforme com o emblema da escola, mochila, material escolar, tênis novo, abrigo de inverno e marquei de buscá-lo no sábado para irmos ao McDonalds. Disse a ele que poderia levar os dois irmãos maiores, com 5 e 7 anos, pois os muito pequenos não dava para levar.

Nunca mais esqueci o olhar de felicidade daquelas crianças dentro da lanchonete. Depois fizemos um passeio pelo Museu do Ipiranga e a tarde ao levá-los de volta um deles me perguntou:

- Tia o que você é do meu irmão?

E eu disse:

- MADRINHA!

E assim, apadrinhei aquele menino sofrido, indo uma vez por semana buscá-lo na escola e levá-lo de carro em casa. E isto, era a glória para ele, e todos os irmãos...

Fazia compras de guloseimas em um atacadista, e deixava ele e as caixas em frente a sua moradia, vendo brilhar um olhar de orgulho naqueles olhos tão tristes.

Na Páscoa, montei uma cesta cheia de ovos, com um bem grande no meio, fiz um lindo embrulho de celofane com um laço de fita enorme e assim fui, pedindo licença, entrei na classe e dei a ele dizendo: “Você merece!”. Todos ficaram maravilhados e eu novamente me apresentei: “Sou a madrinha dele!”.

Ele passou naquele ano. E no ano seguinte, continuei meu acompanhamento escolar e a minha ajuda. Chegou a semana do Natal, eu fui cheia de presentes e surpresas visitá-lo, mas recuei sem acreditar no que via... só escombros... Derrubaram o prédio e nenhum vizinho me informou mais nada.

No ano seguinte, fui para outro lugar e não voltei mais naquela escola. Pensava sempre... por onde anda o Wallace? A vida continuou e alguns anos depois, minha filha encontrou no supermercado uma funcionária da escola que a reconheceu e disse: “Fale para sua mãe que o Wallace esteve na escola apenas para mandar dizer a ela que eles conseguiram uma moradia na comunidade de Guarulhos, que ele estava trabalhando em um buffet de festa infantil, junto com sua irmã mais velha e que a mãe dele trabalhava no mesmo lugar de faxineira.

Ele queria muito que eu soubesse disso...

Fiquei muito tempo extasiada com esta tão linda notícia. Para mim, foi uma felicidade interior tão grande que muitas vezes ria sozinha quando lembrava...

De vez em quando eu ainda me pergunto: Por onde andará o Wallace?

Walquiria
Enviado por Walquiria em 03/10/2016
Código do texto: T5779866
Classificação de conteúdo: seguro