Uma Natureza Enigmática

Uma Natureza Enigmática

De Anton Chekhov.

Tradução de língua russa para língua inglesa.

De Constance Garnett.

De https://ebooks.adelaide.edu.au/c/chekhov/anton/horse-stealers/chapter19.html .

Tradução de língua inglesa para língua portuguesa do Brasil.

De Herculano de Lima Einloft Neto.

Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2017.

No assento de veludo vermelho de uma carruagem de estrada de ferro de primeira classe uma dama bonita senta meio reclinando. Um leque fofo caro treme em seus dedos justamente fechados, um pince-nez se mantém caindo fora de seu nariz pequeno bonito, o broche ofega e cai sobre seu peito, como um barco no oceano. Ela está grandemente agitada.

No assento oposto senta o Secretário Provincial de Comissões Especiais, um autor jovem ficando famoso, que de tempo a tempo publica histórias longas de vida alta, ou "Novelli" como ele as chama, no jornal principal da província. Ele está olhando fixamente para a face dela, olhando fixamente atentamente, com os olhos de um conhecedor[1]. Ele está observando, estudando, pegando toda sombra dessa natureza enigmática, excepcional. Ele a entende, ele a sonda. Sua alma, sua psicologia toda jaz aberta diante dele.

"Oh, eu entendo, eu entendo você até suas profundezas mais internas!" diz o Secretário de Comissões Especiais, beijando a mão dela perto do bracelete. "Sua alma responsiva, sensitiva está procurando escapar do labirinto de ---- Sim, a luta é terrível, titânica. Mas não perca ânimo, você irá ser triunfante! Sim!"

"Escreva sobre mim, Voldemar!" diz a dama bonita, com um sorriso triste. "Minha vida tem sido tão cheia, tão variada, tão enxadrezada. Acima de tudo, eu sou infeliz. Eu sou uma alma sofredora em alguma página de Dostoievski. Revele minha alma para o mundo, Voldemar. Revele essa alma infeliz. Você é um psicologista. Nós não temos estado no trem uma hora juntos, e você já tem sondado meu coração."

"Me diga! Eu lhe peço, me diga!"

"Ouça. Meu pai era um pobre escrevente no Serviço. Ele tinha um coração bom e não era sem inteligência; mas o espírito do tempo -- do seu meio -- 'vous comprenez?' -- Eu não culpo meu pobre pai. Ele bebia, jogava, aceitava subornos. Minha mãe -- mas por que dizer mais? Pobreza, a luta por pão diário, a consciência de insignificância -- ah, não me force a a recordar! Eu tinha de fazer meu caminho próprio. Você conhece a educação monstruosa em um internato, leitura de romances tola, os erros de juventude inicial, a primeira agitação tímida de amor. Era terrível! A vacilação! E as agonias de perder fé em vida, em um si mesmo! Ah, você é um autor. Você nos conhece, mulheres. Você irá entender. Infelizmente eu tenho uma natureza intensa. Eu procurava por felicidade -- e que felicidade! Eu desejava fazer minha alma livre. Sim. Nisso eu via minha felicidade!"

"Criatura extraordinária!" murmurou o autor, beijando a mão dela perto do bracelete. "Não é você que eu estou beijando, mas o sofrimento de humanidade. Você se lembra de Raskolnikov e o beijo dele?"

"Oh, Voldemar, eu desejava glória, renome, sucesso como toda -- por que afetar modéstia -- toda natureza acima do comum. Eu desejava vivamente alguma coisa extraordinária, acima do lote comum de mulher! E então -- e então -- cruzou meu caminho -- um general velho -- muito rico. Me entenda, Voldemar! Foi auto-sacrifício, renúncia! Você precisa ver isso! Eu não podia fazer nenhuma outra coisa. Eu restaurei as fortunas de família, era capaz de viajar, de fazer o bem. Contudo como eu sofria, quão revoltantes, quão repugnantes para mim eram seus abraços -- embora eu irei ser justa a ele -- ele tinha lutado nobremente em seu tempo. Houve momentos -- momentos terríveis -- mas eu era mantida acima pelo pensamento de que de dia para dia o velho homem poderia morrer, que então eu iria começar a viver como eu gostava, a me dar a mim mesma para o homem que eu adoro -- ser feliz. Existe um tal homem, Voldemar, de fato existe!"

A dama bonita agita seu leque mais violentamente. Sua face toma uma expressão lacrimosa. Ela continua:

"Mas finalmente o velho homem morreu. Ele me deixou alguma coisa. Eu estava livre como um pássaro do ar. Agora é o momento para eu ser feliz, não é, Voldemar? Felicidade vem batendo de leve em minha janela, eu tinha somente de a deixar entrar-mas -- Voldemar, ouça, eu lhe imploro! Agora é o tempo para eu me dar para o homem que eu amo, para me tornar a parceira da vida dele, para ajudar, para sustentar os ideais dele, para ser feliz -- para encontrar descanso -- mas -- quão ignóbil, repulsiva, e insensível toda nossa vida é! Quão ruim tudo é, Voldemar. Eu sou desditosa, desditosa, desditosa! Novamente há um obstáculo em meu caminho! Novamente eu sinto que minha felicidade está longe, longe distante! Ah, que angústia! -- se apenas você soubesse que angústia!"

"Mas o que -- o que fica em seu caminho? Eu lhe imploro que me diga! O que é?"

"Outro general velho, muito rico ----"

O leque quebrado oculta a face pequena bonita. O autor sustenta em seu punho sua testa pesada de pensamento e pondera com o ar de um mestre em psicologia. O motor está assobiando e sibilando enquanto as cortinas de janela se ruborizam vermelhas com o brilho do sol poente.

Cf. Houaiss, Avery, Dicionário Barsa.

Cf. Dicionário Houaiss da língua portuguesa.

Cf. http://michaelis.uol.com.br/moderno-ingles/ .

Cf. http://www.wordreference.com/enpt/ , Dicionário Inglês-Português (Brasil).

Notas de Tradução:

[1] connoisseur, conhecedor, em francês no original.

Anton Chekhov; tradução de língua russa para língua inglesa de Constance Garnett; tradução de língua inglesa para língua portuguesa do Brasil de Herculano de Lima Einloft Neto
Enviado por Herculano de Lima Einloft Neto em 20/04/2017
Reeditado em 24/04/2017
Código do texto: T5976071
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