Cotidiano

(19/09/2014)

Que dia mais preguiçoso. O sono toma conta de mim, mas não posso sequer piscar para não correr o risco de dormir novamente. A chuva batendo na janela é um convite pra me aconchegar nas cobertas, mas preciso levantar. O dever me chama.

Me arrasto para debaixo do chuveiro. As gotas frias caindo em minhas costas parecem agulhas me perfurando. Preciso despertar.

Me seco rapidamente e me troco na mesma velocidade. O sol aparece pra me lembrar de que o mundo não para e também não posso ficar parada.

Pego o ônibus cheio para um terminal onde vou pegar outro ainda mais cheio.

Chego ao trabalho em cima da hora, mas consigo bater o ponto no horário certo. Vou em busca de café e tento me espremer entre as pessoas na copa, mas minha tentativa é frustrada pelo enorme volume de gente. Me lembram urubus cercando a carniça, conversando animadamente. Não consigo imaginar de onde tiram tanto assunto e fôlego para falar logo de manhã cedo. Quando o bando se dispersa, consigo chegar onde queria. A recompensa não compensa. O pão, do dia anterior, está seco e duro. A margarina, que não passa de uma gordura vegetal ensebada, já acabou. Na garrafa só ficou uma borra de café frio com bastante pó. Pego mesmo assim, pois preciso de energia para começar o dia.

Vou pra sala e organizo meus papéis enquanto um computador ultrapassado é ligado. Preparo meu psicológico para enfrentar mais um dia chato e cansativo, na mesmice do trabalho repetitivo. A vontade que tenho é de abaixar a cabeça e descansar mais um pouco. Enquanto vislumbro essa ideia, a pilha de papéis cresce ao meu lado. Não posso mais perder tempo. Preciso começar esse trabalho infinito.

Coloco meus fones de ouvido e ponho um velho rock inglês pra tocar. É minha salvação pois é o que me desperta desse pesadelo. Estou rodeada de pessoas vazias e fúteis que só olham pro próprio umbigo e não fecham a boca um minuto, e me sinto só. Como já disse Cazuza "tô cansado de tanta babaquice, tanta caretice. Dessa eterna falta do que falar". Porém, nesse caso, a solidão é reconfortante.

As horas custam a passar. Finalmente chega o meio do dia para repor a energia gasta. Olho a comida de relance e deixo para lá porque está intragável. Vou comer qualquer besteira na rua e aproveitar pra esticar as pernas após tantas horas sem movimento. Mal consigo respirar o ar poluído, já tenho que voltar ao trabalho maçante que se acumula.

Recoloco meu rock para suportar toda a chatice. As horas se arrastam mais do que pela manhã. Após um tempo que pareceu infinito, bate o sinal indicando que já posso me libertar. É hora de ir para casa. Pego meus dois ônibus cheios e quentes que sempre ficam retidos em intermináveis engarrafamentos. Depois de muitos empurrões, pisadas nos pés e sacudidas, chego em casa. Entro no desespero por um banho quente para relaxar. Deixo a tensão descer pelo ralo junto com a sujeira. Me seco e coloco roupas confortáveis. Troco a comida e água dos gatos enquanto espero o café ficar pronto. Ligo a TV e está começando uma comédia qualquer. Rio um pouco e lá pelas tantas percebo que cochilei no sofá. Desligo a TV que agora não passa de uma tela azul e vou pra cama. Apago no mesmo instante em que me deito. Acordo num sobressalto com o despertador tocando. Estava sonhando com meu amor. Olho triste pra cama quando não te vejo ao meu lado.

Me levanto e me preparo para mais um dia vazio e igual a todos os anteriores.

Lupt
Enviado por Lupt em 28/01/2017
Código do texto: T5895117
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