A chuva e a estudante

Terça-feira, 17h, de um dia de primavera qualquer. Pôr do sol parcialmente ensolarado com muitas nuvens escuras se formando no horizonte. Ela fazia seu melhor penteado e usava maquiagem mais delicada pra ir á aula.

Ousada, usava um conjunto de jeans claros e uma camiseta de moletom verde escuro. Estava ansiosa pra avaliação que faria na faculdade. Cabelo longo encaracolado até às costas. Linda e esguia. Era perfeita. Uma mulher em formação no auge dos seus 18 anos, exalando a esperança e sensualidade em sua melhor fase.

Descia de sua casa, um prédio simples de dois andares e terraço. Construção do tipo com garagem no térreo. Caderno nos braços, saindo da garagem, via que o céu estava escuro com nuvens carregadas.

Subiu para buscar o guarda-chuva. Não encontrando, procurou-o por toda a casa. Percebia que atrasava-se. Perguntou ao irmão, e ele disse que não sabia. Procurou pela a mãe, e ela disse que havia deixado-o no terraço. Foi até lá. Sentiu o vento da chuva chegando. Pingos caiam como pedras no telhado de zinco causando o barulhento momento do começo de uma forte chuva.

Queria chegar cedo, mas chovia torrencialmente, e nem mesmo o guarda-chuva seria suficiente para protegê-la. Subitamente, correu e fechou as janelas da casa pra não molhar os móveis. Eram 18hs e a chuva seguia voraz. Finalmente, após fechar tudo, desceu, abriu a porta e saiu.

Na rua, agora a chuva perdera o ritmo. Temendo estar atrasada pra avaliação na faculdade, apertou o passo equilibrando-se sob suas sandálias. Sua rua era uma ladeira em sentido único. Carros subiam apressados naquele horário de pico e de movimento intenso.

Entretanto, encorajada por objetivo maior em mente, ela arriscou na direção contrária à dos carros que subiam, usando a calçada íngreme e obstruída por materiais de construção civil dos vizinhos e sacos com lixo não recolhidos e acumulados.

A atividade de carros, motos e caminhões, levantavam uma névoa úmida devido a velocidade da subida. Poças de água formaram-se próximo à boca de lobo que estava entupida logo a frente da moça. A água empoçou nos buracos do asfalto que a Prefeitura insistia em não arrumar. A enxurrada seguia caudalosa como córrego cheio e alargavam as poças d'água em torno da boca de lobo. A poça maior decorria de um bueiro entupido que emanava esgoto mau cheiroso. Carros passavam lançando água nos passeios como se fossem lanchas ou barcos a motor. A água acertava o muro.

A moça distraída passava perto desta poça. Estava feliz por ter encontrado o que procurava. Imaginava que conseguiria chegar a tempo ao colégio para avaliação que faria. Descendo da calçada, pisoteando a água de enxurrada, ela cuidava para não tropeçar.

De repente, um carro em velocidade vinha subindo o morro que ela descia. Ele passou na poça de água e lançou sobre a moça a maior quantidade de esgoto. Seu guarda-chuva não funcionou para aquela situação. Sua aparência fica toda desajustada. A maquiagem se desfez na tragédia.

O perfume fora trocado pelo mau odor de esgoto. Seu cabelo encaracolado estava pingando detritos. Os cadernos completamente encharcados. Sua vontade de estudar foi trocada por uma revolta interna. Ela gritou soltando um urro de raiva! Imaginou que a culpa era do condutor do carro, da poça, da chuva. Chorou copiosamente e voltou pra casa.

No quarto de dormir após um novo longo e demorado banho, aos prantos, ligou para sua colega de sala e pra diretora do colégio pra narrar o ocorrido. Tudo resolvido, embora seu ódio implacável, e o sentimento de impotência ante a negligência do serviço de limpeza e conservação daquela via tivessem sido a causa dessa tragédia. O tempo não voltava atrás pra evitar o fato, mas sentiu um impulso pra protestar. E ligou pra prefeitura. Lá um atendente informou que a reclamação carecia de provas e de formalidade burocrática. A moça revoltada, além de desacreditada sabia o quanto era humilhante pedir apoio a quem não sentia obrigado a cumprir o próprio dever. Descontente, ela chorou.

Sentou-se junto a escrivaninha. Tomou um chá quente e escreveu em uma folha uma petição ao ministério público estadual. Agora tinha uma esperança de resolver aquele problema que poderia ser o problema de outras moças e rapazes que transitavam por aquele local. A força da juventude e da cidadania renascia dentro dela como a fênix das lendas e mitologia. Ela tinha a esperança combustando em seu interior!

Glaussim
Enviado por Glaussim em 21/10/2018
Reeditado em 16/08/2023
Código do texto: T6482215
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