BEGE-PASTEL (PARTE 1)

Uma tarde de verão, em que bastava a própria respiração para tornar o ambiente mais sufocante do que já era. Na casa, de parede em tom bege pastel, morava uma senhorinha com seus 70 e poucos anos, sozinha, a não ser pela companhia de seu gato já velho também.

Os dias eram repetitivos e pareciam estar programados a não fugir do cotidiano, parecia uma novela que reprisava diariamente ao mesmo horário: A senhora acordava, fazia suas preces - estas não podiam ser esquecidas -, fazia sua higienização breve e, sem muita vaidade, no banheiro de seu quarto, alimentava-se e alimentava seu gato que parecia já estar acostumado a tudo aquilo. Essa era a rotina das primeiras horas do dia.

Logo, no permeio da manhã, colocava um avental e seu chapéu de jardinagem e ia ao jardim, cercado com grades de um metal pintadas de preto. Cuidava com muito afinco das plantas daquele jardim, conhecia cada uma delas e entendia suas necessidades; era como cuidar de filhos; talvez ela quisesse que parecesse. O gato a acompanhava até onde sua disposição permitia, quando cansava, deitava em um lugar de sombra e seguia acompanhando-a apenas com os olhos de um azul penetrante, que parecia ficar ainda mais azul no meio do preto de seu pelo.

Aquele dia estava especialmente quente, e a senhora, que já não era mais uma moça disposta a tomar sol num dia de verão, decide entrar e buscar descanso e refresco. Ao entrar na casa, que apesar de estar iluminada pela luz que vinha das janelas e frestas, notou algo diferente do que estava acostumada a ver, tudo parecia ter se tornado mais colorido: As paredes, antes de cor bege, ganharam uma nova coloração de azul tão vivo quanto os olhos de seu gato. No primeiro momento não notara nada além da vivacidade daquelas cores, mas, além disso, os móveis pareciam mais novos que os seus. A casa estava no auge de sua construção, estava recém-feita.

A senhora, deslumbrada com tudo aquilo e ao mesmo tempo assustada, não sabe se continua andando e descobre o que está acontecendo, ou sai e pede ajuda; ela opta pelo primeiro, pois sente que não tem mais nada a perder na vida. E, além do mais, o gato está acompanhando-a, ela se sente mais segura em sua companhia.

Segue pelo corredor, olha mais perto as paredes e percebe que os quadros com fotos de seus familiares já ausentes não estão mais na parede. Mas decide continuar a, até então, visita aquele lugar novo e tão familiar. O corredor, que leva da sala à cozinha, é percorrido pela senhorinha que está disposta a entender o que se passa. Chegando à cozinha, o gato, que antes a seguia, corre por entre suas pernas e sobe na mesa. Ela vê que a cozinha está também diferente: as paredes pintadas de amarelo, os móveis e eletrodomésticos estão mais novos, tudo parece ter voltado no tempo de alguma forma; um tempo que apesar de não lembrar, ela conhecia.

Ela decide beber algo para se acalmar. Procura nos novos armários seu chá de camomila, mas não consegue encontrá-lo em meio a tantas embalagens de produtos que não conhece. Decide que vai beber água da torneira, pega um copo que encontra sobre um canto da pia e enche-o sem muita dificuldade. Puxa uma cadeira e senta-se, observando seu animal deitado sobre a mesa sem parecer estranhar a situação. A cada gole, um alívio, uma dose da calma.

Parecia estar mais calma, mas ainda pensativa. Acariciava o gato que ronronava a cada toque da senhora. Tudo parecia tão perturbador para ela: como aquilo era possível? Estavam pregando-a uma peça? Alguém toca a campainha. O silêncio e os pensamentos são interrompidos com um susto. A senhora se levanta abruptamente e segue em direção à porta. Quem poderia ser? Alguém para revelar que tipo de mágica ou brincadeira era aquela?

CONTINUA...

Domero
Enviado por Domero em 19/11/2016
Reeditado em 19/11/2016
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