E ASSIM, NASCE UM BEST- SELLER

Uma cafeteria universitária. O intelectual novato Artur está sentado perto do balcão pensando alto quando chega Araújo, o intelectual veterano, e senta-se ao seu lado. Com o propósito de ser escutado pelo veterano, Artur resolve pensando alto.

- Como transformar em romance algo que ainda nem foi esboçado sequer informalmente...

- Como? – pergunta o veterano.

-É que estou com uma idéia, mas ainda nem a escrevi e já quero transformá-la em um grande romance, talvez até vire um best- seller. Sim, um best- seller...

- Ahn...mas sua idéia é de uma história em prosa, aristotelicamente organizada como um romance , ou o quê?

-Aí é que está! Não é. Tenho essa mania de pôr o carro na frente dos bois, pensando no destino das minhas criações antes mesmo de elas terem sido criadas . Vê: acabei de ter uma idéia , que não é de um romance e sim de uma literatura alternativa, digamos , e já penso na sua possível adaptação para um estilo convencional e em seu breve sucesso de público e vendas o que o tornaria um best- seller!

-Ah, amigo, caso explícito de desorganização de pensamento.Isso faz com que você queira acelerar o rumo certo das coisas...

-Isso!

-... e na maioria das vezes , você acaba nem começando a fazê-las.

-É isso. Exatamente o que acontece!Acho que me envaideço tanto com a provável ascensão da minha idéia que fico no sonho- confessa Artur.

-E acaba esquecendo a idéia.

- Por vezes...mas agora que estou de aviso prévio e detectei meu erro , não vou deixar que isso ocorra mais.

-É o melhor que se faz, acredite.

- Vou esquecer um pouco que posso vir a escrever um best-seller a partir da literatura alternativa que será criada a partir da minha idéia que por sua vez , será registrada agora.

- Ótimo! E , qual é esse estilo “alternativo”?

-Não sei bem ainda...estava pensando em algo do tipo pop art, quadrinhos, talvez uma coisa do tipo fanzine, não sei bem...mas no padrão romance ainda não se encaixa.

-Dramaturgia, talvez.

- Já pensei, mas não, minha idéia vai além, é algo novo.

- Então, um trabalho científico, monografia, quem sabe?!

- Também não. É metafórico demais pra isso...é algo...pô, nem sei bem.

-Coisa de artista...

-Sim, mas, alto lá, não posso me envaidecer agora.

-Cadê? Não vai registrar sua idéia , não?!

- Hum, mesmo...tenho de , pelo menos, esboça-la, tomar nota...o que escrevo?

-Uma frase que sintetize o objetivo da sua idéia , ora – sugere Araújo.

-O objetivo é, no fundo, no fundo, o best-seller!

-Esqueça o best-seller. Faça o seguinte, diga-me sua idéia.

-É que sou meio protecionista, sabe?

-Gente jovem...bem , então faça assim. Exemplo: minha idéia é a relação da economia com o estado de humor das pessoas ao verem a cor vermelha.Aí você toma nota disso.

- Então- escrevendo- pronto, já o fiz. Opa, já está na minha hora, tenho de voltar pra dar aula. Obrigado, Araújo. Até mais.

-Sorte, rapaz!

Artur, de saída, olha para sua caderneta onde está anotada a idéia. Em seguida, olha para o intelectual veterano que finda seu café. Volta à caderneta.

- Que idéia infantil, meu Deus!

Olha novamente para Araújo que o vê e acena com a cabeça.Por breves instantes , mentaliza em silêncio. Vira-se e fala consigo mesmo.

- Hum...economia no humor das pessoas enquanto olham pro vermelho , hein?! A quem vou dedicar meu segundo best-seller – e pensando alto, conclui- talvez ao Araújo...