CASA-LAR!   

...um casamento, não muito diferente dos demais.
   Harrys no alto dos seus 40 anos vivia as turras com Emily (37), sua esposa.
   Tudo favorecia e tudo era estopim para seguidos desentendimentos, mais da parte dele. E é bom que se frise que este não era um mero detalhe, mas uma constatação de que a resignada senhora sempre preferia contornar as coisas e ouvir, ouvir e ouvir as improbidades e o arsenal de besteiras que seu esposo proferia a todo momento, no alto das repetidas e sucessivas discussões.
   Passava a todo instante o fim do casamento, por conta de Harrys é claro, pois a esposa mais ingênua e calejada sequer ventilava essa possibilidade.
   Se tinha algo de bom no irado marido era o fato dele nunca ter levantado a mão para a indefesa esposa e Isso conta e conta muito em situações de relacionamentos desgastados, á dois!
   Até agora não fora mencionado a existência de “filhos”,  fruto deste casamento deveras conturbado pelo simples fato de que um deles não poderia tê-los e qual deles seria estéril? Acho que jamais iremos saber por que ambos nunca entraram em consenso indo procurar explicações médicas para o caso.
   Pois bem, talvez seja este um forte argumento e o motivo mais fiel que retrate os seguidos embates neste sofrido e difícil casamento.
   Ele numa soberba e num machismo desmedido e inócuo culpava sempre Emily pela esterilidade e ela; coitada, baixava a cabeça, “a guarda” e acusava o golpe, parecendo aceitar em assumir uma culpa que sequer comprovou-se ser sua.  
   Um dia Harrys, como naquelas histórias de 'folhetim' contadas por aí, disse que precisava ir até ao bar da esquina comprar cigarros (
detalhe: - nem fumar, ...fumava ).
   ELa, ingenuamente acredita nisso! ...eis que premeditadamente o esposo desaparece de vez de sua vida.
   Emily fica sozinha em sua humilde casa e dia após dia mergulha num sofrimento sem fim que ligeiramente começa a roubar-lhe o discernimento das coisas corriqueiras e como era de poucos amigos,  agora sem os bate bocas com Harrys e sem nunca ter uma vida social, a tristeza se instála, se agiganta e uma oportunista e lacerante depressão lhe fará companhia, provavelmente até o fim dos seus dias.
   Todos os dias e por vários anos a janela de sua casa era seu ponto de observção na qual corria sempre que ouvia o barulho de algum veículo passando por perto, mas nunca era quem esperava, não era Harrys, aquele que ainda amava apesar das brigas. 
   Não demora começa imaginar ter ouvido barulho de automóveis e esse já eram os sinais da senilidade que rapidamente se achegava...
   Algumas senhoras do lugar unem-se e indo visita-la, lastimam demais  a situação de penúria que vive e se encontra Emily, num estado quase irreversível de chances de melhora.
   ELa adquire uma doença que a medicina comprovadamente atesta como Alzheimer, que nada mais é do que a perda progressiva da lucidez.
   Quando já não consegue mais se governar por si só, ...é conduzida por conhecidos generosos a uma casa de repouso e tratamento físico e mental, para a 3ª idade(
CASA-LAR). Eram esses os mesmos que apesar de seu dia a dia atribulado e suas vidas particulares, tiravam tempo para dar-lhes assistência psicológica e inclusive financeira, pois depois do desaparecimento do esposo, a pobre... não teve mais condições de  manter-se.
 
 ...e lá todos os dias, a agora velha e senil, senhora Emily fica sentada no mesmo banco do jardim da "CASA-LAR" olhando para um lugar que os psicólogos chamam de ponto fixo, na verdade ela se observa bem mais jovem, com saúde e ansiosa á espera do esposo Harrys, falecido a mais de 15 anos!