Um Novo Olhar Sobre o Mundo

Não havia nada que me entregasse tanto quanto meus olhos decepcionados. A vida tem vagado louca, solta; incerta como um caminhão numa serra íngreme, mergulhada em neblina.

Nada mais espero e tampouco faço algum esforço pelos acontecimentos. Não sei, afinal, o que esperar da vida nos caminhos do meu amor.

Também já não me interessa sabê-lo. Ando cansada de seus desvarios e do que parece ser uma vingança do tempo. Pelo quê? Não sei.

Aos meus doze anos, ao passar de carro sob um viaduto, vi um gari utilizando para guardar suas vassouras a caixa de papelão que, junto a meu pai, eu havia ali deixado para que os cães da rua pudessem se abrigar, no frio.

O desprezo daquele homem rude para com minhas intenções me pôs estatelada num fracasso do qual, até então, eu não tinha provado. Observei-o longamente enquanto o carro passava e até onde meus olhos enxergavam.

Foi nesse instante que o mundo começou a se tornar, para mim, um antro de descompaixão.

A cidade tornou-se --e assim permanece até hoje--uma maldita selva de pedras sem caminho. Eu não tenho perspectiva. Sou o povo e não sei o caminho para o verdadeiro "esforço recompensador " que dá ao país o ilusório pendão da meritocracia.

Durante aqueles poucos segundos, que me pareceram eternos, senti um misto e humilhação e decepção. Não soube falar, na hora. Há diferentes maneiras de tornar-se triste ou pelo menos conhecer a verdade do mundo.

Eu não a conheci pelo lado sujo e imoral. Eu a conheci na ignorância do gari, no frio e nos cachorros de rua e, principalmente, em minha inocência.

Há coisas que não saem da minha memória, e aquela cena, vez ou outra, perturba meus pensamentos enquanto, acredito, para o gari, aquele dia de trabalho fora mais um, apenas, entre inúmeros outros.