Rei Guilherme, o Breve

Eu era o rei em minha casa, até um casal de gaviões fazer ninho no abacateiro e botar ovo. O gavião tornou-se o dono do pedaço. Falei pro Papa: "Não é justo, você quem paga o IPTU". "O gavião não sabe disso", Papa falou. Os ovos no ninho foram o máximo. A gente podia ver do escritório da Mama. No jardim o gavião dava rasantes em todo mundo que passava perto do abacateiro, e comecei a duvidar de meu reizismo. Pedi pro Papa expulsar o gavião, o que ele recusou, o IBAMA ia brigar. E o bicho me derrubou. Me atirei de barriga ao chão, pra não ser atingido pelo rasante. Zanguei-me deveras quando Papa falou em comprar um capacete de motoqueiro pr´eu andar no jardim. Respondi:

_ Papa, está maluco? Aqui quem manda sou eu! Se o gavião quiser ele que use capacete!

_ Por que? Você dá rasante nele?

_ Claro que não, se nem sei voar!

Papa não comprou capacete, no lugar disso assistimos dia a dia a os ovos serem chocados, e depois, cada gaviãozinho deixar o ninho, crescer e voar. Ninho vazio o gavião não ataca mais. Sem os filhotes pra proteger está calmo. Desistir do abacateiro não desiste. Nem ele nem a fêmea. Outro dia quem quase parou no papo foi um papagaio, atrás de abacate. O gavião voava e assentava encima, e a gaviona num galho de baixo. Caçavam juntos. O xereta pulava de galho em galho. Os gaviões cercavam o bicho verde e laranja, que gritava feito um montão de maritacas, teretecoteco, barulheira de um bando, não de um só. Fugiu. Barriga cheia de abacate os gaviões deixaram, não precisavam de carne de papagaio, que deve ser dura de doer.

Desisti de ser rei, e não só daquele pedaço. Fosse rei odiaria gaviões. Agora sei que nem a Chiquinha é minha. Ela acredita ser minha dona, e de meus pais, da minha irmã e da nossa casa. Vai ver por isso outro dia deu o chega-pra-lá na Oma. Se bobear, Chiquinha acha que é dona até dos gaviões. Bicada não vai levar, odeia abacate.