Triângulo equilátero amoroso

A amiga

"Aquele sujeito não tira os olhos de você", segredou na primeira semana. Na semana seguinte, sem esconder certa perturbação, disse: "Você não tira os olhos desse sujeito".

Na praça

"Os negros devem ser pontuais por questão de sobrevivência. Se um negro não for pontual, poderá ser confundido com um bandido e levar um tiro ou ser preso enquanto corre para recuperar o atraso. O problema é que quase sempre são os brancos que escolhem os horários; essa é a principal razão dos negros estarem sempre atrasados".

Ela deu um sorriso terno.

"Você é engraçado", disse a ele, apertando-lhe as mãos.

"Isso não é engraçado".

"Adorei me encontrar com você", ela concluiu.

"Eu também adorei me encontrar com você", ele concordou.

No dia anterior

Estavam agora na escada. O vestido de seda preto farfalhava a sua frente. A silhueta esbelta visível devido ao brilho travesso do sol através do tecido transparente.

Ao findar daquele dia

Conversavam e riam e a proximidade física entre eles era tão grande que ele parecia quase enfiar o rosto em seus seios.

Na semana seguinte

"Safado! Está tentando me comer?", Helena perguntou ao antigo zelador do condomínio onde morava. Edmundo a abraçara por trás depois de uma aproximação lenta e silenciosa, esticando os longos dedos das mãos para aconchegar os seios ao mesmo tempo em que prensava a cintura na grande bunda branca da polonesa. Beijou-a no cangote, perto da orelha esquerda, o seu ouvido sensível. Soprou nele e ela estremeceu, uma reação que não passaria despercebida pelo rapaz atento aos sinais mais discretos de fraqueza e que julgava serem universais. Convencido de que poderia ir mais longe, abraçou-a com um pouco mais de força, sufocando-a, beijando-a. Desorientada, Helena não reagiu; deixou por conta do silêncio, do momento e da consciência do rapaz. "É ele quem faz, não eu", pensou. Sob os dedos de Edmundo, o coração frágil parecia saltitar, como seus pés faziam nas aulas de sapateado nas terças e quintas.

Por três anos imaginou-se sentada em seu colo, como uma perfeita amazona cavalgando o seu Puro-sangue inglês versão tupiniquim; com os seios ardentes, a vagina chamuscada por uma chama do inferno. Ou mesmo embaixo, pois não fazia questão de por onde começar ou terminar: com a face afundada no colchão, imobilizada pelo seu corpo imenso de homem, revirando-se depois de deixá-lo arrastá-la facilmente pelas pernas, como uma boneca de criança. Por certo, em algum momento ele afastaria os seus joelhos e tocaria a língua úmida em sua boceta, que se abriria como uma rosa pulsante em meio ao jardim oculto chamado Teu Corpo. Agora, passados cinco dias do último contato, pesava-lhe sobre os ombros o dever de pecar, de consumar o desejo caduco e enfim gozar da possibilidade que a vida inesperadamente lhe restituíra.

Como era difícil decidir-se!

Achou que fosse desmaiar, mas firmou as pernas e manteve o corpo ereto o máximo que pôde. Edmundo venerava as suas carnes como se fossem as carnes de um deus.

"Eu adoraria te foder por três dias inteiros, sem parar um minuto", disse ele, que não mais se mostrava tão discreto quanto outrora.

Ela o compreendia perfeitamente. Seus olhos eram confidentes de longa data, desde o primeiro momento comunicavam segredos como se o fizessem a uma padre. Ela voltou-se e beijou-o. Disse num suspiro sofrido:

"Ninguém irá chegar, eu garanto!".

Referia-se sobretudo ao marido, Márcio, mas não citou o nome por questão de respeito, como se ambos os amantes tivessem sido transportados para um mundo paralelo, onde apenas eles existissem. Perguntava-se em seu coração: "Que pecado há em uma mulher que fora fiel e irrepreensível por tantos anos querer ser feliz por um dia?" Quantas vezes Márcio não havia sido "feliz" sem ela e sem o seu devido consentimento enquanto ela, a pobre e jovem Helena, em agonia, censurava o próprio pensamento? Não lhe pagava o mal que fizera, mas equilibrava a balança.

Olharam-se e ela enrubesceu. Com as narinas dilatadas, sugeriu:

"Se quer me foder, me foda com força, para eu não me arrepender depois".

Ele riu-se e beijou-a. Ela baixava as mãos e lhe retirava o cinto.

Três dias depois, ao telefone

- Oi.

- Oi.

- Como anda a sua consciência?

- Eu estou feliz. E você?

- Eu também.

- Mas eu não deveria estar. E infelizmente estou muito, muito feliz.

- Sim. Infelizmente não é possível ficar triste por estar feliz.

- Sou uma psicopata.

- Minha mão tem dupla personalidade. As vezes pensa que é uma mão, as vezes pensa que é uma vagina; a sua vagina.

