O banco e o lago

O banco, desses de praça, em que assento e encosto compõem uma ondulação única, possui grossas ripas de madeira pintadas de um verde forte. Os pés são de ferro fundido em forma de arabescos, um em cada ponta do banco, pintados de preto e chapiscados de terra seca respingada por gotas de chuvas de outrora. O banco assenta-se sobre um gramado, tendo à frente um lago, e porque é verão cobre-se com folhas de nenúfares que flutuam no espelho d'água, salpicados de flores, umas amarelas, outras rosas, que às vezes balançam com o nado despreocupado de pequenas tartarugas-tigres. Atrás do banco há um canteiro com tufos de moréia amarela, azaléias brancas e costelas-de-macaco, circundando todas uma grumixameira, onde alguns de seus galhos deitam-se em direção ao lago, fazendo sombra rala ao banco.

Nele me sento e me deixo estar: uma legião de libélulas serpenteiam o lago, ora pousam, ora decolam; algumas tem o corpo inteiro pintado de rosa-choque, outras tem o tórax vermelho-sangue e abdômen azul, muitas verdes como as folhas dos nenúfares. Possuem a estranha disposição de pinçarem a ponta do abdômen na superfície da água. Um tico-tico se sacode no chão, rente ao canteiro, com batidas rápidas das asas, procurando alimento. Um segundo tico-tico emite do alto da grumixameira o seu canto breve e quase melancólico, como se estivesse a chamar pelo primeiro. Uma borboleta de asas pretas e finas estrias amarelas passa esvoaçando bem ao lado, em direção às flores da azaléia. Sopra uma brisa leve vinda da mata à frente, como se quisesse aliviar um pouco o mormaço sonolento que por ali se acomodou. Ajustado ao ritmo cadenciado e silencioso daquele espaço idílico, se eternidade houvera, ali me quedara.

Um sobressalto me desperta do torpor; olho o relógio e constato com tristeza que é hora de partir. Espreguiço-me no banco, reativo os sentidos e percebo além o arrulhar de uma pomba asa-branca, em tom de despedida. Levanto-me já lamentando ter de fazê-lo, bato os pés no chão para tirar a dormência das pernas e me dirijo à portaria do parque. Lá fora, sou recepcionado por motoristas estressados e um ônibus abarrotado despeja uma golfada de fumaça preta bem à minha frente. Com o farol para pedestres enguiçado, como num jogo de gato e rato espero o melhor momento para atravessar a rua sem ser atropelado, em direção ao estacionamento onde deixei meu carro. Uma vez na calçada do outro lado da rua, me vejo ladeado por duas tigelas de barro cozido, com farofa e penas pretas de uma galinha infeliz servida de oferenda a alguma entidade obtusa, em troca de favores mesquinhos ou pela vã esperança de reaver um amor perdido. Minha vontade é voltar correndo para o parque, sentar-me naquele banco defronte ao lago e não sair mais de lá. Pois se eternidade houvera, ali me quedara.