O fim da quarentena

Quando saiu em todos os jornais a divulgação de que a quarentena havia acabado, que a vacina contra o vírus havia sido criada e já estaria disponível para a população na próxima campanha de vacinação, as reações foram as mais diversas.

Algumas pessoas ficaram atônitas e temerosas, tantos meses de isolamento e de notícias falsas deixaram-nas ariscas e desconfiadas, como os animais selvagens.

Outras agiram como se fosse uma virada de ano ou uma final de copa do mundo, da qual a seleção saíra vitoriosa: saíram, imediatamente, a fim de comprar fogos para comemorar; ou correram para a casa de familiares (mães, pais, filhos, sobrinhos, netos, bisnetos, etc.) e de amigos a fim de abraçá-los e beijá-los; ou sentaram-se na porta de casa para conversar com os vizinhos e colocar o “papo” em dia.

Houve aquelas que conseguiram manter-se afastadas do vírus ou que foram contaminadas, mas se recuperaram, as quais abriram as portas e janelas das casas apenas para respirar profundamente o ar puro (proporcionado pela ausência da poluição gerada pelo afastamento) e sentir o sol nas faces (pálidas de tanto estarem escondidas) como forma de louvor e agradecimento.

As menos afortunadas, que perderam um ente querido, agiram como se fosse o dia de Finados. Reuniram-se apenas para chorar a perda, consolarem-se umas às outras, rezarem juntas e relembrar os bons momentos que tiveram com aquela pessoa que, no fim, acabou sozinha, sem merecê-lo. Os cemitérios lotaram-se de visitantes e ouviam-se muitos gritos e lamentos. Cenas muito fortes e comoventes, as quais contagiavam até os espíritos mais impassíveis, que se juntavam ao coro de lamentações.

Em um ponto, todas as reações convergiram: na promessa de mudança de valores, exatamente como acontece nas festas de fim de ano. Todos prometeram valorizar mais a natureza, cuidando mais dela. Prometeram valorizar a família, os amigos, a saúde, Deus, etc. Muitas foram as promessas. E, inicialmente, as pessoas estavam cumprindo-as alegre e fervorosamente.

Iam ao trabalho andando ou de bicicleta para preservar o ar (que tanta falta fez naquela época tão funesta) e, ao mesmo tempo, exercitar o corpo, em especial, os pulmões. Visitavam mais os pais, os avós, bisavós, os tios e tias idosos. Reuniam-se mais com os amigos para celebrara vida pós tormenta e reafirmar o juramento de vida nova. Frequentavam as casas de Deus com mais frequência. Ajudavam ao próximo. Deixaram de lado os preconceitos. Afinal, puderam comprovar que o destino de todos é o mesmo, não há acepção de pessoas.

Com o passar do tempo, conforme a lembrança daqueles dias sinistros iam afastando-se e as pessoas sentindo-se mais seguras, os ânimos foram-se arrefecendo. As pessoas, então, largaram de mão seus tão sinceros votos. E voltaram a ser o que eram antes da pandemia.

Adriane dos Santos
Enviado por Adriane dos Santos em 15/05/2020
Reeditado em 15/05/2020
Código do texto: T6947655
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