De quem será?

Estava voltando da minha rotineira caminhada matutina pelas ruas de meu bairro. Já havia feito inúmeras voltas de lá para cá, de cá para lá.
Estava apreciando as flores, sentindo o ar fresco da manhã, o cantar das aves que estavam catando seus galinhos em todos os cantinhos da beira da estrada.
Vasculhavam em um bando daqueles bem amarelinhos, penso que eram canários de todos os tamanhos, com seus piares, como que chamando muitos mais. Para uma ajuda comunitária em busca dos alimentos para eles e seus filhotes que, provavelmente, em seus ninhos os aguardavam para a primeira refeição matinal.
Voltei, então, minha atenção para meus pensamentos, tentando organizar minhas atividades diárias, cronometrando meu dia, para que desse tempo de concluir todas as minhas atividades a serem feitas no mesmo, que estava ensolarado e perfeito.
Num repente, foquei ao longe e vislumbrei uma manchinha mais clara, no escuro e já meio aquecido solo asfáltico em que eu estava andando.
Comecei a ficar curiosa! O que seria aquela manchinha tão pequena, em meio à plana rua solitária, em que eu absorta em meus pensamentos estava, e, agora, voltaram-se para aquela coisinha minúscula, que atiçou minha curiosidade de caminhante, que tudo observa e que costuma fazer quando pelas ruas anda.
Continuei, apressei meus passos, e aquele pontinho começou a ficar cada vez maior, maior... Fui me aproximando cada vez mais.
Então, comecei a correr, correr, queria descobrir o que tinha ali. Quanto mais me aproximava, mais minha curiosidade aumentava.
Então, para minha agradável surpresa, percebi que o volume do montinho não era tão imenso como imaginei. Era grandinho, mas, ao mesmo tempo, de tamanho muito pequeno, muito pequeno mesmo! Quase que cabia na palma de minha mão.
Fui me aproximando, aproximando, cheguei bem pertinho. Andei para cima, para baixo, rodeei aquele montinho, parei...
Ah! Que lindo! Bati palmas de alegria!
Minha imaginação voou para muito longe e para todos os lugares por onde passei naquele dia, e naquela hora da manhã. Quem teria permitido que isso acontecesse? Como isso foi possível?
Comecei a pensar: “Será que tem dono? Quem deixaria essa preciosidade longe do seu devido dono? Mas é tão pequeno? Será que junto? Ou não?
Acho que não! Vou deixar onde está!”
Não, não consigo! Vai ser muito triste deixar ele aqui sozinho.
Pense, pensei... então comecei a me questionar: “Vamos que a mamãe dele sinta falta e volte para procurá-lo?”
Ah! Mas é tão bonitinho! E se outra pessoa achar e levar?
“O que faço”? Não consigo deixá-lo aqui. Solitário, é tão pequeno, tão bonitinho! Ai que dó! Queria ele só para mim...
Acho que vou levar para minha casa. Darei um banho com água bem limpa, vou passar um sabão de coco para que fique bem branquinho, e depois vou secar um pouco no sol, para que o cheiro fique bem gostoso. Vou cuidar e esperar até que alguém reclame a falta dele.”
Então abaixei, juntei, acariciei, senti o cheirinho e peguei.
Aí, pensei: “está sujinho, mas o cheiro é bom. Acredito que o dono dele deve ser bem caprichoso.” Coloquei na palma de minha mão, voltei a caminhar, olhando para aquela coisinha mais linda, e imaginando o que faria a seguir.
Uma dúvida me assombrou repentinamente. “Mas, se eu levar para minha casa e a mamãe dele sentir a falta! Provavelmente virá atrás. Pois é algo muito especial. E certamente ela ainda não sentiu a falta.” Então, penso que devo mudar meus planos. Não posso ficar com algo que não me pertence, só porque achei, sem ao menos pesquisar pelas redondezas, quem foi que perdeu?
Aí me ocorreu a ideia de deixar com a mulher do caixa do supermercado que era bem próximo de onde eu achei. Com certeza, alguém voltaria a procurar e passaria pela frente do mercado.
Também, morrendo de curiosidade para saber quem seria o dono daquela preciosidade. E sendo assim eu teria a chance de saber. Caso contrário, se ninguém aparecesse no outro dia, eu voltaria ao mercado e ficava para mim.
Com um aperto no coração, deixei. Mas, com muitas recomendações para que fosse bem cuidado e que no outro dia estaria eu lá para buscar, caso o dono não fosse procurar. No entanto, meus pensamentos não abandonaram o meu achado. Fiquei imaginando mil coisas. “De quem será? Que tamanho ele tem? Como se chama? Onde mora? O que fazia tão cedo na rua? Para onde estava indo? Como eram as pessoas responsáveis por ele? Será que cuidavam bem dele?”
E assim por diante....
Chegando em casa, ocupei-me com minhas atividades e o tempo foi passando. No outro dia, a primeira lembrança foi em ir até o mercado para averiguar se a coisinha ainda estava lá.
Aprontei-me e saí rápido, apressando os meus passos para chegar ligeiro.
E, adivinhem!
Para minha surpresa, não é que, chegando em casa, a pessoa responsável pelo objeto sentiu a falta e realmente foi procurar no mercado se alguém não havia encontrado e deixado ali?!
Quase chorei de felicidade!
Eu teria adorado ficar para mim. Tinha até pensado em fazer um chaveirosinho para colocar na porta de minha casa. Ou, colocar na estante de brinquedos da minha querida Júlia, para quando olhasse, imaginasse a delicadeza daquele pequeno e precioso objeto.
No entanto, minha alegria foi mais intensa e verdadeira. Pois fiquei sabendo quem era o dono e que realmente era importante para ele. Certamente voltaria a aquecer o seu minúsculo e gracioso pezinho que ficou desprotegido por tê-lo perdido quando ainda estava no colo de sua mamãe. Que quando estava levando-o para passar o dia na creche, não percebeu que o pequeno João havia perdido um “pezinho de seu tênis”.


Produção do texto: Miriam Carmignan