QUEM MERECE NOSSA FIDELIDADE?
 
Era uma vez um sujeito que vivia sozinho em um sítio, bem longe da cidade. Possuía meia dúzia de carneiros, alguns porcos, um boi, que puxava o arado, uma vaca que lhe fornecia leite, um cavalo que lhe servia de transporte, umas galinhas, que o abastecia de ovos e carne, e uns cachorros, que além de servir de guardas, lhe fazia companhia. Eram, no dizer dele, seus únicos amigos. 
Um dia sobreveio uma grande tempestade naquela região e o sítio ficou incomunicável. As águas do rio subiram e levaram todas as pontes. A roça que ele plantara apodreceu em meio à enchente. Ele ficou ilhado e sem qualquer recurso para sobreviver.
A tempestade durou muitos e muitos dias. Apertado pela fome, o pobre homem começou a abater os animais para se alimentar. Comeu primeiros os carneiros, depois os porcos, em seguida os bois e por fim, como a normalidade estivesse demorando para voltar, o cavalo. Assim que ele levou ao fogo o último pedaço de carne do cavalo, os cães se reuniram e resolveram fugir.
─ Ingratos! Resmungou o sitiante. ─ É assim que vocês se intitulam o melhor amigo do homem? Justo quando tudo parece estar perdido, vocês me abandonam?
─Não somos ingratos ─ responderam os cães. ─ Somos apenas previdentes. Se você não hesitou em sacrificar quem sempre o ajudou a sobreviver, o que não fará a nós, que só temos amizade para lhe dar?
 
É mais ou menos isso o que está acontecendo no nosso meio político. Uma debandada dos políticos em busca de lugares mais altos, onde a água do dilúvio provocado pela Lava a Jato não os afogue. Nessa fuga não se pejam em abandonar os antigos aliados, nem de sacrificar os cúmplices e até os colaboradores. Sobreviver é a única motivação de suas vidas. Troca-se de partido, de aliados, de amigos, de religião, de ideologia (até porque essa nunca se teve mesmo) como se troca de roupa para atender ao ambiente onde irá para vender o seu peixe. Dizem que a política é assim mesmo. Um bom político não tem amigos, mas sim aliados; nem desafetos, mas apenas adversários. E o meio político é como buraco de caranguejo. Dentro de seus buracos os bichos mordem-se uns aos outros. Mas se atacados de fora, por alguém que não seja da sua colônia, unem-se contra o inimigo comum.
Nós somos os cães da metáfora acima. Só temos o nosso voto para dar a eles. Alguns dos nossos “fazendeiros” talvez continuem a merecê-lo. Mas pelo que a maioria dessa gente que está aí andou fazendo até agora, será que merecem nossa fidelidade? Embora nós sejamos os primeiros a serem sacrificados quando os tempos ruins chegam, o poder de dizer a eles que não queremos servi-los mais é nosso. Essa é a nossa chance de fazê-lo. Vamos desperdiçá-lo e continuar fiéis a quem nos trata de forma tão descomprometida e frívola?