Pródigo

Leonel era pastor há 12 anos em uma igreja protestante de Porto Alegre com matriz em Maryland, EUA. Seu irmão caçula Erik há muito tempo deixara a família para viver em São Paulo e de lá construíra sua carreira como executivo de sucesso, tendo morado alguns períodos em New York, Paris, Quebec, Tokyo, Londres, Barcelona, Berlim e Roma. Enquanto Leonel se realizara como professor universitário de Filosofia e formara uma família com duas filhas, Erik permanecera solteiro, sem raízes, sem laços afetivos que o prendessem à qualquer lugar ou pessoa.

Erik considerava-se uma espécie de agnóstico ao acreditar que haviam coisas que de fato eram inexplicáveis, mas nem por isso tendo necessidade de crer em alguma divindade. Leonel orava todos os dias, mantinha as escrituras sagradas sempre perto de si e tentava orientar os jovens da comunidade nos caminhos da fé.

Leonel vivia com sua família de modo confortável, uma vida de classe média, buscando agradecer sempre ao seu Deus por todas as boas coisas de sua vida. Erik ganhava muito dinheiro como CEO de várias multinacionais, além de ter várias aplicações financeiras rentáveis. Por isso o porsche na garagem e a cobertura num dos mais valorizados edifícios da Avenida Paulista.

Há 10 anos Leonel e Erik não se falavam. Leonel tentara manter contato após a morte do pai e partida do irmão, mas este jamais dera notícias durante todo aquele tempo. Mesmo assim, Leonel acendia uma vela na janela todas as noites, orando para que a luz de Deus guiasse seu irmão de volta para casa, para sua família. Nunca deixara de amar o menino que crescera com ele.

Uma noite, Leonel acordou inquieto, eram 2h da madrugada e havia um sufocamento em seu peito. Demorou muito até que sua esposa o acalmasse e voltasse a adormecer em seus braços orando baixinho. Nessa mesma noite Erik sofrera um terrível acidente de carro, joelho estilhaçado, traumatismo craniano, coma induzido. Nenhum médico conseguira explicar sua sobrevivência e ainda sua recuperação.

E naquela noite, a mesma noite do aniversário de morte de seu pai, quando Leonel fazia uma pregação sobre vida, morte e redenção, de repente a voz lhe sumiu e sua vista turvou-se com a imagem de Erik, de bengala, de pé no átrio da igreja. Frente à frente, dois irmãos, dois desconhecidos, dois homens com sangue do mesmo sangue correndo nas veias. Leonel sorriu, caminhou até o caçula e o abraçou. Depois disso, nada mais precisou ser dito por nenhum dos dois, apenas a abertura da comporta de lágrimas e a união há muito esquecida retornara com muita força. O filho pródigo voltara à casa. O porvir? Esse seria escrito agora com destinos reencontrados.