- Você é meu deus e eu lhe devo favores sexuais; favores sexuais que terei muito prazer em pagar, com juros abusivos.

Novamente a amiga

"Sua roupa está toda amassada!" , exclamou Ana, com quem fazia as aulas de sapateado, durante uma visita. "Advinha quem amassou!", Helena sugeriu com empolgação. E, sem sombra de arrependimento, acrescentaria mais tarde: "Se hoje você pede autorização ao seu marido para chupar o pau de outro homem, amanhã precisará de autorização para chupar sorvete."

Após ler uma revista, Ana tirou os óculos, espremeu os olhos e recolheu os pés de cima do sofá. Respirou fundo e tentou reorganizar os pensamentos:

"Certa vez conheci um sujeito que tinha um ciúme doentio da namorada. Ninguém verdadeiramente sensato se aproximava dela nem mesmo para apertar-lhe a mão. O problema se deu quando apareceu um gringo com uma paixão doentia por ela que, por sua vez, tinha uma fixação doentia por homens estrangeiros. Conclusão: o namorado descobriu tudo, matou os dois e deu um tiro na própria cabeça. Ciúme doentio, paixão doentia, fixação doentia... Percebeu o histórico? Ligue a TV. Por que há tantas tragédias e tantas pessoas doentes hoje em dia?"

"Quer dizer que ele nutre uma paixão doentia por mim?"

"Por que não? Parece-lhe possível? O que acha?"

Helena correu o dedo indicador pela sobrancelha. Não sabia o que responder.

"Que tragédia sermos como Romeu e Julieta. Mas é tão romântico!"

Os garotos do bairro

Flagraram os dois amantes andando discretamente pelas ruas, próximos à ponte.

"As mulheres passaram a usar minissaias e shorts na modernidade, o que define a bunda como uma arte moderna ambulante".

"O marido dela é um corno, mas não sabe que os passarinhos lhe fazem ninhos na cabeça".

"Este ai é sortudo, mas não sabe que vez ou outra os homens casados precisam pentear os cabelos".

"Será que ele já comeu o cu dela? Cara, eu gozaria em dois minutos!"

Gabriel coçou a cabeça e, não querendo reconhecer a ignorância sobre o caso, disse: "Ao contrário do que se dá no homem, todos os orifícios da mulher são interligados. Primeiro você deve agradar o ouvido para chegar à boca, depois agrada a boceta e escorrega para o cu. É como fazer baldeação. Como eu disse certa vez, jamais peçam para uma garota chupar o pau de vocês antes de convencê-la a fumar os seus cigarros".

"E a nova vida como babá, Rose?"

"Cuidar de criança é como cuidar de adultos suicidas. A cada cinco minutos, você precisa impedi-la de dar fim a própria vida".

"Hoje em dia os pais não precisam mais ter aquela 'conversa constrangedora' com os filhos. Basta pedir para entrarem no Google com a palavra 'sexo' e torcer para não caírem em um site evangélico".

"Tem uma bala? Obrigada. Sai correndo de casa. Homens veneram bundas que peidam e cagam, mas não perdoam uma boca com hálito de cebola. Mesmo lábios vermelhos como maçãs".

"Você é bonita, mas não chega nem aos pés dela".

"Eu não preciso chegar aos pés dela, não, querido. Não sou engraxate".

"Além do mais, ela é refinada, elegante. Não deve ter mau gosto musical, como você, que gosta de funk".

"Funk é putaria coletivizada, não é a qualidade do som. Nem sempre o cara que você leva para casa e que fica contando vantagens no seu ouvido enquanto vocês trepam tem a voz do Jim Morrison".

"Seu eu tivesse dezessete anos! Poderia fingir ter vinte e três! Ainda não seria bom o bastante, mas ao menos poderia olhar para ela como um homem feito e, quem sabe, tentar trocar algumas palavras".

"Quais palavras?"

"Como está uma tarde linda, não acha, senhorita?"

"E se estivesse chovendo, ela diria: 'tarde linda? Está caindo o mundo!'"

"Certamente diria outra coisa se estivesse chovendo!"

"O quê? 'Como está uma chuva linda, não acha, senhorita?'"

Leonardo irritou-se. Pensou em dar uns bons cascudos no pequeno, mas acabou sendo interrompido.

"Ela vai atravessar a ponte!"

Dado o aviso, todos os garotos abandonaram as bolinhas de gude e se puseram a correr em direção à velha construção. Rose fora a única a não arredar o pé do campinho.

Leonardo se agachara num canto, olhando para cima. Uma nuvem ameaçava cobrir o sol.

"Que rabo gostoso da porra!", pensou, lembrando-se das milhares de vezes que olhava para cima a procura de migalhas visuais, uma aparição breve e repentina de sua calcinha. "Certamente branca", ele dizia. Mas eram vermelhas nas duas vezes que pôde ver mais claramente.

"Amarela!"

[fim da primeira parte]

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