Conto do vigário

Antônio dos Santos, mais conhecido por “ Já Foi” era um sujeito muito alegre. Gostava muito de contar piadas, contar os famosos causos de assombração, de pescar, sua paixão e descanso de seu trabalho, fazer serenata para as mulheres e todas as tardes fazia uma corrida de preparo físico. Sempre corria na prova da São Silvestre.

Um belo dia de domingo, já cansado da pescaria, “ Já Foi” saia do rio com sua sacola de peixes. Não eram muitos, mas o suficiente para um bom jantar. Era casado e tinha três filhos ainda pequenos. Sua filha mais velha o acompanhava nas pescarias, mas neste dia, ela não foi, porque estava com dor de cabeça e tomou um remédio que a fez dormir.

Já era fim do dia, mais ou menos umas quatro horas da tarde. Com seu chapéu, no estilo mexicano, “ Já Foi” começava a subir uma trilha bem íngreme. Seria uns quinze minutos caminhado a passos largos até chegar à estrada. Sua bolsa, com seus pertences, estava muito pesada. Dentro dela estavam os peixes. Eram quatro peixes da espécie dourado, que pesavam mais ou menos uns cinco quilos cada. O equipamento de pesca, as iscas remanescentes, um embrulho de pão com linguiça, uma garrafa de café, uma caneca de alumínio e uma garrafa vazia que estava com água. Ainda dentro da bolsa havia um lugarzinho para levar uma florzinha do campo para sua esposa. Ela, com certeza, ficaria muito feliz e faria o peixe assado conforme de costume. Com bastante tempero e para completar, passaria no boteco do José para levar duas garrafas pet de dois litros cada uma de guaraná, pois somente nos finais de semana é que eles tomavam refrigerantes.

Sua carga estava bastante pesada. Ele, porém, dizendo consigo mesmo, desejou que sua filha mais velha estivesse ali para ajudá-lo a carregar. Ela, de nome Sabrina, era muito esperta. Era a primeira aluna da sala e já cursava o último ano do segundo grau da escola estadual da cidade. Queria ser delegada da polícia federal, seu sonho e lutava a cada dia sobre os livros estudando e fazendo um cursinho para passar no vestibular e iniciar o curso de Direito. A esposa de “ Já Foi” era uma grande professora do colégio estadual. Dava aulas de Matemática e Física. Sempre tentava ensinar o marido, porque ele somente estudou até a quinta série do primeiro grau, porém ele detestava quando ela chegava e escrevia uma equação ou um problema para fazer.

Pensando como chegaria em casa, “ Já Foi” andou por uma grande distância e já estava chegando perto da estrada, pois o ônibus do povoado próximo já havia passado e sendo domingo, somente existia um horário para o transporte de passageiro. Se perdesse o horário, ele teria que ir a pé e andaria uma distância de dez quilômetros, via asfalto.

Ele fez a última curva da estrada de terra e se andasse por mais setecentos e cinquenta e dois metros chegaria ao asfalto. Era somente atravessar e andar por mais duzentos e oitenta e cinco metros para chegar ao ponto do ônibus. Apressou-se, mas levou muito susto. Terminando de fazer a curva da estrada, ele deparou com uma viatura da polícia militar, destinada a patrulhar e fazer a guarda ambiental da região. Seu coração disparou quando o veículo parou e uma voz muito forte saindo do interior do veículo, dizia:

- Parado, mãos para cima e não se mecha.

Com o último gole de saliva na boca, olhando de repente para aquela camionete e ao mesmo tempo quatro policiais descendo e o ameaçando com algumas armas, “ Já Foi” deu um grito e um pulo. O susto dele foi tanto, que a sacola onde estavam os peixes e seus pertences imediatamente soltou-se do ombro e caiu.

- Tenham calma, seus guardas. Aqui está um simples trabalhador, vindo de uma pescaria farta e os leva para a família. Não vou vender para ninguém. É para mim, para minha sogra, para meu tio ...

O guarda, na função de sargento, não quis detalhar muito. Foi logo para cima dele e o segurou com muita força. Parecia que iria surrar muito, mas era somente ameaça, pois não encontrou nele nenhum perigo e viu que era um cidadão honesto, trabalhador e não oferecia nenhum perigo.

- O que tem dentro desta bolsa?

Meio nervoso, com a voz trêmula, mentalmente ele pensava que estava todo complicado. Era período em que a pescaria não estava permitida e poderia ser preso, processado e até ser julgado criminalmente. No mais, o seu orçamento, juntamente com o da esposa, estava todo comprometido com as despesas do mês e os tratamentos dentários dos filhos. O pagamento do financiamento do veículo da esposa, a compra de material para a festa de aniversário de dois filhos, que eram no mesmo dia, mas em anos diferentes. O que fazer, pensava a todo tempo. Como ia dizer aos amigos, ao patrão de onde trabalhava, aos filhos e demais pessoas que estaria prestes a ser preso.

- Sr. Guarda ... Nesta bolsa estão os meus apetrechos de pescaria. Sou trabalhador de uma fazenda, onde exerço a função de retiro. Por ser, hoje, o meu dia de folga, quis vir até aqui para pescar. Peguei quatro dourados, de bom tamanho.

O guarda, porém, com muita arrogância e querendo mostrar serviço, disse:

- Eu posso muito bem deter o Senhor. Posso levá-lo até a delegacia e instaurar inquérito policial. Será processado e até mesmo condenado. Vou fazer uma grande multa, pois está cometendo crime ambiental e a pena não é pouca. Por acaso o Senhor tem algo a dizer?

- Sim Doutor. (Neste momento, “ Já Foi” não compreendia mais nada. As provas estão todas contra ele. Poderia dormir na cadeia. Fugir, naquele momento, era impossível, pois os policiais estavam todos armados e sobretudo tinham um veículo a favor deles. Pensou mais uma vez, mas ficou um pouco confuso, porque o sargento insistia em procurar provas para incriminá-lo).

- Olha, Dr. O Senhor está certo. Eu estou errado em pescar no período proibido. Olha, os peixes estão todos assanhados. São muitos. A estrada passa ali perto. Onde eu peguei estes, ainda têm mais duas bolsas com cinco dourados em cada uma. Os senhores podem ficar com tudo isso, já que são provas contra mim, porque vou buscar as outras duas bolsas que estão lá no rio. Volto em cinco minutos.

- Quer dizer que tem mais? Berrando, disse o sargento.

- Sim, Senhor “pulíça”.

- Podem me aguardar.

- Vá, mas depressa e não faça demora.

“ Já Foi”, no piscar de olhos, já saia correndo e se embrenhando estrada e mata a fora, saiu correndo, escondendo-se em algum lugar. Como era muito esperto e conhecia toda aquela região, saiu por outro lugar e rapidamente chegou em sua casa.

- Mulher, se me procurarem, diga que eu não estou. Estou pescando.

- Vou esconder-me na casa de sua mãe, porque deixei quatro policiais do meio ambiente me esperando, perto do rio, para entregar-lhes as duas bolsas de peixe. Só que não existem peixes e eu os enganei.

Por um bom tempo, os quatro policiais ficaram esperando por “ Já Foi”. Chegou perto da meia-noite e nada de “ Já Foi” chegar. Resolveram ir embora e até hoje estão esperando as duas bolsas de peixe.

JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO
Enviado por JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO em 11/08/2018
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