Todo nada

O estranho passava devagar, buscando frestas na intenção de alguma claridade que interrompesse o escuro que ia-lhe na alma. As ruas escuras, as árvores imóveis na calmaria da noite e o silêncio sepulcral eram as únicas companhias. Na mente, nenhuma fenda por onde pudessa brotar uma luz, uma intuição ou uma prece, último recurso de qualquer desesperado. Estava tão sozinho que nem um mísero cão vadio aparecia para importuná-lo, nem um assaltante cruel para roubar-lhe. E como não tinha o que ser roubado, provavelmente seria morto com requintes de crueldade, como vingança. Nada, absolutamente nada. Um desprovido, um nada nato. Enfim um pensamento que fazia sentido. Levantou-se, deu dois tapinhas na perna e saiu assobiando e chutando vento. Feliz da vida.