AS QUATRO AMIGAS

A gente formava uma turma de quatro amigas: eu, a Fernanda, a Sabrina e a Cátia. A faixa etária era de uns quinze anos e estudávamos juntas desde a 5ª série. Éramos muito unidas. Nós sabíamos tudo – ou se pensava que sabia – uma da vida da outra. Era uma amizade muito legal e é claro que nem nos finais de semana a gente se desgrudava. Como a Sabrina era mais rica e tinha um quarto lindo só para ela, era normal que nós passássemos os finais de semana lá. A gente virava a noite conversando, fofocando das outras garotas, contando nossos namoricos. Era tudo tão inocente... Como eu podia ser tão bobinha?

Um dia a Fernanda nos contou que estava gostando de um menino da outra classe. Ficamos alvoroçadas. Não pensamos que fosse algo sério. O Giba era um garoto bonito, legal, todas as gurias eram afim dele, inclusive eu. Só que quando a Fernanda contou que o achava interessante, fiquei bem quietinha. Não quis abalar a nossa amizade por causa de um garoto. Afinal, minha amizade com a Fernanda era mais importante. E depois, ele mal me olhava mesmo. E, secretamente, torci para que o Giba jamais reparasse na minha linda amiga.

Um dia a turma se reuniu na casa da Sabrina, como sempre. Era um sábado muito bonito, de sol e calor. A gente tinha combinado de ir em uma sorveteria e só estávamos esperando a Nanda chegar. Ela estava demorando demais e aquilo não era normal. Foi aí que chegou o irmão da Sabrina e contou que tinha visto a Fernanda e o Giba namorando na praça. Tomamos um choque. Eu fiquei mais chateada ainda, porque tinha uma leve esperança de que um dia o Giba ficasse comigo. Mas não. Ele se rendeu aos encantos da Fernanda.

Dali para frente nossa turma ficou meio desestruturada. Era tão estranho... a gente se reunia, só nós três e o assunto era sempre a Fernanda, que tinha nos abandonado para só se dedicar ao Giba. E o pior de tudo, é que ela tinha trocado a nossa turma pela dele! Nos sentimos rejeitadas. Na escola, ela mal nos olhava. Suas novas amigas eram diferentes de nós. Não conseguíamos nos sentir à vontade com aquelas garotas. A Fernanda também mudou até na aparência. Começou a vir maquiada demais, com um batom vermelho nos lábios e olhos muito pintados. Parecia mais velha. E nós ali, três meninas vendo a Fernanda se tornar um mulherão. Mas ela não parecia real. Nada era real. As roupas que ela passou a vestir revelaram uma Fernanda que não existia. A Cátia, magoada, disse que jamais pensara que um homem poderia mudar tanto uma mulher. Mas podia, pensei eu, como penso até hoje. Uma mulher apaixonada faz qualquer besteira pelo seu homem e isto eu descobri, sozinha, alguns poucos anos depois.

Por fim, as semanas passaram e o que restou da nossa amizade com a Fernanda foi nada. A gente ainda se reunia na casa da Sabrina, mas um vazio permanecia ali. Certa vez a Sabrina comentou que era como se Fernanda tivesse morrido. Concordamos. Quando ela completou 16 anos, ficamos sabendo que fez uma enorme de uma festa em um clube concorrido da cidade. Nem nos convidou. Aquilo foi a gota d’água para nós. Eu fiquei tão magoada que roguei uma praga para aquele namoro acabar. Acho que minhas amigas fizeram o mesmo.

Quando as férias chegaram, a Fernanda sumiu. Achamos que ela tinha ido para a praia com o Giba e ficamos dois meses sem ter notícias dela. Para falar a verdade, nem sentimos sua falta. Aos poucos, fomos nós mesmas matando aquela amizade e o carinho que restava em nossos corações. Porém, quando as aulas começaram, tivemos uma surpresa. Descobrimos que a Fernanda tinha ido embora para outro Estado, viver com uns tios. A verdade veio depois. Grávida, a Nanda foi obrigada a abortar. O Giba não quis assumir a criança e os pais dela queriam o seu fígado. Depois do aborto, eles a despacharam para que a vergonha não se espalhasse. Aquilo chocou a mim e as minhas amigas. Aquele aborto Fernanda levaria para o resto da sua vida e o Giba seguiria sua vida de conquistador como se nada tivesse acontecido. Nunca mais soube dela então. Seus pais se mudaram também e se ela está viva ou morta, não sei. Hoje ainda guardo as nossas fotos. Éramos tão inocentes que chega a doer. Tínhamos tantos sonhos como os temos ainda. Eu estou vivendo os meus. Espero que Fernanda possa viver os dela.

Patrícia da Fonseca
Enviado por Patrícia da Fonseca em 17/08/2007
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