UMA TARDE QUALQUER

Era uma tarde qualquer, naquela cidade qualquer, naquela rua qualquer.

Um avião da TAM rasga o céu.

Lá dentro do avião uma aeromoça serve drinques e aqui na terra um jogo de futebol rola na TV.

Na rua o calor se mistura ao tédio.

As baratas fazem uma balada de réquiem nos esgotos e os olhos amargos de uma moça namoram a fumaça que sai de seu cigarro.

Essa moça já teve um amor.

Já teve o amor de um moço.

Agora ela vive tensa.

Ela sabe que agora está sozinha e que o mundo sabe.

Seu amor não vive mais em lugar nenhum.

Nem em São Paulo, nem no seu coração, em lugar nenhum.

E tem também esse moço.

Não o que recebeu a bebida no avião da TAM.

Esse moço na rua.

Ele amava também.

Ele sabia amar.

Sabia amar por pouco tempo.

Depois virava outra coisa.

Outra coisa que já não era amor.

Mas agora ele se perdeu também.

E a fumaça do cigarro ele também contempla.

Seu coração bate.

Cada batida é um segundo no tempo que volta.

Cada batida é um retorno retrospectivo ao eterno amor que já se acabou.

A moça quente em seu grande casaco cinza, agora acabando o cigarro.

O moço se abraça a sua jaqueta deitada em seu colo, seu cigarro também se apaga.

O avião da TAM pousou.

O relógio da torre em que a moça olha marca 15:05.

O digital no pulso do moço marca 15:07.

Ambos agora não tem cigarros.

Apenas um casaco cinza, uma jaqueta marrom, um amor retrospectivo e uma tarde qualquer em mãos.